Educación Física y Ciencia, vol. 25, nº 2, e258, abril - junio 2023. ISSN 2314-2561
Universidad Nacional de La Plata
Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación
Departamento de Educación Física

Artículos

Tecnologias de sexo/gênero na Ginástica Artística: o processo de diferenciação sexual das argolas, barras assimétricas e mesa salto

Adriano Martins Rodrigues dos Passos

Analista em Cultura e Desporto – Prefeitura Municipal de Goiânia, Brasil
Evelise Amgarten Quitzau

Departamento de Educação Física – Universidade Federal de Viçosa, Brasil
Cita sugerida: Passos, A. M. R. y Quitzau, E. A. (2023). Tecnologias de sexo/gênero na Ginástica Artística: o processo de diferenciação sexual das argolas, barras assimétricas e mesa salto. Educación Física y Ciencia, 25(2), e258. https://doi.org/10.24215/23142561e258

Resumo: Este artigo analisa o desenvolvimento da ginástica artística e das tecnologias de sexo/gênero que instituem, operam e sustentam a bicategorização dos seus aparelhos e eventos. Para tanto, pensamos essa modalidade como um dos elementos do dispositivo do esporte, cujo funcionamento é interdependente e complementar ao dispositivo sexo/gênero. Mediante pesquisas bibliográficas e um recorte histórico que começa na segunda metade do século XIX até o Código de Pontuação 2017-2020, buscamos evidenciar e problematizar o processo de diferenciação de três aparelhos/eventos da ginástica artística: argolas, estritamente para homens; barras assimétricas, criadas para mulheres; e mesa de salto, comum para mulheres e homens. Como resultado, constatamos que a diferenciação dos aparelhos, baseada no sexo/gênero do/da praticante, reflete e responde às necessidades de manutenção do ordenamento social do sexo/gênero e da divisão sexual do trabalho de cada momento histórico, operando, desse modo, como instrumento que normaliza e normatiza o sexo/gênero, as expressões de feminilidades e masculinidades e o caráter arbitrário e compulsório da separação de homens e mulheres nas competições esportivas.

Palavras-chave: Ginástica Artística, Dispositivo, Tecnologias de Sexo/Gênero, Feminilidades, Masculinidades.

Sex/Gender technologies in Artistic Gymnastics: the process of sexual differentiation of still rings, uneven bars and vault

Abstract: This article analyzes the development of artistic gymnastics and the sex/gender technologies that institute, operate and sustain the bicategorization of its apparatuses and events. Therefore, we think of this modality as one of the elements of the sport device, whose functioning is interdependent and complementary to the sex/gender device. Through bibliographical research and a historical cut that begins in the second half of the nineteenth century until the 2017–2020 Code of Points, we seek to highlight and problematize the process of differentiation of three artistic gymnastics apparatuses/events: still rings, strictly for men; uneven bars, created for women; and vault table, common for women and men. As a result, it has been found that the differentiation of apparatuses based on the sex/gender of the athlete reflects and responds to the maintenance needs of the social order of sex/gender and the sexual division of labor in each historical moment, thus operating as a normalizing instrument, in particular as regards sex/gender, the expressions of femininity and masculinity, and the arbitrary and compulsory character of the separation of men and women in sports competitions.

Keywords: Artistic Gymnastics, Device, Technologies of Sex/Gender, Femininities, Masculinities.

Tecnologías de sexo/género en Gimnasia Artística: el proceso de diferenciación sexual de anillas, barras asimétricas y mesa de salto

Resumen: Este artículo analiza el desarrollo de la gimnasia artística y las tecnologías sexo/género que instituyen, operan y sostienen la bicategorización de sus dispositivos y eventos. Por lo tanto, pensamos en esta modalidad como uno de los elementos del dispositivo deportivo cuyo funcionamiento es interdependiente y complementario al dispositivo sexo/género. Por medio de una investigación bibliográfica y un corte histórico que comienza en la segunda mitad del siglo XIX hasta el Código de Puntuación 2017-2020, buscamos evidenciar y problematizar el proceso de diferenciación de tres aparatos/eventos de gimnasia artística: anillas, estrictamente para hombres; barras asimétricas, creadas para mujeres; y mesa de salto, común para mujeres y hombres. Como resultado, encontramos que la diferenciación de dispositivos basada en el sexo/género del practicante refleja y responde a las necesidades de mantener el orden social de sexo/género y la división sexual del trabajo en cada momento histórico, operando así como instrumento que normaliza y normatiza el sexo/género, las expresiones de feminidad y masculinidad y el carácter arbitrario y obligatorio de la separación de hombres y mujeres en las competiciones deportivas.

Palabras clave: Gimnasia Artística, Aparato, Tecnologías del Sexo/Género, Femineidades, Masculinidades.

Introdução

Presente em todas as edições dos Jogos Olímpicos Modernos, a ginástica artística é um esporte que mescla exigências de componentes atléticos, técnicos e estéticos. Na medida em que valoriza a execução de exercícios de força, resistência, flexibilidade e potência, a modalidade qualifica e estabelece valores a códigos estéticos, abonando ou subtraindo pontuações, conforme o nível de perfeição do movimento corporal performado por atletas (bi)categorizados conforme dois sexos e gêneros possíveis e inteligíveis: macho/homem e fêmea/mulher1 (Butler, 2003). Como em grande parte dos esportes bicategorizados sexualmente2, o sexo/gênero3 na ginástica artística funciona e opera como um dispositivo de diferenciação sexual primário, ou seja, conforme Laqueur (2001, p. 18), anuncia a existência, especifica a função e produz a crença de que gônadas sexuais externas confirmam a existência de dois seres “incomensuráveis e opostos”, cujo o respeito à ética da igualdade de condições exigirá a a divisão sexual dos aparelhos, eventos, códigos de pontuações, regras e regulamentos, demandando formas distintas de utilização dos aparelhos e de julgamentos. (Gurlly, 2020)

Na ginástica artística, o ordenamento4 do sexo/gênero pode ser percebido de imediato na bicategorização dos aparelhos, parte deles são exclusivos para os homens, outros para as mulheres e dois (solo e mesa de salto) para ambos. Dessa maneira, os homens competem em seis aparelhos – solo, mesa de salto, barra fixa, barras paralelas, cavalo com alças e argolas –, e as mulheres competem em quatro – solo, mesa de salto, barras assimétricas e trave de equilíbrio. Embora, o solo e a mesa de salto apareçam para ambos, as exigências e os códigos de avaliação não são os mesmos para homens e mulheres. No solo, a Federação Internacional de Ginástica (FIG) somente as mulheres executam séries com acompanhamento musical coreografadas com elementos de dança, saltos gímnicos e giros, nas quais as expressões corporais e faciais ligadas a certa “harmonia artística e graça feminina” precisam ser consideradas, sob pena de dedução da nota em 0,10 pontos (FIG, 2016, Seção 13, p. 4) exigências que não constam nas normativas para as rotinas masculinas. No Código de Pontuação da Ginástica Artística Feminina (2017-2020) lê-se:

Expressão pode ser definida geralmente como a atitude e um conjunto de emoções exibidos pela ginasta tanto com sua face e através do seu corpo. Isto inclui como a ginasta geralmente se apresenta e se conecta com o júri e público, assim como sua habilidade de controlar/manejar sua expressão durante a realização dos mais difíceis e complexos movimentos. É também sua habilidade de atuar um papel ou uma personagem através da performance. Somada à execução técnica, a harmonia artística e graça feminina precisam ser também consideradas.

Não é apenas “o quê” a ginasta executa, mas também “como” ela desempenha sua rotina. (FIG, 2016, seção 13, p. 1 – itálicos nossos, negritos no original).

As divisões baseadas no sexo/gênero que fundamentam a maioria dos esportes modernos, resultam de regimes históricos e políticos provenientes daquilo que Foucault chamou de “acontecimentalizações”, a saber,

as conexões, os encontros, os apoios, os bloqueios, os jogos de força, as estratégias etc. que, em um dado momento, formaram o que, em seguida, funcionará como evidência, universalidade, necessidade. Ao tomar as coisas dessa maneira, procedemos, na verdade, a uma espécie de desmultiplicação causal. (2006, p. 341).

Em outras palavras, o esporte contemporâneo é resultado de discursos e jogos de poder que emergiram de diferentes fatos históricos, cada qual com suas próprias características, dinâmicas e reivindicações, por exemplo, Jogos Olímpicos, Guerras Mundiais, movimentos sufragistas, lutas e conquistas feministas e femininas, avanços científicos, costurados e coordenados entre diferentes países, blocos econômicos e ideológicos, no interior de diversas instituições e a partir das ações de inúmeros indivíduos. Como consequência, a bicategorização do sexo/gênero, a generificação dos movimentos do corpo, as distinções organizadas através de códigos e regulamentos, a valorização das expressões de feminilidades e masculinidades, a demanda por corpos devidamente sexuados, respondem ao esforço da ginástica artística na tarefa de garantir seu pertencimento ao fenômeno esportivo e, também, reflete o comprometimento dessa modalidade na manutenção dos ordenamentos sociais do sexo/gênero (Gurlly, 2020).

O dispositivo do sexo/gênero no esporte ainda tem: a) reforçado as concepções de esporte enquanto um domínio naturalmente masculino (Elias & Dunning, 1992); b) refletido e legitimado a divisão sexual do trabalho (Louveau, 2007; Kergoat, 2009); c) regulado possíveis aproximações das performances e expressões de feminilidades e masculinidades, ratificando a compulsoriedade da matriz de gênero e da heteronormatividade (Butler, 2003; Anderson, 2011); d) atribuído valores distintos e distintivos aos capitais políticos, culturais, econômicos e sociais de homens e mulheres, no interior e fora do contexto das competições (Louveau, 1998, 2007).

