Educación Física y Ciencia, vol. 24, nº 1, e212, enero-marzo 2022. ISSN 2314-2561
Universidad Nacional de La Plata
Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación
Departamento de Educación Física

Artículos

O ensino de lutas/artes marciais em configuração remota: notas de uma trajetóriadidático-metodológica na formação docente em Educação Física

Gustavo Almeida Soares

Docente na Educação Básica em Minas Gerais, Brasil
Fábio Pinto Gonçalves dos Reis

Universidade Federal de Lavras (UFLA), Brasil
Kleber Tüxen Carneiro

Universidade Federal de Lavras (UFLA), Brasil
Cita sugerida: Soares, G. A., Reis, F. P. G. y Carneiro, K. T. (2022). O ensino de lutas/artes marciais em configuração remota: notas de uma trajetóriadidático-metodológica na formação docente em Educação Física. Educación Física y Ciencia, 24(1), e212. https://doi.org/10.24215/23142561e212

Resumo: O artigo retrata uma investigação cujo objetivo consistiu em perscrutar as implicações do trabalho pedagógico desenvolvido num componente curricular intitulado: ‘Pedagogia das Lutas’, no segundo semestre de 2020, elaborado em conformação remota, em uma instituição de ensino superior federal, no estado de Minas Gerais/BR. Tratou-se de uma pesquisa de natureza qualitativa. O grupo amostral contou com vinte e oito aprendizes, sendo quatorze homens e o mesmo número de mulheres. Em termos de procedimentos analíticos foram escrutinados os materiais empíricos produzidos por ocasião das aulas. Para examiná-los empregou-se a análise de conteúdo, enquanto técnica. Os resultados expuseram êxito em relação aos aportes teóricos selecionados à disciplina, com realce para os conteúdos correlatos e àqueles que forneceram subsídio epistemológico para o desenvolvimento do ensino de Lutas nas diferentes etapas da educação básica. Outro destaque referiu-se ao modo de condução dos encontros, em especial, quando houve atividades “práticas”. Em termos de limites a ênfase recaiu na “falta de contato corporal”, configurando-se como o grande desafio para o ensino de Lutas/Artes Marciais na escola, em razão da conformação remota.

Palavras-chave: Lutas, Artes Marciais, Educação Física, Formação Inicial, Ensino Remoto.

The teaching of fights/martial arts in a remote setting: notes on a didactic-methodological trajectory in teacher formation in Physical Education

Abstract: The article portrays an investigation whose objective was to analyze the implications of the pedagogical work developed in a curricular component entitled: 'Pedagogy of Struggles', in the second half of 2020, prepared in remote conformation, in a federal higher education institution, in the state of Minas Gerais/BR. It was a qualitative investigation. The sample group had twenty-eight apprentices, being fourteen men and the same number of women. In terms of analytical procedures, the empirical materials produced during the classes were scrutinized. To examine them, content analysis was used as a technique. The results showed success in relation to the theoretical contributions selected to the discipline, with emphasis on contents with social relevance and those that provided epistemological basis for the development of the teaching of Fighting, in the different stages of basic education. Another highlight referred to the way the meetings were conducted, especially when there were “practical” activities. In terms of limits, the emphasis fell on the “lack of body contact”, constituting the great challenge for the teaching of Fighting/Martial Arts at school, due to its remote configuration.

Keywords: Fights, Martial Arts, Physical Education, Initial Formation, Remote Teaching.

La enseñanza de las luchas/artes marciales en un entorno remoto: impresiones sobre una trayectoria didáctico-metodológica en la formación del profesorado en Educación Física

Resumen: El artículo retrata una investigación cuyo objetivo fue indagar las implicaciones del trabajo pedagógico desarrollado en un componente curricular titulado: 'Pedagogía de las Luchas', en el segundo semestre de 2020, elaborado en conformación a distancia, en una institución de educación superior federal, en el Estado de Minas Gerais General/BR. Fue una investigación cualitativa. El grupo de muestra tenía veintiocho aprendices, siendo catorce hombres y el mismo número de mujeres. En términos de procedimientos analíticos, se escudriñó el material empírico producido durante las clases. Para examinarlos se utilizó como técnica el análisis de contenido. Los resultados arrojaron éxito en relación con los aportes teóricos seleccionados a la disciplina, con énfasis en contenidos con relevancia social y aquellos que brindaron base epistemológica para el desarrollo de la enseñanza de la Lucha, en las diferentes etapas de la educación básica. Otro punto a destacar se refirió a la forma en que se llevaron a cabo las reuniones, especialmente cuando hubo actividades “practicas”. En cuanto a los límites, el énfasis recayó en la “falta de contacto corporal”, constituyendo el gran desafío para la enseñanza de la Lucha/Artes Marciales en la escuela, debido a su configuración remota.

Palabras clave: Luchas, Artes Marciales, Educación Física, Formación Inicial, Enseñanza a Distancia.


1. Considerações iniciais: o contexto do ensino remoto

Em decorrência da crise pandêmica deflagrada pelo vírus SARS-Cov-2 em março de 2020 – de acordo com a World Health Organisation (2020) constituía-se numa Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII) –, escolas e universidades interromperam o ensino presencial, com base na Medida Provisória N° 934 (01/04/2020) a qual institui a contemporização dos dias letivos presenciais nas instituições educacionais de todo o país. Como efeito implementa-se a modalidade de Ensino Remoto Emergencial (ERE) no domínio de uma universidade federal situada no estado de Minas Gerais, consoante às medidas preventivas exigidas pelo contexto. Em razão disso, tal instituição propôs um modelo de Roteiro de Estudos Orientados (REO), de modo a subsidiar o trabalho pedagógico docente referente às disciplinas de graduação e pós-graduação.

À face dessa conjuntura insólita para o desenvolvimento da formação inicial, mais especificamente no interior do curso de Licenciatura em Educação Física, engendrou-se esta investigação cujo objetivo consistiu em cotejar e perscrutar a pedagogia universitária empregada pelo regente do componente curricular intitulado ‘Pedagogia das Lutas’, cuja carga horária perfaz 34 horas semestrais. De igual modo mapear as implicações do trabalho pedagógico realizado ao longo do segundo semestre de 2020, sob uma atmosfera virtual.

Trata-se de um interesse epistêmico desinente da complexidade e desafio presentes na elaboração de um trabalho pedagógico – desenvolvido ao longo de dezessete semanas – no qual os saberes relativos às lutas/artes marciais foram ensinados sem a “presença da experiência corporificada”, ou seja, à dimensão procedimental (saber fazer) do conteúdo, uma face relevante para a apropriação do conhecimento (Coll, Pozo, Sarabia e Walls, 1998; Zabala, 1998). Em outras palavras, o que nos mobilizou cientificamente residiu na possibilidade de avaliar essa experiência formativa num curso (presencial) de formação docente (licenciatura) em Educação Física, em uma universidade federal situada no estado de Minas Gerais, escrutinando a disciplina ‘Pedagogia das Lutas’ cuja oferta ocorrera sob conformação remota.

Corresponde a um cenário inusitado, ao menos em relação à Instituição de Ensino Superior (IES) em análise, portanto, deve-se levar em consideração à conformação remota. Soma-se a isso o fato do docente erigir o trabalho pedagógico evocando as representações discentes para organizar a construção de procedimentos metodológicos e fomentar tematizações, com vistas a atuar no novo cenário sobre o qual o componente curricular – e a vida humana em linhas gerais – experienciaram abruptas modificações.

Basicamente, a organização da disciplina entremeou (semanalmente) momentos de estudos, videoaulas e desenvolvimento de atividades. Além disso, houve encontros síncronos, no horário cujas aulas estavam previstas na matriz curricular – todos eles foram gravados e disponibilizados aos acadêmicos/as, por intermédio da plataforma (Campus) virtual da instituição –. Oportuno citar a criação de espaços de interação entre professores e alunos, quais sejam: os fóruns de discussão e os painéis de registro, facultando que os ausentes nos encontros síncronos tivessem acesso ao conteúdo, pari passu preconizassem suas impressões e dúvidas.

Ademais, os materiais elaborados pelos aprendizes compuseram parte das atividades avaliativas quinzenais, confeccionadas por exigência do componente curricular supracitado. Foram desenvolvidos: estudos dirigidos, textos dissertativos, resenhas, planos de aula, indagações para subsidiar os debates (leia-se encontros virtuais), dentre outros recursos, sendo essas formulações – materiais empíricos – objetos de análise para a consecução do estudo em tela.

Nessa esteira de descrição do contexto do estudo, destacam-se, além disso, o planejamento de ensino elaborado pelo docente regente do componente curricular – disponível para consulta pública no sistema integrado da IES – e sua formação acadêmica dedicada ao campo didático –, afora os anos de magistério e atuação na educação básica – constatação examinada por ocasião da pesquisa. Conjuntura a qual suscitou o interesse em escrutar sua pedagogia universitária, conquanto perscrutar-se-á apenas as implicações do trabalho pedagógico desenvolvido num dos componentes curriculares (lê-se: ‘Pedagogia das Lutas’) por ele ministrado, cujos efeitos, em alguma medida, traduziram os atributos formativos descritos.

Acrescenta-se a esse quadro investigativo o próprio curso de formação docente em Educação Física, em virtude de suas idiossincrasias de ordem epistemológica, haja vista corresponder a uma subárea do conhecimento “colonizada” por outras áreas científicas (Rezer, Nascimento e Fensterseifer, 2011; Bracht, 2000; Loviloso, 1998; Carneiro, Assis e Bronzatto, 2016; Carneiro 2012). Além das questões de natureza didática, deve-se levar em conta a forte presença de uma formação tecnificada, fragmentada, esportivizada (Darido, 1999; 2012). Ademais se tem a questão da obliteração das práticas – ou experiências – corporais, devido à condição virtual do ensino, circunstância já aludida, convindo reiterar. Um cenário absolutamente implexo e adverso para se pensar e desenvolver o ensino das Lutas/Artes Marciais.

Não bastasse o panorama descrito, há ainda, o fato dos saberes relativos às Lutas/Artes Marciais serem prescindidos ou negligenciados, sob a égide das seguintes alegações: estrutura precária e ausência de materiais; formação acadêmica deficitária; falta de interesse de aprendizes e docentes; em grande medida em decorrência da preferência por jogos coletivos, em especial aqueles com bola; ademais temos a associação peremptória com a violência, portanto sendo uma prática corporal inadequada ao ambiente escolar, dentre outras justificativas cotejadas no estudo Lise, Cavichiolli e GIl (2022), no qual apresenta uma correlação entre o Brasil e a Espanha no que se refere à efetividade do conteúdo Lutas nas aulas de Educação Física.

Adiciona-se outro elemento a esse cenário intrigante, a escassez de produções acadêmicas que tematizem o conteúdo das Lutas no ambiente escolar, pois de acordo com Correia e Franchini (2010) apenas 2,93% das produções publicadas em revistas acadêmicas de circulação nacional (leia-se brasileira) versam sobre a temática: Lutas/Artes Marciais, desse percentual somente 10,7% tratam de aspectos voltados para a Pedagogia do Movimento Humano, dificultando, por sua vez, o aprofundamento teórico/metodológico dos docentes em exercício professoral. O quadro (intricado) exposto ensejou a presente investigação. Na continuidade serão expostos os aspectos metodológicos empregados na investigação.

Metodologia

Delineamos o percurso metodológico do trabalho investigativo de acordo com os pressupostos de uma abordagem qualitativa por traduzir-se na melhor maneira de analisar os dados cotejados pela investigação, assim como estabelecer relações e inferências sobre eles, uma vez que tal modalidade nos confere a possibilidade de observar/compreender os valores, crenças, hábitos, atitudes, representações, opiniões sobre fatos, processos particulares e específicos dos indivíduos e grupos em que estão inseridos (Sampieri, Collado e Lucio, 2013).

Pode-se, então, afiançar que ao eleger a abordagem qualitativa o pesquisador/a volta-se para a busca do significado das coisas, porque este tem um papel organizador nos seres humanos. Aquilo que as “coisas” – fenômenos, manifestações, ocorrências, fatos, eventos, vivências, ideias, sentimentos, assuntos – representam oferece "molde" à vida das pessoas (Lüdke e André, 1986). Num outro nível, os significados que os fenômenos (leia-se “coisas”) recebem passam também a ser partilhados culturalmente e, assim, organizam o grupo social em torno dessas representações e simbolismos (Chizzotti, 2003).

Em termos de procedimentos analíticos para escrutinar os dados coletados empregou-se a análise de conteúdo, consoante aos pressupostos formulados por Bardin (1994), consistindo, para o contexto do estudo em questão, na descrição detalhada e sistematizada dos relatos dos acadêmicos/as, somado aos registros escritos provenientes dos REOs, em conjunto com as gravações das aulas. De acordo com a autora supracitada, esta técnica de análise organiza-se em três etapas, a saber: a primeira refere-se a “pré-análise”, momento no qual se realiza a primeira leitura do material empírico de modo a ordená-lo e estabelecer conjecturas, visando o aprofundamento do objeto de estudo.

A segunda diz respeito à “fase de exploração”, equivalendo à ocasião da formulação de categorias (analíticas) específicas, com base na recorrência temática ou por análise e agrupamento de conteúdo (Bardin, 1994). Para fins desta pesquisa identificamos a reincidência do teor temático tanto nos relatos dos/as acadêmicos/as quanto nas atividades resultantes da proposta do componente curricular: ‘Pedagogia das Lutas’. Somou-se a essa técnica os critérios de caracterização de categorias baseado na exclusividade, homogeneidade e confiabilidade propostos por Carlomagno e Rocha (2016).

E à última etapa concernente ao “tratamento dos resultados”, de acordo com Bardin (1994) utilizou-se o referencial teórico de modo a granjear subsídio (epistemológico) para decodificar e perscrutar os materiais empíricos produzidos ao longo do trabalho pedagógico desenvolvido pelo componente curricular supramencionado. Estabelecendo, por sua vez, inferências sobre “os achados” da pesquisa.

Em termos éticos, para o desenvolvimento do estudo houve anuência dos/as pesquisados/as, na medida em que aceitaram colaborar com a pesquisa, referendando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). A pesquisa foi aprovada junto ao comitê de ética da instituição investigada, cujo registro consta no parecer número 4614.882.