Diante dessa problemática, vinculado a referenciais feministas, teorias de gênero e abordagens históricas, este artigo tem como objetivo descrever e analisar a criação, o desenvolvimento, a adaptação e divisão baseada no sexo/gênero de três aparelhos/eventos da ginástica artística: as barras assimétricas, criadas exclusivamente para as mulheres nos idos dos anos de 1930; as argolas, cujo usos competitivos foram interditados na ginástica artística de mulheres ao final da década de 1950; e, por fim, a mesa de salto que, embora seja um aparelho “unissex”, tem sido historicamente compartilhada de formas distintas por homens e mulheres. Nosso propósito não é apenas problematizar a bicategorização dos aparelhos, mas expor a regularidade e a operabilidade das diferenciações, divisões e mesmo das segregações sexuais criadas e mantidas por eficientes tecnologias de sexo/gênero.

Para compreender o que seriam as tecnologias de gênero é necessário pensar o esporte, a ginástica artística e o gênero como dispositivos, componentes organizados, operantes e relativamente interdependentes da estrutura da sociedade ocidental contemporânea. Foucault sustenta que o dispositivo é

[...] um conjunto decididamente heterogêneo que engloba discursos, instituições, organizações arquitetônicas, decisões regulamentares, leis, medidas administrativas, enunciados científicos, proposições filosóficas, morais, filantrópicas. Em suma, o dito e o não dito são os elementos do dispositivo. O dispositivo é a rede que pode tecer entre estes elementos. (1979, p. 244).

O esporte, pensando através do conceito de dispositivo de Foucault (1979), emergiu no cenário europeu do final do século XVIII e depois se alastrou através das migrações, trocas culturais e processos colonizadores por outros continentes, onde também foi utilizado para colonizar, decolonizar, (re)educar, corrigir, regular, controlar e governar os indivíduos e seus corpos, para que atendessem às necessidades econômicas, sociais, políticas e culturais requeridas pelo capitalismo e o colonialismo. Os dispositivos esporte e sexo/gênero são dois sistemas materializados e operantes que, através de estratégias e operações, fazem o poder chegar até o indivíduo. Ambos, esporte e sexo/gênero, são subsidiados por discursos, práticas, instituições, táticas, ditos e não ditos que, apesar de instáveis, maleáveis e heterogêneos – coordenados por diferentes regimes de poder –, emergiram num dado momento histórico para atender às necessidades e urgências instaladas (Foucault, 1979). Embora tenham conjunturas e operabilidades próprias, tais dispositivos são interdependentes e ao mesmo tempo retroalimentados por outros, como os dispositivos da educação, segurança, justiça, trabalho. Dito de outro modo, na mesma medida que o esporte tem garantido sua existência e função social, mediante processos de diferenciação e bicategorização sexual5, ele tem servido para naturalizar e inculcar concepções de que os homens e mulheres são naturalmente constituídos e distintos, “estáveis, incomensuráveis e opostos” (Laqueur, 2001, p. 18).

Os dispositivos são matrizes reguladoras e produtivas. Eles demandam a existência e a operabilidade de uma rede de técnicas e práticas para fazer o “poder” alcançar o indivíduo e seu corpo. A essa rede operacional dos dispositivos, Passos (2020) chama de tecnologias de sexo/gênero. O termo “tecnologia de gênero” é tributário dos estudos de Tereza De Lauretis (1994), para quem o gênero pode ser pensado “como representação e como autorrepresentação, [...] um produto de diferentes tecnologias sociais [...] de discursos, epistemologias e práticas críticas institucionalizadas, bem como das práticas da vida cotidiana” (p. 208). Mediante as “tecnologias de gênero” de De Lauretis e, também, das “tecnologias do eu” discutidas por Foucault (1988), Passos compreende as tecnologias de sexo/gênero como:

[...] um conjunto de saberes, práticas, técnicas e estratégias que, ao produzir e reproduzir códigos; submeter atitudes e condutas; investir em modos de ser, sentir e se expressar; dispor e regular existências; sustentar normas e normalidades e orientar valores (estéticos, éticos, morais); promove o disciplinamento, a docilização e a normalização do indivíduo, seu corpo e suas expressões em relação a uma coerência relativa (no sentido de ser relacional e instável), em resposta às demandas dos dispositivos, aqui, o esporte e o sexo/gênero. (Passos, 2020, p. 32).

Ainda segundo Passos (2020), nos esportes e na ginástica artística as tecnologias de gênero se revelam na forma como foram construídas e generificadas as regras e os regulamentos; na diferenciação sexual das provas, equipamentos, aparelhos e vestimentas; na prática de se comparar as performances atléticas, como se os homens e seus corpos fossem naturalmente mais competentes e eficientes que as mulheres e seus corpos; na forma como os discursos científicos6 têm sido utilizados para criar e manter as diferenças sexuais, exigindo a separação de homens e mulheres com a finalidade garantir a igualdade de condições; nas desvalorizações econômicas e sociais do trabalho das mulheres no campo esportivo; na maneira como as instituições esportivas têm buscado e criado marcadores de sexo/gênero e, consequentemente, tem imposto exames, testes e regulações para as mulheres atletas, sobretudo, sobre corpos transexuais e intersexos.

Amparados na teoria do dispositivo (esporte e sexo/gênero), nos processos operacionais conduzidos minunciosamente pelas tecnologias de sexo/gênero e no exercício histórico de criação e implantação de marcadores capazes de assegurar o mérito da bicategorização de sexo/gênero nos esportes, empreendemos revisões bibliográficas e documentais sobre a história, a inserção e o desenvolvimento da ginástica artística ao longo dos séculos XVIII e XXI, no interior de dois cenários e três aparelhos/eventos. Os cenários foram: 1) Os Jogos Olímpicos em dois momentos: a) 1896 com a estreia e a configuração dessa modalidade como um esporte competitivo e, posteriormente, espetacular; b) 1928 com a conquista por parte das mulheres de participarem dos Jogos Olímpicos como atletas oficiais–; 2) Campeonatos Mundiais, a partir de 1930, nos quais as mudanças e adaptações na ginástica artística foram e ainda são testadas para depois serem ou não incorporadas aos programas competitivos da Federação Internacional de Ginástica (FIG) e do Comitê Olímpico Internacional (COI). E os eventos/aparelhos analisados foram: as argolas, utilizadas apenas pelos ginastas desde o final da década de 1950; as barras assimétricas, adaptação das barras paralelas (masculinas) para as ginastas nos anos de 1930; e a mesa de salto, aparelho utilizando por homens e mulheres, mas que guarda distinções na forma como é utilizado, julgado e nos incentivos que homens e mulheres recebem quando se propõem a incluir novos elementos nos códigos de pontuação.

Esporte, sexo/gênero: para cada conquista uma diferenciação

Do fim do século XVIII até as primeiras décadas do século XX, a Europa viu surgir dois modelos de educação do corpo que hoje consideramos as bases da Educação Física. Na porção continental, algumas pedagogias gímnicas de forte apelo moral e coletivo apareceram quase que concomitantemente na Alemanha, Suécia e França (Soares, 2007) e ficaram conhecidas como Métodos ou Escolas de Ginástica. Já na porção insular representada pelo Reino Unido, uma outra pedagogia do corpo, mais competitiva e burguesa, ganhou projeção a partir do seu uso em meados de 1820 como ferramenta disciplinadora nas Public Schools (Elias & Dunning, 1992). Embora, as ginásticas e os esportes tivessem como função a educação, o adestramento e o disciplinamento dos corpos e dos indivíduos, essas duas pedagogias inicialmente se alicerçavam em diferentes metodologias, objetivos e valores, transformando as aproximações entre eles num campo conflituoso.

Por intermédio de um poder disciplinar eficiente e produtivo, os esportes modernos incentivavam o prazer pelas proezas, o desejo pelas disputas e a vontade de comparar capacidades e habilidades físicas. A despeito dos esportes e dos métodos de ginástica terem a mesma finalidade – formar indivíduos masculinos, viris, saudáveis, brancos, sem deficiência física, úteis e moralmente condicionados –, as ginásticas destacavam o valor do coletivo em oposição ao individual, a dedicação patriótica às disputas burguesas, a formação geral em contraposição à especialização e a abnegação social em oposição à busca individual da satisfação, do prazer pelo prazer de jogar e competir (Papin, 2007).

É preciso dizer que, apesar de inicialmente terem defendido valores distintos, as ginásticas e o esporte respondiam, cada qual a sua maneira, às demandas da sociedade europeia nos séculos XVIII e XIX. Projeto que compreendia a educação e o controle dos indivíduos e grupos sociais dentro de padrões atitudinais e comportamentais considerados mais refinados e com menor tolerância à violência física (Elias & Dunning, 1992). Essas transformações, iniciadas nos séculos XVI e XVII, fizeram parte do que Norbert Elias chamou de “processo civilizador” (Elias & Dunning, 1992), cuja “esportivização” seria uma de suas expressões finais. Joseph Maguire (2007) sustenta que a esportivização promoveu:

[...] mudanças em direção à incorporação de esforços competitivos, regularizados, racionalizados e generificados que, em troca, se conectavam a uma rede de mudanças ao nível da personalidade, condutas corporais e interações sociais. Esse processo envolveu a regulação da violência, o desenvolvimento de um conjunto de regras e de órgãos governamentais e mudança do habitus corporal. (p. 1).

Ao final do século XIX, mediante a inclusão das competições de ginástica no programa oficial dos primeiros Jogos Olímpicos em 1896, alguns elementos e aparelhos, valores sociais foram apropriados no processo de configuração de um novo esporte, a ginástica artística. Nesse decurso, as pedagogias gímnicas foram ajuntadas e reorganizadas dentro dos mesmos modelos do esporte inglês. Sob o guarda-chuva do esporte, a ginástica artística se transformaria em mais uma das ferramentas para a incorporação do autocontrole, autocensura (Elias & Dunning, 1992) e disposições competitivas dos indivíduos.

Diferentemente do que ocorre com outras modalidades, os primeiros passos da esportivização da ginástica artística são bem conhecidos, pois, mesmo a contragosto dos seus antigos pedagogos e instituições, as primeiras competições internacionais desse esporte se deram a partir dos Jogos Olímpicos de Atenas em 1896, evento que marcou igualmente o início da seara de lutas e conquistas das mulheres ao acesso às competições esportivas olímpicas e internacionais.

Embora as mulheres tivessem participado de algumas outras competições antes e após Atenas 1896, foi somente a partir dos Jogos Olímpicos de Amsterdã em 1928 que elas conquistaram definitivamente a condição de competidoras oficiais nas Olimpíadas Modernas, sendo por primeira vez aceitas em competições de ginástica de equipe e de atletismo (Guttmann, 1991). Para tanto, combateram interdições que provinham das ciências biomédicas, de enunciados que circulavam nas áreas da educação e nas ciências da psiquê – psicologia e psicanálise –, de constrições presentes nos códigos morais e culturais de suas épocas, além de lutarem contra os vetos e os menosprezos que proliferavam no interior do Comitê Olímpico Internacional, muitos deles defendidos pelo autoproclamado patrono dos Jogos Olímpicos Modernos, Pierre de Coubertin, que dizia que as mulheres nos estádios só serviam para apoiar e aplaudir os feitos dos homens, pois nada podia ser mais “antiestético” que vê-las competindo na presença de espectadores (CIPC - COMITÊ INTERNACIONAL PIERRE DE COUBERTIN, 2015). Conforme Guttmann (1991), a abertura definitiva para a participação de mulheres nos Jogos Olímpicos a partir de 1928 resultou do afastamento de Pierre de Coubertin do Comitê Olímpico Internacional e das pressões exercidas por mulheres para participar de competições de nível internacional.

Embora tenham começado a competir oficialmente na ginástica artística nas Olimpíadas em 1928, as mulheres tiveram que esperar por seis anos para que a FIG, enfim, reconhecesse e empreendesse a realização do 1º Mundial de Ginástica Artística com mulheres, que ocorreria junto com o 10º Campeonato Mundial com homens, na cidade de Budapeste, Hungria, em 1934 (Barrull, 1984). Contrária à realização de eventos competitivos para mulheres, a FIG só permitia apresentações e demonstrações, entretanto, as pressões por parte das conquistas femininas e feministas no campo esportivo7, político e cultural forçaram a entidade a admitir e empreender o primeiro mundial feminino, isso a apenas dois anos das competições dos Jogos Olímpicos de Berlim, consumadas na primeira quinzena do mês de agosto de 1936 (Grossfeld, 2014; Barrull, 1984).

Quando as mulheres foram, enfim, reconhecidas pela FIG em 1934, os seis aparelhos oficiais da ginástica artística masculina – barra fixa, barras paralelas, argolas, cavalo com alça, mesa de salto8 e solo –, já tinham sido definidos desde os Jogos Olímpicos de 1932. Todavia, no caso das mulheres, somente depois de vinte anos, após inúmeras disputas e negociações, interdições e adaptações, é que os aparelhos femininos – barras assimétricas, trave, mesa de salto e solo – foram definidos oficialmente, isso nos Jogos Olímpicos de Helsinque em 1952 (Barrull, 1984). Salvo algumas modificações, até a década de 1930, as mulheres aprendiam elementos, se exercitavam e competiam nos mesmos aparelhos que os homens. No solo as séries eram coletivas, utilizava-se aparelhos portáteis como bastões, lenços, arcos, não havia premiação individual e nem acompanhamento musical (Barrull, 1984). Nos Jogos de Estocolmo 1912 e Antuérpia 1920, a programação das competições de ginástica eram uma mescla entre o Método Sueco e o Alemão, desse modo, pelo sistema sueco os ginastas deveriam apresentar rotinas na trave de equilíbrio, aparelho que foi usado pedagogicamente pelos alemães Guts Muths e Ludwig Jahn, pelo sueco Pehr Henrick Ling e, também, nas aulas de cunho militar do método francês desenvolvido por Francisco Amorós (Langlade & Langlade, 1970; Barrull, 1984).

O discurso que fundamentava as adaptações, iniciadas em 1932, reforçava o projeto de instituir uma identidade própria à ginástica artística, tornando-a mais competitiva e, também, mais espetacular, para isso, as acrobacias começaram a ser aceitas nas séries com homens (Barrull, 1984) e alguns aparelhos começaram a ser modificados para “garantir” a participação. Com a inserção dessa nova categoria, as reconfigurações que foram implantadas na ginástica artística passaram a responder a duas preocupações. A primeira era “permitir” a participação das mulheres, mas em eventos e aparelhos que fossem convenientes às suas capacidades físicas, conforme ditavam as ciências biomédicas da época (Pfister, 1990). Para as mulheres, a delicadeza, expressões não orais de feminilidade, emotividade, fluidez e ritmo, e para os homens a força, resistência, estatismos, racionalidade, cadência e retidão nos movimentos (Gurlly, 2020). A segunda preocupação era garantir que, embora fosse praticada por homens e mulheres, a ginástica artística se mantivesse nitidamente bicategorizada, com fronteiras marcadas e efetivas, confirmadas pelo uso dos aparelhos, pela distinção na execução dos elementos corporais, pelas diferenças nas estéticas dos corpos e pela generificação dos movimentos corporais (Barker-Ruchti, 2009; Gurlly, 2020).

A concepção de que o movimento humano seria naturalmente definido pelo sexo/gênero era parte dos enunciados que marcavam a circularidade discursiva na década de 1950. Frederik Jacobus J. Buytendijk, professor de fisiologia e psicologia do movimento humano e comparado da Groningen University, Holanda, enunciava:

A forma fenomenal do movimento masculino é, portanto, subdividida em partes, cada uma com um ponto final notadamente pronunciado, e a ação, como um todo, tem um final bem marcado. Esse fim, ou meta, é o momento definidor que dá sentido a todo o movimento e que aparece em cada uma das partes. Qualquer ação abrupta e direta, reta, notadamente finalizada, tem, portanto, um caráter masculino. O mesmo pode ser dito para os movimentos dos animais. Tudo o que é salto, ataque, tudo o que é movimento carnívoro é movimento masculino, mesmo que seja a fêmea quem o executa. (1957, p. 436).

Alguns pesquisadores e pesquisadoras observaram que as adaptações, implantadas a partir de 1930 e no decorrer dos anos 1950, nos aparelhos para mulheres recorriam ao discurso de que as mudanças garantiriam mais segurança na execução das rotinas e que as exigências e os elementos corporais obrigatórios fossem condizentes com as capacidades físicas inatas das mesmas (Barrull, 1984; Louveau, 2007; Meyers, 2012). Um discurso que, conforme Elias & Dunning (1992); Louveau (1998) e Gurlly (2020), reforçava ainda mais a crença de que, embora o esporte pudesse expor o praticante a situações de violência e risco, esse fenômeno social seria um dos domínios naturais dos homens e que, portanto, não exigiria “adaptações” ou “modificações” para mitigar possíveis riscos ou torná-lo praticável.

Inicialmente construído sem o ‘sexo frágil’, o esporte se tornará – práticas e representações se reforçam mutualmente ao fio do tempo – não apenas atributo e competência próprios aos homens ou aos jovens, mas o local onde eles se exprimem, se organizam e se dão a demonstrar sua excelência e especificidade. O esporte – praticado, considerado e discorrido – é e se mantém fundamentalmente constitutivo da identidade viril. (Louveau, 1998, p. 24).

Por sua vez, Gurlly (2020) e Anderson (2011) argumentam que a tarefa de demarcar com nitidez o distanciamento entre as expressões de masculinidade e feminilidade foi fortalecida ao final do século XIX quando, impulsionada pela emergência do “sujeito homossexual”, a sociedade começou a temer a feminização do social (Messner, 1988, p. 200). Conduzida pelo medo da feminização da masculinidade e receosa com a homossexualidade, a sociedade ocidental buscou firmar e fortalecer as fronteiras entre o que considerava ser atributos e competências de homens e mulheres, masculinidades e feminilidades (Anderson, 2011). Um dos âmbitos em que esses medos se mostraram mais abertamente e continuam a balizar as discussões a respeito de regulamentos e técnicas é, justamente, o esportivo (Camargo; Kessler, 2017).

O medo da feminilização – aumento do quantitativo de mulheres –, e da feminização – transformações qualitativas ocasionadas pelo aumento da participação das mulheres (Yannoulas, 2011) –, foi materializado ao final da Primeira Guerra quando ocorreu o que Messner (1988) chamou de a primeira crise da masculinidade. Crise que teve uma segunda onda, logo após a Segunda Guerra, quando as mulheres voltaram a ocupar os espaços deixados pelos homens que haviam sido enviados para o campo de batalha. Com a conquista de poder e projeção pelas mulheres, os homens temeram ainda mais a “feminização do social”. Alguns deles e várias das instituições que fundaram, sobretudo no campo da cultura corporal, partiram em defesa do ordenamento do gênero, exigiram que as fronteiras entre os sexos fossem fortalecidas e que fossem ensinados aos meninos e homens jovens valores masculinos e viris (Messner, 1988). Como consequência, entre as décadas de 1920 e 1950, ocorreu no campo esportivo a instalação e a operação de um conjunto tecnologias para demarcar o que era do domínio dos homens e o que convinha às mulheres.

A diferenciação sexual dos aparelhos da Ginástica Artística

Do processo de esportivização da ginástica em 1896, depois, com a entrada das mulheres nas competições olímpicas em 1928, as alterações no sentido de afirmar a bicategorização do sexo/gênero. Nesta seção, tomamos com objeto de reflexão três aparelhos específicos: 1) as argolas (de uso competitivo exclusivo dos homens); 2) as barras assimétricas (adaptadas para serem utilizadas nas competições com mulheres); 3) a mesa de salto (aparelho de uso comum, “unissex”, mas com lógica interna distinta para homens e mulheres); para analisar como o processo de diferenciação sexual contribuiu para a manutenção da bicategorização da modalidade, reforçando expressões tradicionais de masculinidade e feminilidade no âmbito do aprendizado, utilização recreativa e/ou com fins competitivos. Ademais, serão apontadas algumas outras questões contemporâneas produzidas pela bicategorização e as distintas exigências feitas a homens e mulheres, cujas respostas não serão apresentadas, dado o escopo e a falta de espaço para a conclusão dessa tarefa.