O grupo amostral contou com vinte e oito (28) aprendizes matriculados na disciplina ‘Pedagogia das Lutas’, sendo quatorze (14) homens e o mesmo número de mulheres (lê-se 14). Com o intuito de preservar a identidade de cada um deles, ao invés de empregarmos uma simbologia gráfica ou numérica – desumanizando os participantes da pesquisa –, inseriu-se nomes fictícios relacionados ao universo das Lutas/Artes Marciais, evocando as representações relativas ao mote.

Compete-nos informar ainda, o intento de articular pesquisa e formação, uma premissa segundo a qual se fomente um processo de superação de formas convencionais de trabalho científico aplicado, dado que, historicamente, tem-se observado investigações em Educação – e áreas correlatas – nas quais os investigados (professores/as) reduzem-se a amostras (estatísticas) e, portanto, a objetos de estudo (Demo, 2004). Trata-se de uma perspectiva pela qual se alvitra transcender essa concepção instrumentalizada, cujos “pesquisadores da área educacional têm sido desafiados a propor formas de investigação que possam estabelecer uma relação mais orgânica entre suas atividades de pesquisa e ensino” (Demo, 2004, p. 17).

Nessa direção, ao contrário do pesquisador inserir-se no ambiente educativo apenas para observar ou tecer críticas e adequações, objetiva-se debater “junto ao professor a realidade de seu trabalho, as dificuldades encontradas e oferecer subsídios teórico-metodológicos para a implementação de novas práticas possíveis” (Bortoni-Ricardo, 2011, p. 26). Correspondendo, portanto, a uma noção “de pesquisa em que todo o processo é conduzido em coparticipação entre professor e pesquisador, visando sempre à reestruturação e reconstrução do trabalho com a linguagem em situação de ensino” (Bortoni-Ricardo, 2011, p. 22).

Experiências formativas no contexto do ERE: o caso do ensino de Lutas/Artes Marciais

Antes de descrever o processo formativo propriamente dito, faz-se indispensável elucidar a razão pela qual se optou pelo emprego do binômio: Lutas/Artes Marciais. Parte-se da premissa de que tanto na concepção de Lutas quanto no entendimento de Artes Marciais há certa complementaridade, seja no plano da evolução histórica, ou mesmo na conformação das práticas corporais, afora o aprimoramento de seus artefatos, em que pesem os riscos – tradições, histórias e elementos contextuais – ao aproximá-las. Ainda assim, independentemente da ousadia epistemológica e de suas implicações, coaduná-las nos parece indicar um caminho auspicioso na tentativa de ampliar a presença desses saberes no espaço escolar, uma noção alinhada à proposta de Pereira, Reis e Carneiro (2020) e Pereira, Reis, Carneiro e Scaglia (2021).

Ao abrigo dessa premissa conceitual estruturaram-se os “caminhos epistêmicos” tracejados à disciplina ‘Pedagogia das Lutas’. O docente responsável organizou o componente curricular sob quatro eixos (de conhecimento), a saber: 1) levantamento das representações discentes a respeito dos conceitos de Lutas, Artes Marciais e Modalidades Esportivas de Combate; 2) discussões teórico-metodológicas para o ensino de Lutas/Artes Marciais à luz da pedagogia do esporte; 3) tematizações possíveis quanto aos conteúdos de Lutas/Artes Marciais – observando os marcadores sociais de gênero, classe social, raça, etnia, geração, religiosidade, dentre outras que pudessem insurgir –; 4) outros temas possíveis (violência e competição).

Inicialmente houve um investimento formativo na direção de pôr em desconfiança às representações referentes ao universo das Lutas/Artes Marciais na tentativa de compreender como as vivências, às dimensões sociais e as leituras de mundo incidiriam na percepção com a qual um indivíduo apresenta ao apreciar determinado material, acessar artefatos culturais (vídeo, música, poesia, dentre tanto outros), ou mesmo relatar uma experiência. De igual modo pelas relações de poder cujos sujeitos estão submetidos, representadas pela “composição e intenção do autor que cria a obra para determinado público. Sendo assim, as representações que cada pessoa carrega consigo são constituídas de acordo com suas histórias de vida e permitem outras interpretações de mundo” (Chartier, 1991, p. 87).

Acessar às narrativas produzidas tornou-se relevante na medida em que deslindaram representações sobre o entendimento de Lutas, Artes Marciais e Modalidades Esportivas de Combate, haja vista consistir no ponto de partida – avaliação diagnóstica – da organização pedagógica empreendida (Rabelo, 1998). Ao trazer a lume todas as impressões prévias construídas (historicamente) sobre o mote, a proposição inicial alvitrava pô-las em suspeição, com efeito, desestabilizá-las, tendo em mente o fato de não serem fixas, porquanto, apesar de funcionarem como convenções sociais, não são inabaláveis (Resende, 2018).

À vista disso, o resultado do primeiro REO originou vinte e três relatos produzidos pelos aprendizes no interstício do primeiro para o segundo encontro (virtual) da disciplina. Na qualidade de objeto disparador o docente regente formulou a seguinte perquirição: “O que são lutas, artes marciais e modalidades esportivas de combate?” Objetivava-se, com isso, mapear – a “bagagem” histórica/cultural adquirida ao longo da trajetória formativa e das experiências de vida – o conhecimento a respeito do tema.

Ao analisar o teor dos relatos notou-se uma variedade de respostas consoante a subjetividade de cada um, resultante, inclusive, do processo formativo do próprio curso de licenciatura ao qual estão vinculados. Oportuno anotar o fato do campo semântico relativo ao termo “Luta” suceder diferentes conotações, isso equivale a dizer que a palavra “luta” possui uma natureza polissêmica, recebendo diferentes acepções, a depender do contexto ou da apropriação de seus objetivos (Rufino, 2012).

Ao interpretarmos o modo com o qual o termo “Lutas” figurou nos primeiros relatos, constatou-se determinadas correspondências temáticas, observemos as mais frequentes: técnicas/golpes, disputa, prêmio, machucar, treino, brincar, defender, brigar, adversário, disciplina, ataque/defesa, inimigo, regras e cultura. Diante dessas associações relativas ao conceito, notou-se o registro de quatro explanações distinguirem o termo “brigar” de “lutas”, pois, essa conjugação conceitual alija a presença de seus saberes no espaço escolar, conforme demonstram alguns relatos a seguir:

[...] dificuldade de serem introduzidas na escola por muitas vezes serem confundidas com uma “briga”, o que é justamente o contrário (Rickson Gracie).

[...] separarmos o conceito de luta como sendo sinônimo de “BRIGA” VIOLÊNCIA”/“SELVAGERIA” entre outros sentidos errôneos (Gabi Silva)

[...] deixar claro para os alunos que luta não é briga (Cris Cyborg)

A luta ensina exatamente maneiras de como agir e quando agir caso esteja sendo atacado por alguém, como em brigas (Kyra Gracie).

Como se pode depreender, parte dos/as aspirantes à docência avalizaram existir diferenças entre as Lutas e as brigas, entendimento análogo ao de Gomes (2008), ao elucidar o fato das manifestações codificadas de combate obrarem de modo diametralmente oposto das expressões de violências, basta ponderar sobre a presença de regras e espaço definido de confronto. A autora complementa sua explanação anotando que ao contrário das brigas, as Lutas têm como característica o contato proposital entre duas ou mais pessoas, com ações ofensivas e defensivas alvitrando acertar ou imobilizar o oponente/alvo. De acordo com ela (lê-se, Gomes (2008)), são acontecimentos com regras previamente reconhecidas e respeitadas, à semelhança de ações corporais imprevisíveis com o intuito de sobrepujar o oponente. Ademais, tem-se um alvo personificado, o oponente, podendo ocorrer em nível representativo – a título de exemplo lembremo-nos dos treinamentos/demonstrações de técnicas de lutas cuja ação não necessariamente requeira um oponente “concreto” –. A ausência de qualquer uma dessas características tolher-se-ia o fenômeno, com efeito, facultariam outros tipos de práticas, mas não manifestações codificadas de combate (Gomes, 2008).

Em relação ao termo “Artes Marciais”, observamos a ocorrência de outras palavras que foram elencadas direta ou indiretamente à referida prática corporal, sendo elas: disciplina, batalhas, guerras, história, técnicas, implementos, defesa pessoal, cultura e atividades físicas. Segundo Correia e Franchini (2010) e Rufino (2018), Arte Marcial diz respeito às práticas corporais utilizadas em combates ou guerras, contudo, ao longo do tempo outras noções foram atreladas ao conceito, a exemplo das ideias de beleza e estética dos movimentos, de igual modo às condutas e fundamentações filosóficas com forte influência do “mundo oriental”.

No entanto, ao perscrutarmos a ocorrência de termos associados ao conceito de “Arte Marcial”, verificou-se uma aproximação com o conceito de ‘técnica’, amplamente difundida no campo da Educação Física, em especial, no Esporte. Logo, a questão das “técnicas” foi um dos conteúdos mais recorrentes na descrição dos relatos, correlacionando-as com as Artes Marciais, entendimento igualmente constatado por (Correia e Franchini, 2010) e (Rufino, 2018). Os excertos textuais ulteriores evidenciam essa agregação:

Quando é mencionada a palavra artes marciais, logo me vem na cabeça que são às técnicas de lutas desenvolvidas para utilizar em batalhas [...] (Anderson Silva).

As artes marciais surgiram como uma luta corporal própria para guerras, técnicas de lutas desenvolvidas para utilizar em batalhas [...] (Kyra Gracie).

As artes marciais dizem respeito a um conjunto de técnicas de cada lutador [...] (Amanda Ribas).

[...] artes marciais referem-se a um conjunto de técnicas de luta individual (Amanda Nunes).

Admitir essa associação entre técnica e o universo das Artes Marciais, embora não incorra num equívoco – desde que haja uma noção mais elaborada a respeito do conceito, a exemplo da acepção de técnicas corporais formulada por Marcel Mauss (1974), segundo a qual o antropólogo francês considerou os gestos e os movimentos corporais como técnicas próprias da cultura, passíveis de transmissão através das gerações e imbuídas de significados específicos –, todavia poderá ser deformada, na medida em que no interior da escola seja apregoada de forma tecnificada – sob acepção estritamente biomecânica –, apolítica e descontextualizada, visto que a Educação Física escolar – assim como os outros componentes curriculares da educação básica – dever-se-ia fomentar aos aprendizes à emancipação, por intermédio da apropriação do conhecimento historicamente situado (Bracht, 2005; Charlot, 2008).

Não se trata de negligenciar o ensino da técnica enquanto conhecimento social e dimensão procedimental do saber, conquanto rechaçar a ideia de reprodução técnica e mecânica dos movimentos, haja vista essa perspectiva incidir numa concepção acrítica de educação, afora olvidar a reflexão sobre ‘o que’ está se fazendo, além do ‘por quê’ dos fazeres, sendo, portanto, indispensável uma organização pedagógica pela qual se produza sentido e significado para os saberes escolares, notadamente no que concerne às Lutas/Artes Marciais (Alencar, Silva, Lavoura, e Drigo, 2015; Pereira, et al., 2020; Pereira et al., 2021).

Seguindo a esteira de análise, após o mapeamento e as interpretações produzidas em relação às representações, o segundo REO foi dedicado a granjear os contributos da pedagogia do esporte para os processos de ensino das Lutas/Artes Marciais. Para tanto, propôs-se indagar os/as acadêmicos a essa respeito, com base na seguinte perquirição: “quais as contribuições da pedagogia do esporte nos processos de ensino das Lutas/Artes Marciais”? Apenas dezenove acadêmicos/as entregaram o trabalho escrito, dos quais quatorze notabilizaram à necessidade de ‘ressignificações/transformações’ dos conteúdos relativos às Lutas/Artes Marciais na escola, enquanto cinco assinalaram na direção do ‘ensino das técnicas’.

No interior do agrupamento ‘ressignificações/transformações’ explicitam à indispensável necessidade de transformação didático/metodológica para se ensinar os saberes referentes às Lutas/Artes Marciais. Chamou-nos à atenção o indicativo de transformação didática por intermédio de jogos/brincadeiras, uma compreensão admitida por (Pereira et al., 2020; Pereira et al., 2021), ao serem arautos da pedagogia do jogo. No que se refere à categoria de ‘ensino de técnicas’, os/as aprendizes fizeram alusão às Lutas centralizando os argumentos na questão de aprendizagens das técnicas específicas, voltadas ao treinamento e autodefesa.

Em face do exposto, pode-se perceber que as práticas corporais de Luta/Artes Marciais devem ser transformadas de modo a acolher a função social da escola, com isso se tornar uma possibilidade educativa. Algumas das discentes pesquisadas argumentaram de maneira pontual quanto aos caminhos e atividades pelas quais poder-se-iam desenvolver as Luta/Artes Marciais no contexto escolar, conforme se constata doravante:

Acredito que o ensino de lutas na escola deve ser feito, como por exemplo, através de brincadeiras de cabo-de-guerra, braço de ferro e outras. A contextualização deve ser feita de maneira lúdica, levando o aluno a compreender a diferença entre as modalidades e entre modalidades esportivas de combate e brigas, e apresentar as lutas no contexto onde os alunos estão inseridos (Cris Cyborg).

Para ensinar tais práticas corporais, por exemplo, dentro de um ambiente escolar, o professor pode trabalhar com brincadeiras e jogos que tenham características próprias ou comuns as das lutas, artes marciais ou esportes de combate (Jessica Andrade).

Consoante ao entendimento dos relatos, o emprego de jogos/brincadeiras desponta como uma possibilidade pedagógica auspiciosa pela qual o/a aluno/a se apropriaria das Lutas/Artes Marciais no espaço escolar. De acordo com (Pereira et al., 2021), trata-se de um caminho metodológico deveras possível, contudo recomendam o trabalho educativo assentado sob uma perspectiva “rizomática”. Essa ótica anotada pelos autores supracitados pretende fomentar o ensino de Lutas/Artes Marciais valendo-se de um conjunto de (re)conexões, entremeando artefatos culturais diversificados, por efeito duma miríade de possibilidades, tais como: lutas e teatro; lutas e desenhos; lutas e brincadeiras; lutas e músicas; lutas e cosplay; lutas e filmes, dentre tantos outros liames. Ao mesmo tempo facultam identificar relações existentes entre as diferentes modalidades de Lutas/Artes Marciais no que concerne aos princípios filosóficos, técnicas semelhantes e indumentárias.

Vencidas as duas primeiras propostas da disciplina, adentrou-se no momento de tematizar às manifestações corporais de Luta/Artes Marcial. Nessa direção, propôs-se uma atividade na qual os/as professores/as em formação inicial dever-se-iam elaborar um texto dissertativo a respeito do assunto, de modo que as ideias e reflexões contidas na produção textual pudessem nutrir o debate do encontro (virtual) subsequente.