Argolas

As argolas são heranças da cultura corporal funambulesca, saltimbancos, equilibristas e toda uma gama de artistas que, antes mesmo das sistematizações dos métodos ginásticos, já haviam incorporado um vasto vocabulário motor no uso do aparelho. O aparelho podia ter morfologias distintas, argolas pequenas, grandes arcos, apoios das mãos no formato de triângulos ou no estilo dos trapézios circenses – uma barra amarrada nas pontas por cordas ou cabos. O formato composto por duas empunhaduras, mais próximo da atual morfologia do aparelho, é atribuído a Karl Adolf Spiess, ex-ginasta e educador alemão que descreveu a utilização do aparelho em 1842, a partir das influências que teve dos outros métodos ginásticos, sobretudo, os métodos de Friedrich Ludwig Jahn e do sueco Pehr Henrik Ling (Naul, 2002).

Diferentemente dos antecessores, Spiess preconizava uma metodologia de ensino mista e com finalidades puramente educacionais, para tanto, ministrava igualmente exercícios de balanceios e sustentação para meninos e meninas (Naul, 2002). Outro grande expoente dos sistemas europeus de ginástica, Francisco Amorós y Ondeano, “pai da ginástica francesa”, empregava um aparelho parecido com os trapézios circenses nas exercitações que eram dedicadas quase que exclusivamente aos homens. Embora afirmasse: “As mulheres, antes de serem mães, devem ser robustas [...] isso exige uma educação que as façam fortes, sem excessos e habilidosas, e a ginástica, bem conduzida, é o único meio de obter tais resultados” (Amorós y Ordeano, 1848, p. 145-146), tanto o método de Amorós como o alemão e o sueco foram sistematizados prioritariamente para atender aos homens e suas expressões de masculinidade e virilidade.

No início da esportivização da ginástica artística, os exercícios realizados nos trapézios e argolas encorajavam movimentos dinâmicos e balanceios. Entretanto, em 1926 (Barrull, 1984) as maneiras de utilizar as argolas nas competições vão se tornando mais estáticas, favorecendo as demonstrações de força, resistência e de domínio do aparelho. Ainda que as argolas sejam o único aparelho da ginástica artística que se movimenta com e pela ação dos ginastas, as movimentações excessivas e descontroladas, assim como as demonstrações de instabilidade do corpo são punidas com deduções nas notas (FIG, 2017), pois se exige que o atleta controle tanto o seu corpo como o próprio aparelho.

As argolas, como praticamente todos os aparelhos da ginástica artística, incorporam e evidenciam certos valores que a sociedade tem imputado historicamente aos homens, como sujeitos estáveis e dominantes. Por isso, quando as argolas foram inseridas nas competições com mulheres no Campeonato Mundial de Praga em 1938, seus usos passaram por “adaptações” e se tornaram mais dinâmicos e instáveis, de tal modo que o evento passou a ser chamado de “argolas balançantes” (Barrull, 1984).

Diferentemente das rotinas com os homens, as séries de argolas para as mulheres eram realizadas com o aparelho em movimento, as sustentações, poses e transições eram executadas enquanto a ginasta e o aparelho balançavam para frente e para trás, por isso, a prova feminina ficou conhecida como “argolas balançantes” ou “argolas voadoras” (Barrull, 1984, p. 317). Em razão da exigência dos balanceios, o evento era considerado perigoso e levantava dúvidas e críticas, muitas reclamavam que o aparelho deveria ser excluído da programação para mulheres e poucas levantavam a possibilidade de igualar as características do aparelho, tornando seus usos semelhantes àqueles exigidos dos homens. Não obstante as reivindicações da comissão técnica da ginástica artística feminina, que havia votado pela supressão das barras assimétricas e das argolas em 1946, o aparelho ainda na sua versão “balançante” fez parte da programação dos eventos compulsórios nos Jogos Olímpicos de Londres 1948, quando contou pontos para as equipes das ginastas. As séries nas argolas balançantes e o discurso da sua periculosidade aparecem no relatório oficial das Olimpíadas de 1948, publicado no mesmo ano pelo Comitê Olímpico Internacional (IOC), como se lê abaixo:

A equipe masculina da Finlândia estava na barra fixa, enquanto as britânicas estavam nas argolas balançantes. Um dos ginastas tinha acabado de finalizar um belo exercício voluntário, e logo, o estrondo dos aplausos veio dos espectadores, a ginasta nas argolas refugou bem no momento que se preparava para finalizar a série. A finalização foi considerada como ‘salto perigoso’, então foi com grande alívio que ela aterrissou em segurança, embora, sem dúvida, ela tenha perdido alguns pontos por causa do incidente. (IOC, 1948, p. 371).

Sob a organização da FIG, a programação do Campeonato Mundial de Basileia, Suíça, realizado em 1950, ainda promoveu competições nas argolas balançantes, todavia, esse evento foi o último em que o aparelho fez parte das competições com mulheres, uma vez que foram definitivamente suprimidas num congresso em 1953 (Barrull, 1984). Barrull (1984) e Meyers (2012) sugerem que essa exclusão teria se baseado em critérios de segurança e incompatibilidade dos usos do aparelho em relação ao ideário da década de 1950 sobre as capacidades físicas do corpo das mulheres. Meyers (2012) critica que a falta de equipamentos de segurança pode até ter pesado na decisão da comissão técnica, contudo, para ela foram as concepções de que o corpo das mulheres não tinha força suficiente para suportar a execução dos elementos e dos “perigosos” balanceios.

Durante muito tempo, os exercícios de tração foram desencorajados para as mulheres, algo que ainda ecoa nos Testes de Aptidão Física (TAF), cuja exigência para as candidatas é o tempo de permanência em sustentação e não a tração como ocorre no TAF aplicado para os homens. É preciso dizer que essas interdições são instáveis, maleáveis e localizadas na ginástica artística competitiva, visto que acrobatas circenses, por exemplo, demonstram grande capacidade física e destreza em aparelhos muito similares às argolas da ginástica artística. Outrossim, também temos assistido a uma nova retomada das argolas balançantes, apresentadas individualmente ou em conjunto de dois a quatro aparelhos, com a participação de homens e mulheres em séries tão interessantes quanto desafiadoras.9

Barras Assimétricas

Para analisar as barras assimétricas é preciso lançar olhares sobre as barras paralelas simétricas, suas antecessoras. Langlade & Langlade (1970), Barrull (1984) e Publio (2005, 1998) concordam que de todos os aparelhos da atual configuração da ginástica artística, as barras paralelas são as que têm realmente um “inventor”, Friedrich Ludwig Jahn. De início, Jahn utilizava as barras paralelas para o fortalecimento dos braços, mas gradualmente outros modos de uso como rolamentos, reversões, paradas, balanceios e diferentes empunhaduras foram inseridos. Salvo o cuidado para que os exercícios não aumentassem em demasia a força e o volume dos músculos dos braços, a partir de fins do século XIX, as mulheres usavam as barras paralelas de maneiras similares aos homens (Barrull, 1984; Grossfeld, 2014; Pfister, 1990).

Em 1912 nos Jogos Olímpicos de Estocolmo as ginastas dinamarquesas e norueguesas se apresentaram nas barras paralelas (IOC, 1913), mas foi somente a partir do Campeonato Mundial de Budapeste em 1934 que, além das séries nas barras paralelas, as mulheres começaram se apresentar, ainda sem fins competitivos, nas barras assimétricas (Barrull, 1984). Como os campeonatos mundiais são “eventos teste” para novos equipamentos, novas regras e regulamentos que podem ser implantados nas competições seguintes, o evento teste de 1934 serviu tanto para selecionar as/os ginastas que participariam dos Jogos Olímpicos de Berlim em 1936, como para experimentar um novo formato para as competições femininas que incluía uma rotina de exercícios em barras colocadas em alturas assimétricas.

Pelo regulamento de Berlim 1936, as ginastas deveriam se apresentar em duas séries de exercícios nas barras, uma compulsória e outra livre. A compulsória, composta por uma série de exercícios previamente ordenados, deveria ser executada nas barras assimétricas. Na série livre, caracterizada pela apresentação de rotinas individualizadas, criadas conforme as habilidades da ginasta, as atletas podiam escolher em qual aparelho – paralelas ou assimétricas – executariam seus exercícios. Como a grande maioria das ginastas já tinham aprendido e treinado nas barras paralelas (IOC, 1936), elas acabavam por escolhê-las em detrimento às assimétricas (Barrull, 1984). Porém, num congresso realizado durante o Campeonato Mundial de Praga em 1938, enquanto alguns membros da FIG rejeitavam a retirada das provas de atletismo10 dos programas da ginástica artística, votavam para que as barras assimétricas substituíssem definitivamente as paralelas e, assim, fossem mantidas como um aparelho estritamente feminino, o único “criado” exclusivamente para as mulheres11(Barrull, 1984).

Apesar da interdição, algumas ginastas que haviam aprendido e treinado nas paralelas, continuaram a se exercitar e se apresentar não competitivamente. Partes desse vocabulário motor podem ser observadas nas demonstrações feitas pela alemã Johanna Quaas12, considerada a “ginasta mais longeva do mundo”. Quaas começou a competir em 1934, antes da divisão sexual das barras, por isso, os exercícios que executa guardam similaridades com os elementos apresentados pelos homens nas competições atuais, com apoios, pranchas e outros exercícios estáticos.