No que tange aos resultados, em dezesseis produções o conteúdo basilar escrutava ou problematizava as Lutas/Artes Marciais, colocando em perspectiva a conjugação entre violências/brigas – uma verificação relevante, em virtude de corresponder ao primeiro eixo de conhecimento desenvolvido no interior do componente curricular, no qual se averiguou às representações discentes a respeito dos conceitos de Lutas, Artes Marciais e Modalidades Esportivas de Combate, um fato cujo indicativo permite à ilação de êxito, de algum modo, na proposta formativa –, outras quatro abordaram questões de gênero e duas se destinaram a discorrer sobre discriminação e ascensão social.

Dentre os argumentos mais críticos e frequentes nos escritos, tem-se a vinculação das práticas de Lutas/Artes Marciais à construção do comportamento agressivo, ou mesmo um estereótipo de ações violentas e repletas de preconceitos. A literatura especializada já acoimou o equívoco dessa correlação induzida – na maioria das vezes proveniente do senso comum ou de empirias deformadas –, no que concerne às Lutas/Artes Marciais, brigas e as distintas manifestações de violências e o quanto ela deprecia e promove interditos para se vivenciar e ensinar essas práticas corporais (Rufino e Darido, 2013). Não sem razão advertiram Nascimento e Almeida (2007, p 12), “o fator violência, que julgam ser intrínseco às Lutas/Artes Marciais, incompatibiliza a possibilidade de abordagem deste conteúdo na escola”.

Segundo os referidos autores, trata-se de um dos principais entraves na vivência do conteúdo pelos jovens, entretanto, argumentam que a violência ou comportamentos violentos não se restringem ao universo das Lutas/Artes Marciais. Sublinham até mesmo o fato da existência frequente de violências e agressões em outras práticas corporais, a título de exemplo, citam o futebol e outras modalidades, em relação à questão das torcidas (Nascimento e Almeida, 2007). A rigor, se porventura analisássemos os atos violentos que acontecem em campeonatos da modalidade aludida, provavelmente poder-se-ia encontrar mais manifestações de violência (simbólica e efetiva) nos estádios e nas torcidas organizadas, se comparado aos torneios e competições que envolvem as Lutas/Artes Marciais (Ferreira, 2006; Pereira, et al., 2020; Pereira et al., 2021).

Na realidade, as violências se inscrevem em raízes mais amplas e complexas, expressas nas relações sociais enquanto modos e procedimentos de comunicação que insurgem em situações de conflito, ameaças, incerteza, medo, tensão, entre outras. Conjectura-se, nesse sentido, que o desenvolvimento das Lutas/Artes Marciais na escola ao ser realizado de forma sistematizada, ou seja, transformado didaticamente, fomente aos aprendizes uma condição de (re)aprender a gerir e a controlar as pulsões ante a complexidade das relações “violentas”, as quais, eventualmente, possam estar expostos. Portanto, pode-se avalizar não haver uma relação peremptória entre essas práticas corporais e a violência. No limite, admite-se sobrevir – em decorrência de um histórico de exposição às violências – eventuais extravaso de pulsões reprimidas em ambiente de disputas corporais, acontecimento, até mesmo, azado para se interferir pedagogicamente e, quem sabe, promover à reelaboração de reações emocionais, experiências e afetos (Ferreira, 2006; Lise et al., 2022; Pereira et al., 2020; Pereira et al., 2021).

Em outra perspectiva de análise presente nos excertos produzidos, fez-se uma problematização relativa à discriminação social incluída em determinadas modalidades esportivas, compreendendo as Lutas/Artes Marciais, em razão de existirem práticas mais elitizadas em oposição a outras. A esse respeito Betti (1998) destacou o fato da comercialização e a midiatização esportiva coadjuvarem à discriminação no esporte, basta notar a ocorrência de algumas modalidades granjearem notoriedade em razão do apelo comercial e incentivo de patrocinadores, com efeito, adquirem mais evidência em relação às outras, seja em decorrência de como são praticadas, seja em virtude do potencial de venda – tornando-se commodities –. Na continuidade há uma passagem textual cujo teor explicita essa questão:

Na minha cidade as lutas são divididas em duas partes, as que são ensinadas gratuitamente, ou seja, voltado para os menos afortunados (capoeira, muay thai), e as lutas que são ensinadas em academias privadas como (Karatê, Judô, jiu-jitsu) sendo que essas últimas não oferecem nenhuma oportunidade para quem não tem condição financeira. Creio que em toda cidade é necessário haver locais disponíveis para toda população gratuitamente nos quais se ensine lutas e outras modalidades, mas o que vejo hoje é uma grande segregação onde o esporte é separado entre modalidade para ricos e modalidades para pobres. (Flavio Canto)

Identificamos, além disso, outros quatro trabalhos correlacionando às Lutas/Artes Marciais às desigualdades de gênero. A esse respeito Louro (2000) elucida que as relações sociais de gênero são urdidas sob uma tessitura histórica/cultural, portanto, alicerçadas sobre e nas diferenças sexuais. Nessa conformidade as desigualdades devem ser examinadas “nos arranjos sociais, na história, nas condições de acesso aos recursos da sociedade” e não a partir das diferenças biológicas (Louro, 1997, p. 21).

Ao anotarem a interface das desigualdades de gênero e as Lutas/Artes Marciais chamam à atenção para o escamoteamento de espaços às mulheres nesse universo específico. Dentre os argumentos dissertados houve destaque ao papel social demarcado – como “dona de casa”, por exemplo –, portanto, imutável, ou mesmo em relação à questão de algumas modalidades esportivas nas quais há “reservas masculinas”, isto é, naturalizadas como exclusivamente de e para homens, como se gênero figurasse como uma categoria fixa, quando, na realidade, ele tem a natureza dinâmica, construída e é suscetível de metamorfoses (Louro, 1994).

Fizeram alusão ao caso do Ultimate Fighting Championship (UFC) cuja competição contempla Artes Marciais Mistas, promovendo embates entre atletas desde meados dos anos de 1990. Corresponde a um dos principais eventos esportivos na atualidade sobre Lutas, contudo apenas promoveu o primeiro combate entre mulheres na sua 157° edição (Awi, 2012). Não gratuitamente, ainda hoje, o maior número de combates por edição destina-se ao gênero masculino. Outro exemplo citado nos relatos diz respeito ao campeonato brasileiro de Jiu-Jitsu, visto que existem documentos relatando a primeira participação feminina (faixa preta), apenas em 1998. Nessa mesma edição da competição estavam inscritos 36 atletas do sexo masculino, de acordo com a Confederação Brasileiro de Jiu-Jitsu (Confederação Brasileira de Jiu-Jitsu, 2021). A propósito, mulheres que decidem sobrepujar demarcações de gênero no esporte e transcender estereótipos frequentemente passam a ser associadas ao sexo masculino, colocando em suspeição sua orientação sexual (Altmann, 1998; Goellner, 2005).

Muito bem, após esgotar-se o debate relativo às Lutas/Artes Marciais e os conteúdos mais versados nos excertos textuais, encetou-se um diálogo – promovido inicialmente pelo professor regente do componente curricular, na ocasião de um dos encontros virtuais – a respeito do tema competitividade, haja vista o fato dele eclodir tacitamente no decurso da disciplina, seja em narrativas cuja noção preconizava dubiedades, seja nas passagens textuais pelas quais o mote insurgiu de modo subjacente.

Ciente disso comentou que o tema da competitividade não se restringe ao universo da Educação Física e tampouco aos limites do alcance dos “tentáculos” esportivos. Ao que tudo indica, a competição é parte constituinte do viver e, a rigor, está presente no cotidiano da contemporaneidade de forma mais evidente do que em qualquer outro período da história da humanidade (Carneiro, Camargo, Bronzatto e Assis, 2017). Na continuidade conclamou os/as acadêmicos/as a refletir – de maneira mais elaborada – com relação aos modelos de competição baseados no maniqueísmo: “derrota/vitória”, compreensão cuja perspectiva incorre num reducionismo tanto do entendimento quanto do fenômeno propriamente dito.

Para tanto, propôs uma breve contextualização dos formatos existentes e de como são tratados pelos canais midiáticos. A esse respeito Galatti, Breda, Scaglia e Paes (2007) advertem quanto à supervalorização da vitória, desconsiderando outros aspectos formativos da competição na infância. Ademais, os autores em questão ajuízam sobre as diferentes formas de manifestação da mesma, sendo admissível adjudicar um caráter formativo a ela, desde que haja um olhar didático/pedagógico ao tratá-la em sua complexidade e abrangência. Em outros termos, recomenda-se levar em consideração as necessidades educativas dos/as aprendizes, de modo a promover um espaço-tempo de integração (Reverdito et al., 2008).

À face do exposto, indicou-se como possibilidade para sobrepujar a polarização binária do mote, a acepção formulada por Carneiro et al.( 2017), segundo a qual a competitividade tem outra conotação, na medida em que aprimora o desenvolvimento ético. Trata-se de um enfoque cuja visão não se inscreve num ambiente sem justiça e desumanizado, no qual a competição se vê privada de seu amplo potencial formativo, pois, se assim o fosse, até proporcionar-se-ia empenho, excelência individual e autossuperação, por exemplo. Contudo seria incapaz – dada a ambientação em que se vê imersa – de aprimorar a humanização da sociedade, a autonomia humana e o reconhecimento do “outrem” (Carneiro et al., 2017).

Nesse sentido, uma “terceira margem da questão”, entre o desprezo da competitividade ou a aceitação de sua caricatura neoliberal, dar-se-á pelo “resgate da competitividade como uma peculiaridade humana”, já que ela “não é uma invenção do sistema capitalista, tampouco precisa ser execrada como um vício, ou uma antítese da virtude”, mas poder-se-ia se “manifestar de forma rica em um ambiente justo, em especial o ambiente em que ocorrem as escolarizações dos indivíduos, cuja formação ética tem oportunidades ímpares de ocorrer” (Carneiro et al., 2017, p. 88).

Encerrou-se o debate, ou melhor, o encontro, exprimindo a proposta de uma última atividade relativa ao período letivo, a saber: a produção de um relato avaliativo sobre o processo (virtual) formativo experienciado. Nessa direção, o último REO orientava os/as aspirantes à docência a revisar todo o conteúdo da disciplina alvitrando avaliá-la. Para isso, o docente regente erigiu uma espécie de roteiro semiestruturado de questões, de modo a subsidiar a proposta avaliativa. A tabela 1 expõe as indagações, conforme se vê de agora em diante.

TABELA 1
Roteiro semiestruturado de questões
Roteiro semiestruturado de questões
Fonte: elaborada pelos autores.

Em termos de resultados, dos vinte e oito (28) aprendizes matriculados na disciplina ‘Pedagogia das Lutas’, apenas dezesseis (16) concluíram a atividade. Em relação ao primeiro ponto (lê-se “Que bom”), cujos/as acadêmicos/as descrever-se-iam experiências significativas, em linhas gerais, notou-se dois aspectos proeminentes nas avaliações – após um escrutínio analítico dos relatos para composição das categorias de análise –. O primeiro diz respeito à compreensão do fenômeno Lutas/Artes Marciais a partir da ótica dos autores selecionados como aporte teórico da disciplina, com destaque à relação do conteúdo com temas de relevância social e as possibilidades do trabalho pedagógico com as diferentes etapas de ensino. O segundo elemento está atrelado ao projeto didático com a qual se conduziu as aulas, em especial, às propostas cujas implicações culminaram na produção e desenvolvimento de atividades propositivas, “práticas”, por assim dizer. Ambos os aspectos arrolados nos relatos retratam a relevância dos atributos formativos – descritos na introdução do texto –, presentes na pedagogia universitária empregada pelo docente regente do componente curricular, uma evidência ratificada por nossa investigação, a despeito de não tê-la explorado em termos de material empírico de análise, caracterizando um limite do estudo empreendido. Percorramos alguns trechos dessas avaliações cujos teores revelam os destaques significativos – sob a percepção dos/as aprendizes – do processo de formação, em conformação remota:

No que diz respeito aos processos de aprendizagens, experiências e formação, esta disciplina foi um potencializador para minha aprendizagem dos aspectos e as características das Lutas de maneira geral. Ao longo da disciplina pude compreender que as várias expressões de Lutas possuem características semelhantes, apesar de cada uma delas apresentarem suas especificidades (Hélio Gracie).

Que bom que no decorrer da disciplina, nós conseguimos aprender um pouco sobre as lutas/artes marciais. Foi dado início com uma introdução sobre a temática, onde o objetivo foi conhecer os conceitos e as características (Amanda Ribas).

Muito bom, o fato de termos conseguido dar continuidade a disciplina de Pedagogia das Lutas, em razão da pandemia. Os textos abordados durante a disciplina foram de extrema importância para esclarecer muitos conceitos sobre a luta, como, por exemplo; suas características, suas semelhanças, maneiras de aplicação prática nas aulas [...] (Yvone Duarte).

Depreende-se dos três excertos expostos o fato de alguns dos/as futuros/as professores/as de Educação Física interpretarem o trabalho conceitual relativo às Lutas/Artes Marciais como significativo, notadamente no tocante à compreensão de seus princípios condicionantes (características) os quais adjudicam distinguir e aproximar os saberes concernentes a essas práticas corporais (historicamente situadas), de igual modo estruturar uma planificação em termos pedagógicos (Gomes, Morato, Duarte e Almeida, 2010; Pereira et al., 2020; Pereira et al., 2021). Logo, essa verificação nos permite estabelecer a ilação da presença de mobilização intelectiva na direção de apropriação dos conceitos discorridos, no momento da formação inicial dos/as investigados/as, malgrado nem todos/as explicitarem tal acontecimento nos relatos.

Essa apropriação conceitual confere, de alguma maneira, aos aspirantes à docência, condição pedagógica para desenvolver o conteúdo na escola, haja vista que o escamoteamento do conteúdo na formação inicial incide na ausência de seu ensino, de acordo com Rufino (2018), muito embora a apropriação epistêmica não afiance sua presença no interior do trabalho pedagógico desenvolvido nas aulas de Educação Física.

Ainda na esteira do primeiro ponto (lê-se “Que bom”), outros participantes enalteceram as tematizações relativas: as questões de gênero, as competições infantis e a discriminação socioeconômica em práticas esportivas vinculadas ao universo das Lutas/Artes Marciais, sejam nos encontros virtuais ou nas atividades escritas. Na continuidade alguns fragmentos textuais revelam essa questão:

[...] trouxe à tona temas sociais relevantes (gênero, violência, classe social, mídia, dentre outros), que podem e devem ser problematizados e discutidos para promover o ensino das lutas/artes marciais (Cris Cyborg).