Foi no mesmo ano em que Quaas começou a competir, 1934, que se deu o processo de feminização das barras paralelas. O aparelho que flertava com a igualdade de condições de uso para homens e mulheres, foi reelaborado e se tornou assimétrico, não somente porque colocaram as barras em alturas distintas, mas porque determinaram que deveria ser utilizado competitivamente pelas mulheres. Somadas a outras tecnologias de gênero, as barras assimétricas se tornaram femininas e, como qualquer tecnologia – techne mais logos –, a técnica e a/o razão/saber passaram a ser utilizadas tanto para feminilizar – aumentar a quantidade de mulheres a usar o aparelho –, quanto para a feminização das usuárias e dos seus corpos. Os antigos usos, marcados pelos elementos de força e estatismo, darão lugar aos movimentos em élans (conectados entre si), balanceios, giros, largadas e retomadas.

Barker-Ruchti (2009) argumenta que foi a partir de 1966, em especial com as apresentações da ginasta estadunidense Doris Fuchs Brause13, que as séries nas barras assimétricas se tornaram mais dinâmicas, sem interrupções entre os elementos gímnicos e entre as passagens de uma barra para outra. Formada em um ginásio que não dispunha de barras assimétricas, Brause teria aprendido e incorporado um repertório motor composto por balanceios e giros, treinados na barra fixa. Contudo, as inovações propostas por Brause não foram recebidas positivamente nas suas primeiras apresentações. Como já teria ocorrido com outros aparelhos, o dinamismo da rotina de Brause foi subnotificado, não recebendo a nota que merecia por parte da banca de arbitragem. Barker-Ruchti (2009) sugere que as “notas baixas” de Brause nas primeiras competições seriam resultados da falta de competência técnica da banca para julgar as séries mais dinâmicas e o receio de que o aparelho perdesse a identidade até então instituída e aceita, em detrimento às rotinas dos homens na barra fixa e nas paralelas.

Mesa de Salto

O cavalo – para o salto e com alça – é um dos aparelhos mais antigos da ginástica. Ele aparece já nos primeiros manuais de ginástica, como no Die Deutsche Turnkunst, publicado por Friedrich Ludwig Jahn e Ernst Eiselen em 1816. Seu uso tinha como finalidade principal a preparação do indivíduo para o domínio do corpo, no ato de cavalgar, saltar e realizar manobras com o animal verdadeiro. Jahn e Eiselen (1967) propunham que, sempre que possível, o aparelho deveria reproduzir ao máximo a anatomia do animal, demandavam que seu corpo fosse recoberto de couro, os rabos fossem feitos de cabelos naturais, que os pescoços tivessem diferentes dimensões e que fosse munido de alças que simulavam a sela (Jahn & Eiselen, 1967). Em Die Deutsche Turnkunst, os autores descrevem detalhadamente os melhores materiais para a construção do cavalo, a quantidade ideal de aparelhos conforme a dimensão da praça de ginástica, a quantidade de ginastas por aparelho nas sessões e quais seriam as opções mais baratas em relação à estrutura e a madeira empregada no cavalo. Para Jahn e Eiselen (1967), os exercícios sobre o cavalo estavam entre os mais completos e os que demandavam mais técnica na sua execução. Apesar da ginástica alemã e da francesa terem sido desenvolvidas por homens em favor dos homens, as mulheres começaram a adentrar esse universo a partir da segunda metade do século XIX (Pfister, 2011). Entre os vários exercícios que executavam no cavalo, muitos eram empreendidos no cavalo com alças que, nas competições, faziam parte apenas da programação da ginástica artística com homens.

Nos Jogos Olímpicos de Paris em 1900, Londres 1908, Estocolmo 1912 e Antuérpia 1920, o salto sobre o cavalo não fez parte da programação das competições com homens, embora tenham ocorrido demonstrações no aparelho (IOC, 2015). A ausência do evento nas programações pode ter explicação no menosprezo que parte da organização ainda tinha acerca do passado “acrobático” do cavalo. Barrull (1984) argumenta que durante muitas décadas os instrutores e técnicos de ginástica ignoraram as acrobacias, porque acreditavam que elas pertenciam à cultura circense, sendo pouco racionais e úteis para a modalidade. Além disso, entre os anos de 1900 e 1920, o aparelho ainda não tinha sido dividido – cavalo para saltos e cavalo com alças –, como consequência, os impasses entre os distintos usos acabaram por atrapalhar a sua implantação na programação competitiva. Contratempo que foi minimizado nos Jogos Olímpicos de Paris 1924, quando a FIG se tornaria a regente absoluta da ginástica artística e suas competições, internacionais e/ou olímpicas (Barrull, 1984).

Com relação à participação das mulheres no aparelho, entre os Jogos Olímpicos de Amsterdam 1928 e de Londres 1948, elas competiram no salto sobre o cavalo, porém suas notas serviam apenas para suas as equipes, já que elas só começaram a competir individualmente na década de 1950. Em algumas referências bibliográficas, como no Gymnastics: History of Artistic Gymnastics at the Olympic Games (IOC, 2015), publicado pelo Centro de Estudos Olímpicos, órgão de responsabilidade do Comitê Olímpico Internacional, podemos nos equivocar ao ler e concluir que as mulheres só começaram a competir no salto sobre o cavalo nos Jogos Olímpicos de Helsinque 1952, quando, na verdade, já viessem a competir no aparelho desde a década de 1930, em eventos na versão por equipe (IOC, 1936).

Como resultado do reconhecimento das mulheres como atletas oficiais nos Jogos Olímpicos de Amsterdã 1928, as provas de salto na programação para os homens, que até então eram realizadas de duas formas, através da largura e do comprimento do aparelho, foram divididas sexualmente. A partir da década de 1930, as rotinas com homens passaram a ser executadas em relação ao comprimento, enquanto as rotinas com mulheres passaram a ser feitas na largura do aparelho, mudanças que, segundo Barrull (1984), visavam favorecer a segurança das ginastas, dado que se considerava ser mais arriscado e perigoso executar os saltos a partir do apoio das mãos no comprimento do aparelho.14

Nos Jogos Olímpicos de Melbourne em 1956, novas adaptações foram implantadas e a morfologia do “cavalo” para o salto perdeu definitivamente os últimos resquícios das antigas alças. Até 1956, as alças eram retiradas apenas para as competições de saltos, sendo recolocadas para as rotinas no cavalo com alças. Além dessa alteração, um novo equipamento foi inserido, o trampolim tipo Reuther (Barrull, 1984). Um equipamento mais flexível e que favoreceu substancialmente a repulsão dos e das ginastas, tornando possível o desenvolvimento de novas acrobacias, mais complexas e difíceis. Embora, a inclusão desse novo trampolim pudesse equiparar as performances de homens e mulheres, isso não foi feito e a bicategorização de sexo/gênero foi mantida. Aliás, no mesmo ano, 1956, também ficou decido que a altura do cavalo para os saltos seria diferente: 1,25 m para os homens e 1,10 m para as mulheres. Depois, em uma reunião do Comitê Técnico da Ginástica Artística após os Jogos Olímpicos de Montreal em 1976, foi votado que a altura do cavalo seria redefinida, ficando nos atuais1,35 m para os homens e 1,20 m para as mulheres (Barrull, 1984).

Se, por um lado, as modificações no aparelho elevaram a complexidade e a dificuldade das acrobacias, mediante o aumento da segurança e o incremento da força de repulsão, por outro, elas foram utilizadas para sublinhar a bicategorização da modalidade, seus eventos e aparelhos. A título de exemplo, no Campeonato Mundial de Ghent em 2001, o formato do cavalo para o salto foi alterado para um modelo que lembra uma “mesa”, por isso, hoje ele é chamado de “mesa de salto”, perdendo qualquer traço que pudesse remeter ao antigo cavalo dos velhos métodos ginásticos. As várias mudanças serviram para aumentar a área de contato das mãos, elevar os níveis de segurança, incrementar a força de repulsão e, por conseguinte, incentivar mais inovações nas acrobacias (Grossfeld, 2014). Possivelmente, essas alterações foram impulsionadas pelas críticas e os pedidos de “mais segurança”, após o trágico acidente da ginasta chinesa Sang Lan em 1998, que a deixou tetraplégica.15

Em conjunto com as diferenciações sexuais, materializadas na morfologia e na forma de usar os aparelhos, os regulamentos, regras e notações organizados sob a forma de Código de Pontuação, implantados em 1949 para os homens16 e em 1958 para as mulheres (Grossfeld, 2014; Barrull, 1984), instituíram, reforçaram e sistematizaram as desigualdades de sexo/gênero através da classificação, ordenamento e notação17 dos movimentos corporais e na forma como passaram a ser aplicadas as penalidades e os incentivos em relação à execução das acrobacias.

Embora, o salto sobre a mesa seja um evento unissex, com homens e mulheres alcançando performances muito parecidas, a listagem das acrobacias em cada um dos códigos (masculino e feminino) é significativamente menor para as mulheres. Nos códigos de pontuação referentes ao ciclo olímpico 2017-2020, a tabela de saltos comportava 98 acrobacias para os homens e 84 para as mulheres (FIG, 2016, 2017). Um mesmo salto, mesmo que executado por ambos os sexos, tem notas distintas, sendo menor para os homens, pois se considera que suas capacidades físicas (força, resistência, velocidade) facilitem a execução das acrobacias. O salto de maior grau de dificuldade no código feminino, “repulsão para frente seguida de dois mortais na posição grupada para frente”, chamado de “Produnova”, em homenagem à atleta russa que o executou pela primeira vez num campeonato do mundo de ginástica, Elena Produnova18, vale 6,4 pontos (FIG, 2016, VT-Group 2-2), porém, esse mesmo salto recebe uma nota de 5,2 pontos no código masculino (FIG, 2017, p. 106).