A questão de gênero também foi assunto de nossas aulas, através do filme “Menina de Ouro” podemos analisar como ainda na sociedade moderna há preconceitos baseados em estereótipos, muitos ainda enxergam as lutas somente para o público masculino, sendo que mulheres não devem lutar. Contudo, movimentos como o feminismo, sinalizam à igualdade de gênero, defendendo que mulheres podem estar onde elas quiserem (Luana Azulguir).

Uma questão debatida na disciplina muito importante foi a da competição; os modelos historicamente construídos pelos adultos, modelos baseados, muitas vezes, no alto rendimento e na busca por resultados (a qualquer preço), sobretudo pela famigerada vitória. Fato que acaba, por sua vez, prejudicando os sujeitos envolvidos, principalmente as crianças; a questão da especialização precoce; supervalorização da competição; a questão de como pensar a competição na infância e como trabalhar de forma pedagógica com as crianças (Anderson Silva).

Como se vê, suscitar tematizações correlacionando às Lutas/Artes Marciais denota uma perspectiva de formação alvissareira, a despeito de desafiadora, porquanto fomenta igualmente conflitos, já que coloca em debate aspectos relevantes da sociedade, todavia expõe preconceitos, crenças e convicções. A esse respeito, explana Castro (2014, p. 20) “importa menos o que as aulas dizem sobre os/as autores/as, os conceitos, e mais como as/os estudantes, em relação com as palavras e conceitos desses/as autores/as, podem formar e transformar suas palavras, suas ideias, seus saberes”. Complementa sua explicação dizendo “como as aulas podem ajudar a pensar e sentir o que ainda não foi possível pensar e sentir. Nessa experiência as/os estudantes podem encontrar com suas próprias fragilidades, vulnerabilidades e ignorâncias, sua própria impotência”. Em última análise são reflexões – a respeito de problemáticas sociais – cujo ideal de educação assenta-se sob o preceito da emancipação, consoante a Freire (2002).

Além disso, há avaliações indicando à importância deste conteúdo em qualquer ambiente de formação, embora a ênfase recaia-se na escola, justamente porque corresponde a um saber pertencente ao acervo da cultura corporal de movimento (Bracht, 2005). Na sequência têm-se dois relatos recomendando essa perspectiva.

O ensino das lutas na escola ou em centro de treinamentos é de extrema importância tanto na formação motora como psicológica e social dos educandos, uma aula bem elaborada pode contribuir tanto no desenvolvimento motor dos alunos, assim como no quesito psicológico e social, formando um ser de maneira integral (Flavio Canto).

[...] aprendemos como ensinar, tratar e problematizar as lutas dentro do âmbito escolar. Percebemos que embora ainda haja aspectos que limitam ensinar lutas através da Educação Física escolar, basta adaptar à realidade da escola, levando em consideração aspectos socioculturais dos alunos ou os problemas relacionados à infraestrutura (Gabi Garcia).

No fragmento textual produzido por Gabi Garcia, nota-se à mobilização do saber no que se refere ao ajuste do conteúdo ao contexto escolar específico, demonstrando “pequenas marcas formativas” resultante do contato com a disciplina Pedagogia das Lutas. Quanto a isso glosam Pires, do Nascimento, Farias e Suzuki (2017) que marcas deixadas no processo de formação inicial de professores de Educação Física podem interferir no desenvolvimento profissional e atuação ulterior.

Houve, além disso, um realce presente em alguns relatos referente ao encontro no qual se expôs movimentos corporais característicos de alguma modalidade marcial, com demonstrações de elementos tático-técnicos pelo regente do componente curricular. Ao que tudo indica, para os/as acadêmicos/as, existiu uma valorização das aulas nas quais se versava à construção de experiências corporais, mesmo em condição remota (virtualidade). Muito provavelmente corresponda a uma valorização do movimento corporal, no sentido do ‘aprender fazer para saber ensinar’, uma perspectiva, segundo Figueredo (2007), cuja aprendizagem marca o corpo de maneira profícua. Aliás, de acordo com o autor, a escolha do curso de Educação Física, via de regra, está relacionada diretamente com as práticas corporais vivenciadas ao longo da existência, razão pela qual os/as participantes enalteceram os encontros (virtuais) cuja temática suscitava algum tipo de movimentação ou realização de movimento, malgrado às limitações da condição remota.

Apresentado os destaques relativos aos aspectos assertivos da pedagogia universitária, pelos quais houve possibilidades de apropriação dos conteúdos desenvolvidos, adentramos no segundo ponto cujo objetivo consistia em vasculhar os obstáculos e impedimentos do processo formativo, referenciado pela expressão: “Que pena”. Em linhas gerais as críticas foram dirigidas para a carência de contato e de experiências corporais relacionadas às Lutas/Artes Marciais, conforme revela o excerto da avaliação a seguir:

Foi um pouco frustrante não poder realizar a disciplina presencialmente, mas o professor e seus auxiliares fizeram o máximo que puderam para amparar e suprir essas necessidades. Torço para que em breve seja possível nos encontrar e desfrutar das coisas boas que o contato físico nos permite. (Kyra Gracie)

Na passagem citada, constata-se o desapontamento de Kyra com o ensino remoto, não por falta de conhecimentos relacionados ao saber ensinar, mas, sim, pela ausência do contato físico. A discente patenteia o fato de o contato proporcionar “coisas boas”, trata-se de uma verificação cujo indicativo oportuniza inferir que nenhuma outra condição de ensino substitui à presencial, ao menos no que diz respeito ao ensino de práticas corporais. Soa como uma espécie de desabafo sua manifestação textual. Similar a ela, essa questão foi sublinhada por outro/as aprendizes:

Como desafios do processo de ensino aprendizagem eu destacaria primeiramente a questão de estarmos limitados por uma tela em virtude do momento que atravessamos, acho que a falta do contato presencial seria o primeiro desafio no ensino aprendizagem da disciplina, até porque se trata de uma disciplina de prática corporal em que o contato dos indivíduos é fundamental para elucidar aspectos importantes das Lutas/Artes Marciais (Caín Velásquez).

Infelizmente não tivemos a prática nesta matéria – exceto em alguns momentos demonstrativos –, devido ao caos gerado pela pandemia. Acho que faz e fez bastante falta à troca de experiência que ocorre dentro da sala de aula, pois gosto assaz dessas matérias, principalmente quando há a parte prática (Gabi Garcia).

Uma pena não termos tido a possibilidade de realizá-la presencialmente, pois as dinâmicas práticas ajudariam muito para uma melhor assimilação dos conteúdos. Mas vale destacar que as aulas práticas demonstradas pelos convidados foram de extrema importância, facilitando, em muito, à aprendizagem. Assim, mesmo não sendo possível realizar a prática, o “assistir” também ajudou muito na compreensão (Ronda Rousey).

Fica marcado nos fragmentos textuais a necessidade dos/as acadêmicos/as realizarem corporalmente – uma espécie de aprendizagem encarnada – os jogos e as práticas de Lutas/Artes Marciais, tendo em vista que isso robusteceria os saberes e experiências preconizadas na disciplina. Ao trazer o contexto da prática corporal à baila no processo de formação de professores de Educação Física, Quaranta e Pires (2013) identificaram que a falta de vivências corporais e saberes pedagógicos – principalmente no início do curso –, obscurece a mobilização da aprendizagem na direção de ressignificar ou romper com empirias e representações precedentes ao Ensino Superior. No caso, em questão, não notamos a ausência de desconstrução no que diz respeito às perspectivas arraigadas que antecederam o ingresso ao curso, ao menos não fica nítido nos materiais (empíricos) escrutinados.

Muito bem, esgotado os aspectos referentes aos desafios examinou-se o terceiro ponto proposto na avaliação, sendo ele de natureza mais propositiva, a partir da indagação: “Que tal?”. Tratava-se do momento cujos participantes deveriam apresentar propostas ou ideias frente aos desafios cotejados, a fim de aquilatar os processos de aprendizagem formulados na oferta – atual e ulterior – da disciplina. À semelhança dos apontamentos expostos no segundo ponto – obstáculos e impedimentos do processo formativo, a partir da expressão: “Que pena” –, os relatos indicam à carência de experiências corporais, sendo a mesma resolvida com a ampliação da quantidade de aulas, pari passu com a intensificação da participação efetiva do coletivo de aprendizes, conforme se vê de agora em diante.

Como sugestões ao processo de ensino da disciplina eu acho que seria legal ter mais experiências práticas nos encontros, pois proporcionaria uma participação mais efetiva dos alunos a refletirem todos juntos e a entender melhor a teoria; disponibilizaria como subsídios filmes, seriados e até mesmo desenhos para elucidar melhor determinadas Lutas e Artes Marciais, os jogos de oposição, contexto histórico, etc. (Caín Velásquez).

Que tal nos próximos períodos, caso continuarmos ainda estivermos remotamente, a ministração de mais aulas envolvendo a prática de outros professores, como foi com os professores Alex, Alysson e Gustavo (Amanda Ribas).

Os relatos assinalam para o fato das aulas cuja teorização foi construída a partir da vivência de jogos de oposição e vivências demonstrativas (dimensão procedimental do conteúdo), tenham potencializado uma compreensão mais elaborada sobre os próprios conceitos (dimensão conceitual). Em que pesem os limites, ao que parece, a disciplina conferiu subsídios – teórico-metodológicos – de modo que os/as aspirantes à docência desenvolveram saberes concernentes às Lutas/Artes Marciais na escola, entretanto, segundo eles, as experiências corporais poderiam ser ampliadas. Houve, além disso, discentes que não sugeriram nenhum tipo de mudança ou acréscimo à disciplina, haja vista entenderem a conjuntura na qual o processo formativo transcorrera, à face disso contemplou todas as expectativas, tal qual evidencia o próximo fragmento textual.

Diante do processo, não mudaria nada, pois no meu entendimento o conteúdo foi trabalhado de forma sistematizada e abordando de forma claro, como a modalidade Luta deve ser trabalhada na escola, assim como as diversidades, desafios, obstáculos, resistência que são encontradas nas aulas de educação física (Rickson Gracie).

O relato reconhece o contexto (e suas fragilidades) sobre o qual o ensino remoto híbrido e/ou a distância decorreu, ainda assim, denota assertividade na proposta formativa, na medida em que não propõe adequações. A esse respeito, Lazzarotti Filho, Silva, Lisbôa e Pires (2013) e Pimentel (2014) advertem para a possibilidade dos cursos de Educação Física fomentarem o ensinar a partir de ferramentas virtuais diversas, rompendo com modelos tradicionais de ensino baseado no “saber fazer-ensinar”.

Concluindo o último ponto proposto na avaliação, ter-se-ia o momento cujos aprendentes discorreriam a respeito das impressões extraídas de todo o processo formativo, descrevendo os limites e possibilidades para o ensino de Lutas/Artes Marciais no contexto remoto, contudo ao invés de apresentá-lo neste espaço o faremos nas impressões finais, de maneira a usá-lo na qualidade de uma “moldura” para o encerramento do estudo.

À guisa de conclusão

Conforme se aludiu anteriormente, a última propositura da disciplina ‘Pedagogia das Lutas’ alvidrou uma espécie de processo autoavaliativo. De modo geral houve relatos com argumentos e questões díspares. Alguns alegaram não terem conseguido acompanhar à disciplina em sua totalidade, limitando-se a apreciação dos aportes teóricos. Outros declararam o acompanhamento dos encontros sincronamente, embora tenham deixando de elaborar as atividades indicadas para nutrir os debates e fomentar a inteligibilidade dos conteúdos desenvolvidos nos encontros.

Adiciona-se a isso, enunciados justificando o absenteísmo dos encontros em razão de ocupação laboral, na tentativa de complementar o orçamento familiar, em virtude de adoecimento ou desemprego dos/as entes. Ademais existiram agradecimentos dedicados ao professor e convidados, com destaque em relação ao empenho para fornecer uma formação a qual fizesse sentido em face de tantas adversidades.

Em termos de limites a ênfase reincidiu na “falta de contato corporal”, o tema mais recorrente em todos os relatos, com efeito, acabou se configurando como o grande desafio para o ensino de Lutas/Artes Marciais na escola, residindo na principal crítica endereçada à disciplina. Com a ressalva dele (lê-se o toque) figurar na qualidade de uma das características da prática corporal em questão, lembrando a explanação de Gomes (2008), a respeito do contato intencional, oponente/alvos, imprevisibilidade e fusão ataque/defesa, portanto, requerendo a participação de outrem na atividade.

No plano da virtuosidade tem-se a proeminência dos autores selecionados na qualidade de aporte teórico da disciplina, com realce à relação do conteúdo com temas de relevância social e a questão de fornecerem subsídio epistemológico para o desenvolvimento do trabalho pedagógico pensando as diferentes etapas de ensino. Houve referência ao modo de condução dos encontros, em especial, quando às propostas em atividades “práticas”. A título de elucidação dos assuntos arrolados erigiu-se uma tabela cujo teor sintetiza-os, doravante:

TABELA 2
Possibilidades e desafios para o ensino de Lutas.
Possibilidades e desafios para o ensino de Lutas.
Fonte: elaborada pelos autores.

Ora, se os obstáculos listados serão sobrepujados, quer em uma nova edição do componente curricular, quer no desenvolvimento da docência dos/as futuros/as professores/as, não se pode afiançar, no entanto, a síntese construída ao menos indica um exercício reflexivo dos/as acadêmicos/as, de modo a evocar conscientização e granjear mudanças para o aprimoramento do ensino das Lutas/Artes Marciais na escola.

Esperamos assaz cuja investigação até aqui descrita, permita, de algum modo, lançar rebento para se pensar as injunções imputadas à docência em tempos de pandemia e se some a outras contribuições para compreender o complexo campo da formação docente, notadamente sob conformação remota. Nosso intento, em última análise, consistiu em perscrutar uma experiência docente no tocante ao ensino de Lutas/Artes Marciais, observando um contexto específico, reconhecendo suas limitações – algumas, inclusive descritas em outros momentos do trabalho – e potencialidades, todavia coerente com a perspectiva de articular pesquisa e formação (Demo, 2004).


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Recepción: 21 Agosto 2021

Aprobación: 15 Enero 2022

Publicación: 01 Febrero 2022

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