As diferenças nos valores das acrobacias performadas por homens e mulheres, refletem a crença da sociedade ocidental de que os homens são “mais fortes, “mais resistentes”, “mais velozes” e que, consequentemente, não precisariam do mesmo esforço físico e técnico para executar as mesmas acrobacias que as mulheres, portanto, suas “notas de partida”19 devem ser menores (Gurlly, 2020). Entretanto, esse mesmo código de pontuação, cujo entendimento estabelece um valor menor para certos movimentos, quando executados por homens, parece operar, em alguns momentos, com uma lógica contrária no caso da pontuação de saltos realizados para mulheres: em alguns casos, saltos considerados de elevado risco apresentam uma nota de partida mais baixa do que deveria. No caso da ginástica artística com mulheres essa é uma estratégia para desestimular a execução do elemento pelas ginastas, seja por sua “periculosidade”, “falta de apelo estético” ou pela incapacidade de outras ginastas executarem o mesmo movimento. Aliás, essa questão ganhou projeção na da mídia recentemente, quando a ginasta estadunidense Simone Biles se tornou a primeira mulher a realizar o salto Yurchenko double pike – entrada na mesa de salto através de um rodante mais um flick-flack e, após a repulsão com as mãos, a execução de dois mortais para trás na posição carpada –, uma acrobacia que recebeu uma nota de partida (6,600 pontos) considerada baixa pela mídia especializada20, pela própria atleta, técnicas/os e outras ginastas. Billes usou as redes sociais para criticar o posicionamento da FIG,21 porém o valor da nota de partida foi mantido.

Como uma dentre as várias tecnologias de sexo/gênero, os códigos de pontuação estabelecem e normatizam o que mulheres e homens aprenderão e deverão apresentar nas competições de ginástica artística. Sob o olhar treinado da banca de arbitragem e em relação à contemplação dos/das espectadores/as, os códigos de pontuação educam os julgamentos e insistem no ordenamento social do gênero, ao mesmo tempo que reforçam a divisão sexual do trabalho, atribuindo, por exemplo, valores de dificuldades distintos para movimentos realizados por homens e mulheres.

Com relação ao cavalo com alça, um dos aparelhos mais antigos da ginástica artística, conforme Nestor Soares Publio (2005), ele sofreu poucas alterações morfológicas desde os usos iniciais, nas sessões da ginástica alemã de Jahn e nos clubes de ginástica suíços. As principais alterações foram: o aumento da estabilidade do aparelho, o uso de materiais antiderrapantes e mais flexíveis, a troca por alças mais arredondadas e feitas de materiais mais resistentes, como a fibra de carbono.22 As últimas mudanças foram feitas no final da década de 1970, quando as “patas” foram substituídas por dois postes de sustentação, mantidos na posição por meio de cabos de aço ou correntes fixadas ao chão (Oliveira & Bortoleto, 2011).

Na mesma medida que o aparelho “cavalo com alça” não modificou muito sua morfologia e uso, ele também não passou por adaptações para o uso das mulheres, dado que elas nunca utilizaram o aparelho competitivamente. Possivelmente, porque as práticas corporais que exigiam força dos membros superiores, especialmente a estática, (Pfister, 1990), ou que demandavam movimentos com grande afastamento das pernas, típicos do aparelho, eram consideradas inconvenientes e mesmo indecorosas para as mulheres.

Conclusões

Observa-se que as conquistas das mulheres no campo esportivo, presenciadas e vivenciadas no decorrer do século XX e XXI, não significaram necessariamente a conquista da igualdade de sexo/gênero. Até porque a luta feminista é ampla, distinta, histórica e reacionária (no sentido de construir resistências contra os efeitos dos discursos (Foucault, 1979), seus campos de atuação e comunalidades são variáveis, portanto, lutar contra as assimetrias de poder entre homens e mulheres nos esportes exigirá olhares e problematizações para além do sexo/gênero. Nesse sentido, a socióloga ugandense-britânica, Avtar Brah (2006), nos adverte que:

As relações de poder entre homens e mulheres são vistas como a principal dinâmica da opressão das mulheres, levando às vezes quase à exclusão de outros determinantes como classe e racismo. [...] O significado de ser mulher – biológica, social, cultural e psiquicamente – é considerado uma variável histórica. (p. 343).

É possível afirmar que o esporte moderno não só tem tentado manter a naturalidade e a hierarquização de algumas diferenças (sexo/gênero, raça, classe, morfologias e fisiologias corporais, idade, procedência geográfica, credo religioso, capacitismo23, identidade de gênero), como tem produzido muitas outras. Para além da diferenciação e consequente bicategorização sexual dos aparelhos da ginástica artística, Brah (2006) sugere pensar:

Como a diferença designa o ‘outro’? Quem define a diferença? Quais são as normas presumidas a partir das quais um grupo é marcado como diferente? Qual é a natureza das atribuições que são levadas em conta para caracterizar um grupo como diferente? [...] A diferença diferencia lateral ou hierarquicamente? (p. 359)

Seguindo com Avtar Brah (2006), podemos dizer que o decurso da diferenciação sexual da ginástica artística não foi uma ação exigida apenas pelo processo de esportivização da modalidade, mas um recurso necessário para a manutenção da estrutura e do bom funcionamento do ordenamento social do sexo/gênero. Seguramente, o processo não foi apenas de opressão, pois as mulheres, sobretudo, as europeias e estadunidenses, conquistaram espaço e garantiram campos de atuação na ginástica artística, porém, a diferenciação é um processo sem fim, que se comporta conforme as relações de poder.

O período de 1924 ao final dos anos 1950, marcado pelas profundas alterações das duas Guerras Mundiais, sinaliza verdadeiramente o advento da ginástica artística (Barrull, 1984) e, também, a conquista e a definição dos aparelhos, provas e eventos para as mulheres. Foi justamente nesse período que a diferenciação sexual da ginástica artística foi empreendida. Por exemplo, em relação aos três aparelhos analisados, ocorreu a criação e a inclusão das barras assimétricas nos Jogos Olímpicos de Berlim em 1936, em substituição às barras paralelas, como uma prova específica para as mulheres (COI, 1936). As formas de usar a mesa de salto também se diferenciaram, pois, até 1932, os homens saltavam tanto através da largura como do comprimento do aparelho, depois, em 1936, eles passaram a saltar apenas no sentido longitudinal da mesa de salto e as mulheres no sentido da largura (COI, 1936). Nas competições de 1938, foi exigido que as ginastas se apresentassem nas argolas, porém, os exercícios que eram mais dinâmicos e balançantes, foram excluídos das competições no final da década de 1950 sob o argumento de serem perigosos demais para as mulheres. Reforçamos que os argumentos sobre os riscos e perigos atuam na diferenciação sexual, pois, de acordo com, Gurlly (2020), nas séries de solo os códigos de pontuação privilegiam acrobacias com graus de dificuldade maiores para os homens, deduzindo mais pontos em relação às aterrisagens, ao passo que, as mulheres devem se ater à música, ritmo, expressão, harmonia e postura corporal durante toda a série; não por acaso, as ginastas passam horas e horas nas salas de dança e ballet.

Embora os avanços tecnológicos, novas metodologias de ensino e aprendizado, acompanhamentos dietéticos personalizados, amparo multiprofissional, incentivos legislativos, aumento da visibilidade por meio de novas mídias, tenham influenciado substancialmente na performance de homens e mulheres na ginástica artística, a diferenciação sexual como fator de igualdade de condições ainda permanece. Entretanto, não podemos deixar de exaltar que os mesmos processos que diferenciaram e separaram, possibilitaram também às mulheres diferenças de subjetividade e identidade que têm fornecido às mesmas – herdeiras e rebeldes das categorizações do passado – novos posicionamentos e práticas (sexualização dos corpos, assédios sexuais e morais, revisão das notas de partida) 2425.

Por fim, queremos evocar que as diferenças sexuais, bicategorizações de sexo/gênero são compostas e organizadas em relações sistemáticas mediante discursos oriundos dos mais diversos campos, instituições e práticas. Isso significa dizer que um grupo, no caso FIG, mobiliza o conceito de diferença quando se trata a sistematicidade da genealogia histórica da sua experiência coletiva (Brah, 2006). Se um dia alcançarmos a “igualdade de gênero”, seguramente outras diferenças serão criadas e usadas, assim como já dividimos, separamos e segregamos atletas através do peso, idade, ranqueamento. Então, o grande desafio é não deixar que uma opressão se fortaleça sobre outra e que as opressões não sejam subdivididas, individualizadas; que as lutas contra o sexo/gênero estejam interconectadas e articuladas com outras categorias como classe, raça, identidade.

Agradecimentos

Gostaríamos de agradecer ao Árbitro Nacional Brasileiro de Ginástica Artística Masculina, Rafael Costa dos Passos [in memorian] por seus préstimos à modalidade.

Referências

Amorós y Ordeano, F. (1848). Nouveau manuel complet d’éducation physique, gymnastique et morale (Tome 1). Paris: La Librairie Encyclopédie de Roret.

Anderson, E. (2011). The rise and fall of western homohysteria. Journal of Feminist Scholarship, 1(1), 80-94.

Barker-Ruchti, N. (2009). Ballerinas and pixies: a genealogy of the changing female gymnastics body. The International Journal of the History of Sport, 26(1), 45-62.

Barrull, R. (1984). Les étapes de la gymnastique au sol et aux agrès en France et dans le Monde. Montréjeau: Fédération Française de Gymnastique, FABBRO.

Brah, A. (2006). Diferença, diversidade, diferenciação. Cadernos Pagu, 26, 329-376.

Butler, J. (2003). Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.

Buytendijk, F. J. J. (1957). Attitudes et Mouvements. Étude fonctionnelle du mouvement humain. Bélgique: Desclée de Brouwer.

Camargo, W. X. & Kessler, C. S. (2017). Além do masculino/feminino: gênero, sexualidade, tecnologia e performance no esporte sob perspectiva crítica. Horizontes Antropológicos, 23(47), 191–225. https://doi.org/10.1590/S0104-71832017000100007

COMITÊ INTERNACIONAL PIERRE DE COUBERTIN (2015). Pierre de Coubertin (1863-1937)Olimpismo Seleção de Textos. Porto Alegre: ediPUCRS.

De Lauretis, T. (1994). A tecnologia do gênero. Tradução de Suzana Funck. In H.Hollanda (org.), Tendências e impasses: o feminismo como crítica da cultura (pp. 206-242). Rio de Janeiro: Rocco.

Dunning, E. (2011). “Figurando” o esporte moderno: algumas reflexões sobre esporte, violência e civilização com referência especial ao futebol. Revista de Ciências Sociais, Fortaleza, CE, 42(1), 11-26.

Elias, N. & Dunning, E. (1992). A busca da excitação. Lisboa: Difusão Editorial Lda.

Fausto-Sterling, A. (2000). Sexing the body. New York: Basic Books.

Fausto-Sterling, A. (2012). Corps en tous genres. La dualité des sexes à l'épreuve de la Science. Paris: La Découverte.

Fédération Internationale de Gymnastique (2016). Code de Pointage 2017-2020. Gymnastique Féminine. Disponível em: http://www.fig-gymnastics.com/publicdir/rules/files/fr_WAG%20CoP%202017-2020.pdf Acesso em: 28 avril 2018.

Fédération Internationale de Gymnastique (2020a). FIG Apparatus Norms. Disponível em: http://www.fig-gymnastics.com/publicdir/rules/files/en_Apparatus%20Norms.pdf Acesso em: 23 maio 2020.

Fédération Internationale de Gymnastique (2020b). Men Artistic Gymnastics. Apparatus. Disponível em: https://www.gymnastics.sport/site/pages/disciplines/app-mag.php Acesso em: 21 jun. 2020.

Fédération Internationale de Gymnastique (2020c). Women Artistic Gymnastics. Apparatus. Disponível em: https://www.gymnastics.sport/site/pages/disciplines/app-wag.php Acesso em: 21 jun. 2020.

Fédération Internationale de Gymnastique (2017). Code de Pointage 2017-2020 - Gymnastique Masculine. Disponível em: http://www.fig-gymnastics.com/publicdir/rules/files/mag/CoP_MAG_2017-2020_ICI-e.pdf Acesso em: 28 abril 2018.

Fédération Internationale de Gymnastique (2016). Code de Pointage 2017-2020 - Gymnastique Féminine. Disponível em: http://www.fig-gymnastics.com/publicdir/rules/files/fr_WAG%20CoP%202017-2020.pdf Acesso em: 28 abril 2018.

Foucault, M. (1979). Microfísica do Poder (23 ed.). Rio de Janeiro: Edições Graal.

Foucault, M. (1988). Technologies of the self. In L. H. Martin... et al. (Ed.), A seminar with Michel Foucault (pp.16-49). Anherst: The University of Massachusetts Press.

Foucault, M. (2006). Estratégia, Poder-Saber. In M. B. Motta (org.), Ditos & Escritos IV (2da. ed). Rio de Janeiro: Forense Universitária.

Grossfeld, A. (2014). Changes during the 110 years of the World Artistic Gymnastics Championships. Science of Gymnastics, 6(2), 5-27.

Gurlly, A. W. (2020). From powerhouses to pixies and back: boys, men, and troubled masculinity in artistic gymnastics. In R.Magrath... et al. (org.), The Palgrave Handbook of Masculinity and Sport (pp. 135-150). Cham: Palgrave Macmillan.

Guttmann, A. (1991). Women’s sports: a history. New York: Columbia University Press.

International Olympic Committee (2015). Gymnastics: History of Artistic Gymnastics at the Olympic Games. Reference Document. Olympic Studies Centre. Disponível em: https://stillmed.olympic.org/AssetsDocs/OSC%20Section/pdf/QR_sports_summer/Sports_Olympiques_gymnastique_artistique_eng.pdf Acesso em: 26 abril 2020.

International Olympic Committee (2017). The Official Report of the Organising Committee for the XIV Olympiad – London 1948. London: MeCorquodale & CO. LTD.

International Olympic Committee (1913). The Official Report of the Olympic Games of Stockholm 1912. The Swedish Olympic Committee. Stockholm: Wahlström & Widstrand.

International Olympic Committee (1936). The XIth Olympic Games Berlin 1936. Official Report. Berlin: Wilhelm Limpert.

Jahn, F. L. & Eiselen, E. (1967). Die Deutsche Turnkunst zur Einrichtung der Turnplatze. Stuttgart: Verlagsdruckerei Conradi & Co.

Jacobus, M., Keller, E. F. & Shuttleworth, S. (1990). Body/politics. Women and the discourses in science. London: Routledge.

Keller, E. F. (1995). Reflections on gender and science. New Haven: Yale University Press.

Kergoat, D. (2009). Divisão sexual do trabalho e relações sociais de sexo. In H. Hirata… et al. (Orgs.), Dicionário Crítico do Feminismo (pp. 67-75). São Paulo: Editora UNESP.

Langlade, A. & Langlade, N. R. de. (1970). Teoria General de la Gimnasia (2 ed). Buenos Aires: Editorial Stadium.

Laqueur, T. (2001). Inventando o Sexo: corpo e gênero dos gregos a Freud. Rio de Janeiro: Relume Dumará.

Louveau, C. (1998). Première partie: au fil des jours: les femmes et les hommes dans les pratiques physiques et sportives. In A. Davisse & C. Loveau (org.), Sports, école, société: la différence des sexes. Féminin, masculin et activités sportives (pp. 21-198). Paris: Espace et Temps du Sport. L’Harmattan.

Louveau, C. (2007). Le corps sportif: un capital rentable pour tous? Dans Actuel Marx, 41, 55-70.

Maguire, J. & Sportization. (2007). The Blackwell Encyclopedia of Sociology. Malden: John Wiley & Sons, Ltd. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/epdf/10.1002/9781405165518.wbeoss242 Acesso em: 13 abril 2020.

Messner, M. A. (1988). Sports and male domination: the female athlete as contested ideological terrain. Sociology of Sport Journal, 5, 197-211.

Meyers, D. (2012). Female Gymnasts Used to Compete on the Rings, But the Game Changed. Jezebel, 08 jul. 2012 (Online). Disponível em: https://jezebel.com/5932478/female-gymnasts-used-to-compete-on-the-rings-but-the-game-changed Acesso em: 11 jan. 2019.

Naul, R. (2002). History of sport and physical education in Germany, 1800-1945. In R. Naul & K. Hardman (Ed.), Sport and Physical Education in Germany (pp. 15-26). London: Routledge.

Oliveira, M. & Bortoleto, M. (2011). Apontamentos sobre a evolução histórica, material e morfológica dos aparelhos da ginástica artística masculina. Revista da Educação Física/UEM, Maringá, 22(2), 283-293.

Oudshoorn, N. (1994). Beyond the natural body: an archaelogy of sex hormones. London: Routledge.

Passos, A. M. (2020). Arqueogenealogia das interdições, separações e segregações de sexo/gênero nos esportes: o jogo discursivo sobre as mulheres (Tese de Doutorado). Programa de Pós-Graduação em Sociologia. Faculdade de Ciências Sociais. Universidade Federal de Goiás. Goiânia, Goiás, Brasil.

Papin, B. (2007). Conversion et reconversion des élites sportives. Approche socio-historique de la gymnastique artistique et sportive. Paris: L’Harmattan-Collection Sports en Société.

Pfister, G. (1990). The medical discourse on female physical culture in Germany in the 19th and early 20th centuries. Journal of Sport History, 17(2), 183-198.

Pfister, G. (2011). Frauen in der Turnbewegung – Anfänge, Entwicklungen und Veränderungen. In Deutscher Turner-Bund. 200 Jahre Turnbewegung – 200 Jahre Soziale Verantwortung. Frankfurt am Main: Deutscher Turner-Bund.

Públio, N. S. (1998). Evolução histórica da ginástica olímpica. Guarulhos: Ed. Phorte.

Públio, N. S. (2005). Origem da Ginástica Olímpica. In M. Nunomura & V. L. Nista-Piccolo (org.), Compreendendo a Ginástica Artística (pp. 15-26) . São Paulo: Phorte.

Quitzau, E. A. (2015). Da ‘Ginástica para a juventude’ a ‘A ginástica alemã’: observações acerca dos primeiros manuais alemães de ginástica. Rev. Bras. Ciênc. Esporte, Florianópolis. 2(37), 111-118.

Quitzau, E. A. (2014). “A Ginástica Alemã”: Aspectos da obra de Friedrich Ludwig Jahn. Rev. Bras. Ciênc. Esporte, Florianópolis, 36(2), S501-S514.

Quitzau, E. A. (2012). “O trabalho na forma de alegria juvenil”. A ginástica segundo Johann Christoph Friedrich Guts Muths. Rev. Bras. Ciênc. Esporte, Florianópolis, 34(2), 359-373.

Soares, C. L.. (2007). Educação física: raízes europeias e Brasil (4 ed). Campinas: Autores Associados.

Terret, T. (2010). From Alice Milliat to Marie-Thérèse Eyquem: revisting women’s sport in France (1920-1960). The International Journal of the History of Sport, 27(7), 1154-1172.

Yannoulas, S. (2011). Feminização ou feminilização? Apontamentos em torno de uma categoria. Temporalis, 11(22), 271-292.

Notas

1 Para a bióloga e sexóloga Fausto-Sterling (2012), “colocar em alguém a etiqueta ‘homem’ ou ‘mulher’ é uma decisão social. O saber científico pode nos ajudar a tomar essa decisão, mas somente nossas crenças sobre o gênero – e não a ciência – definem o sexo [...] Nossos corpos são complexos demais para oferecer respostas claras e límpidas sobre a diferença sexual” (p. 19-21; 101). A propósito, Fausto-Sterling questiona a existência de apenas dois sexos/gêneros.
2 Os Jogos Olímpicos de Paris em 2024 têm anunciado que serão os primeiros a ter 100% de paridade numérica na participação de atletas homens e mulheres. Para além disso, as partidas femininas serão transmitidas também nos horários “nobres” da televisão, como forma de alcançar um público maior e incentivar a visibilidade dos esportes com mulheres. Serão várias as modalidades “mixed genders sports”, como: equitação, duplas mistas (badminton, tênis de mesa, tênis, natação artística, veleiros Nacra 17 Foiling, Two Person Dinghy), além de “mixed teams”: judô, natação. Disponíveis em: https://www.olympics.com/pt/noticias/paris-2024-primeiros-jogos-total-igualdade-genero; https://www.en.wikipedia.org/wiki/Mixed-sex_sports#:~:text=Mixed%20doubles%20badminton%20was%20introduced,figure%20skating%20programme%20in%201976; https://www.kanarasport.com/en/olympic-water-sports-paris-2024/ Acessados em: 08 abril 2023.
3 Usamos a expressão “sexo/gênero” em respeito à teoria da qual somos tributárias/os, a performatividade de Judith Butler (2003), para quem tanto o sexo como o gênero são construções sociais discursivas materializadas e naturalizadas através de atos performativos (observação, nomeação, descrição, reforço, legitimação e, reforços contínuos por parte de discursos legitimados e legitimadores para a manutenção da existência, utilidade, naturalidade, essencialidade daquilo que foi nomeado, no nosso caso, o sexo e o gênero).
4 A noção de ordenamento de sexo/gênero que utilizamos pode ser compreendida a partir da mesclagem de duas teorias: 1) da ordem compulsória do sexo/gênero/desejo de Butler (2003) que denuncia a lógica como a sociedade ocidental legitima uma “mulher verdadeira” ou um “homem verdadeiro”, isto é, sujeitos cujos sexos estejam corretamente alinhados a um dos gêneros possíveis e, que, consequentemente, expressem desejos heterossexuais. 2) da divisão sexual do trabalho e relações sociais de sexo (Kergoat, 2009) que problematizam a atribuição de tarefas diferentes ou responsabilidades sociais distintas para homens e mulheres baseadas em crenças sobre as influências das diferenças entre os sexos, explicadas por Thomas Laqueur (2001).
5 “Sexual” age como um complemento adjetivador, próprio dos processos de diferenciação. Isso significa que as diferenciações, categorizações, classificações “sexuais” estão baseadas em discursos científicos e socioculturais de que existem apenas dois sexos biológicos (macho/fêmea), considerados tão distintos/diferentes quanto antagônicos (Laqueur, 2001). Nesse quadro ordenatório os “machos verdadeiros” seriam mais fortes, resistentes, velozes e as “fêmeas verdadeiras” mais graciosas, lentas, frágeis. Convicções que se tornaram o princípio fundamental do fairness, ou seja,a ética esportiva da igualdade de condições que tem justificado as divisões, separações e segregações baseadas no sexo/gênero e, por conseguinte, a criação de regulamentações de elegibilidade para mulheres transexuais e intersexos. Para mais informações sobre as últimas regulamentações de elegibilidade, sugerimos pesquisas no site da World Athletics. Disponível em: https://www.worldathletics.org/download/download?filename=b671d159-4f32-4c0a-af5f-4d5f3bbe9015.pdf&urlslug=C3.6%20-%20Eligibility%20Regulations%20for%20the%20Female%20Classification Acesso em: 10 abril 2023.
6 Apesar de uma série de estudos como os de Evelyn Fox Keller (1995), Anne Fausto-Sterling (2000), Nelly Oudshoorn (1994), e Mary Jacobus, Evelyn Fox Keller e Sally Shuttleworth (1990) questionarem as próprias lógicas da ciência, abrindo portas para repensar as interpretações biológicas sobre os corpos femininos e masculinos, os discursos científicos que se mantêm no âmbito esportivo e são utilizados para a divisão de categorias entre feminina/masculina são aqueles que reproduzem a bicategorização clássica entre masculino e feminino construídas numa longa duração conforme indicado pelos estudos de Laqueur (2001).
7 Em 1921 foi realizada no Principado de Mônaco a primeira competição feminina internacional nos moldes de um evento multiesportivo, porém, esse evento foi organizado por um grupo de homens, dentre os quais, o prefeito da cidade e algumas mulheres como Alice Milliat. Depois, Milliat, através da FSFIFédération Sportive Féminine Internationale, empreendeu outras quatro edições que ficaram conhecidas como os Jogos Mundiais Femininos, Paris 1922, Gotemburgo 1928, Praga 1930 e Londres 1934 (Terret, 2010).
8 Até 2001, o aparelho foi chamado de “cavalo para o salto”, porém, após reformulações profundas na morfologia e na estrutura ele passou a ser chamado de “mesa de salto”.
9 Demonstrações de séries nas argolas balançantes. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Gu8Wr7DF76k Acesso em: 04 março 2021.
10 Até a década de 1950, as competições da ginástica artística contavam com provas de atletismo como, corridas, saltos em distância e altura, levantamento e arremesso de peso, etc., resquícios dos antigos sistemas de ginástica.
11 Diferentemente do que pode parecer, a trave ou barra de equilíbrio não foi um aparelho inventado apenas para o uso das mulheres. O aparelho fazia parte dos aparatos de Guts Muths, depois de Ludwig Jahn, assim como era utilizado nas aulas do método sueco de Pehr Henrick Ling e do método francês de Francisco Amoròs (Langlade & Langlade, 1970). Além disso, o aparelho foi utilizado nos programas dos Jogos Olímpicos de Estocolmo 1912 e Antuérpia 1920, como parte das rotinas apresentadas por homens
12 Existem inúmeros vídeos das apresentações e de entrevistas dadas por Johanna Quaas na plataforma Youtube, como por exemplo, uma entrevista cedida em 10 de março de 2020. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=6ToVaMkmyJ0 e apresentações disponível em:: https://www.youtube.com/watch?v=o625rylh3bY e https://fanbuzz.com/gymnastics/johanna-quaas-gymnast/. Acesso em: 18 jun. 2021.
13 Série nas barras paralelas da estadunidense Doris Fuchs Brause no Campeonato Mundial de Ginástica Artísticas de 1966. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=8gL8zyk3YDA Acesso em: 10 jun. 2020.
14 De 1930 até a metade da década de 1960, o cavalo para o salto era pintado com quatro faixas que delimitavam o local onde as mãos, no momento da repulsão, deveriam se apoiar, caso o/a ginasta tocasse as linhas ou excedesse os limites delimitados por elas, sua nota poderia ser deduzida (Grossfeld, 2014).
15 Disponível em: https://www.mcall.com/news/mc-xpm-1998-08-26-3211111-story.html Acesso em: 10 jun. 2020.
16 Segundo Grossfeld (2014), até 1962 os códigos de pontuação eram guias com diretrizes gerais, o que significava que o julgamento ficava à mercê de avaliações subjetivas dos árbitros e árbitras. Entre 1949 a 1962, as diretrizes incentivavam o julgamento dos seguintes aspectos: execução perfeita, boa, excelente ou superior, inferior à média ou satisfatória, razoável, insuficiente e muito insuficiente. Embora julgassem critérios de execução (posição do corpo e membros, aterrisagem, desequilíbrios, quedas, etc.), foi somente a partir de 1989 que os critérios para a avaliação da execução sistematizados e introduzidos nos códigos de pontuação.
17 Foi a partir de 1962 que os elementos corporais começaram a ser classificados em categorias de dificuldade. Se de início eram apenas três, A, B, C, hoje são oito (A, B,C,D,F,G,H,I) (Grossfeld, 2014; FIG, 2016, 2017).
18 A execução do salto “Produnova” pela ginasta russa Elena Produnova. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=afhQBvags14 Acesso em: 10 jun. 2020.
19 Cada acrobacia tem uma “nota de partida” que é definida e atualizada nos Congressos Técnicos da Modalidade. Essa seria a nota de “dificuldade” da acrobacia, junto a qual é somada a nota de Execução (máximo 10,0 pontos, e sobre a qual são deduzidos os erros técnicos e de execução). A nota final é dada pelo valor da dificuldade, mais a nota de execução e menos alguma penalidade que pode ser aplicada por um quadro de Árbitros Superiores (indisciplina, atraso, vestimenta fora do padrão, contato verbal com o/a técnico/técnica durante a rotina, etc.).
20 Este movimento foi realizado por Simone Biles durante o torneio U.S Classic, realizado nos dias 21 e 22 de maio de 2021. Sobre as repercussões do salto realizado por Biles e pontuação atribuída, ver: The Washington Post, “Simone Biles makes the extraordinary look routine in her first competition since 2019”. Disponível: https://www.washingtonpost.com/sports/olympics/2021/05/22/simone-biles-returns-yurchenko-double-pike/. Acesso em: 22 maio 2021. Sportskeeda, “What is the Yurchenko double pike? And why Simone Biles may not perform it at the 2021 Tokyo Olympics?". Disponível em: https://www.sportskeeda.com/gymnastics/what-yurchenko-double-pike-and-simone-biles-may-perform-2021-tokyo-olympics#:~:text=The%20Yurchenko%20double%20pike%20has%20a%20starting%20difficulty%20rating%20of,which%20led%20to%20a%20deduction. Acesso em: 16 maio 2021.
22 O aparelho atual tem 1,05 m de altura em relação ao colchão, 1,60 m de comprimento e 35cm de largura. As alças têm 12 cm de altura e ficam dispostas entre 40 e 45cm uma da outra (FIG, 2020).
23 Discriminação e preconceito contra pessoas com deficiência.
25 Em 2015, o médico Larry Nassar foi demitido da seleção nacional de ginástica artística dos Estados Unidos após ser acusado de assédio sexual por diversas atletas do país, entre elas, a campeã olímpica e mundial Simone Biles. O caso ganhou grande repercussão na mídia internacional e deu origem a dois documentários: At the heart of gold, dirigido por Erin Lee Carr e lançado em 2019; e Athlete A, dirigido por Bonni Cohen e lançado em 2020.

Recepción: 06 Junio 2022

Aprobación: 31 Marzo 2023

Publicación: 03 Abril 2023

ediciones_fahce
Ediciones de la FaHCE utiliza Marcalyc Sistema de Marcación, herramienta desarrollada con tecnología XML-JATS4R por Redalyc
Proyecto académico sin fines de lucro desarrollado bajo la iniciativa Open Access