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Fatores de sucesso do ambiente na formação esportiva de crianças: o caso de um projeto extensionista de basquetebol
Resumo: Objetivou-se analisar os fatores de sucesso do ambiente de um projeto de extensão universitário brasileiro, para a formação de crianças por meio do basquetebol. Participaram da pesquisa, 10 profissionais, 16 familiares e 14 crianças. Para coleta e análise das informações, utilizou-se análise documental e Técnica de Investigação Qualitativa - Entrevista, Transcrição, Categorização e Interpretação. As evidências revelaram que as condições financeiras são consideradas suficientes para o desenvolvimento do projeto (importância da universidade e das atividades de arrecadação). As condições materiais foram consideradas como satisfatórias e insatisfatórias. Coordenadores geral e técnico, professor voluntário, monitor, estagiários, familiares e crianças são os recursos humanos do Projeto. Aulas, festivais e reuniões são as principais atividades do processo de formação esportiva, enquanto sociabilização, valores sociais, criação de hábitos saudáveis e divertimento destacaram entre as conquistas individuais. Doações de tênis e uniformes às crianças representam os artefatos da cultura organizacional. Comprometimento, interação e princípios expressam os valores defendidos, enquanto a promoção do gosto, o conhecimento do basquetebol e a formação de professores e treinadores evidenciam as premissas básicas. Conclui-se que o contexto retrata um ambiente exitoso, que, ao integrar seus recursos, processo e resultados, tem alcançado sucesso na formação de crianças, por meio do basquetebol.
Palavras-chave: Basquetebol, Fatores de sucesso, Formação esportiva, Crianças.
Environmental success factors in children’s sports training: The case of a basketball outreach project
Abstract: This study sought to analyze the environmental success factors of a Brazilian university outreach project focused on children’s training through basketball. Ten professionals, fourteen children and sixteen family members participated in the research. For data collection and analysis, document analysis and qualitative research techniques were employed: interviews, transcription, categorization and interpretation. The evidence revealed that financial conditions were sufficient for the project’s development, highlighting the importance of the university and fundraising activities. Material conditions were deemed both satisfactory and unsatisfactory. The project’s human resources included general and technical coordinators, volunteer teachers, monitors, interns, family members and children. The main activities in the sports training process were classes, festivals and meetings, while individual achievements included socialization, instilling social values, the creation of healthy habits, and fun. Donations of sneakers and uniforms to the children were part of the organizational culture. Commitment, interaction and principles expressed the espoused values, while fostering a love for basketball, increasing knowledge of the sport, and the training teachers and coaches were highlighted among the basic premises. In conclusion, the context portrays a successful environment which, by integrating its resources, processes and results, has achieved success in the development of children through basketball.
Keywords: Basketball, Success Factors, Sports Training, Children.
Factores ambientales para el éxito en el entrenamiento deportivo infantil: el caso de un proyecto de extensión de básquetbol
Resumen: El objetivo fue analizar los factores de éxito del entorno de un proyecto de extensión universitaria brasileño, para la formación de niños a través del básquetbol. Participaron de la investigación 10 profesionales, 16 familiares y 14 niños. Para la recolección y análisis de la información se utilizó el análisis de documentos y Técnicas de Investigación Cualitativa: Entrevista, Transcripción, Categorización e Interpretación. La evidencia reveló que las condiciones financieras se consideran suficientes para el desarrollo del proyecto (importancia de la universidad y actividades de recaudación de fondos). Las condiciones materiales fueron consideradas satisfactorias e insatisfactorias. Entre los recursos humanos del proyecto se cuentan coordinadores generales y técnicos, docente voluntario, monitor, pasantes, familiares y niños. Las principales actividades en la formación deportiva abarcan clases, festivales y encuentros, y en cuanto a los logros individuales, se destacan la socialización, los valores sociales, la creación de hábitos saludables y la diversión. Los artefactos de la cultura organizacional se representan en las donaciones de zapatillas y uniformes a los niños. Los valores que se defienden se manifiestan en el compromiso, la interacción y los principios, mientras que el fomento del gusto, el conocimiento del básquetbol y la formación de profesores y entrenadores resaltan entre las premisas básicas. En conclusión, el contexto retrata un entorno exitoso, que, integrando sus recursos, procesos y resultados, ha logrado el éxito en la formación de niños a través del básquetbol.
Palabras clave: Básquetbol, Factores de Éxito, Entrenamiento Deportivo, Niños.
Introdução
O processo de formação esportiva perpassa por vários fatores, com destaque para o local ofertado para a prática de treinamento e competição dos participantes. Na Alemanha, por exemplo, os clubes esportivos se apresentam como os principais contextos que organizam a prática esportiva para crianças, enquanto, nos Estados Unidos, sabe-se que o esporte é desenvolvido logo cedo nos contextos escolares (Felfe, Lechner e Steinmayr, 2016), enquanto no Brasil, a oferta da prática esportiva acontece tanto em locais formais (escolas, universidades), quanto não formais (clubes, projetos sociais e prefeituras) (Machado, Galatti e Paes, 2015). Nesse contexto, o ambiente esportivo envolve um conjunto de funções, estruturas, componentes e relações sociais estabelecidas dentro e fora dele, sendo necessário que projetos, programas e clubes esportivos consigam realizar adequadamente o processo formativo de crianças e jovens, promovendo um ambiente interessante e capaz de promover o sucesso dos envolvidos.
Nesse sentido, Henriksen (2010) apresenta o modelo de fatores de sucesso do ambiente, desenvolvido para ilustrar os fatores intervenientes no processo de formação esportiva. Para que um ambiente seja considerado de sucesso, suas pré-condições devem abranger recursos financeiros (patrocínios, arrecadações), materiais (equipamentos esportivos, infraestrutura) e humanos (professores, fisioterapeutas, psicológicos, nutricionistas etc.) adequados. Além das pré-condições, para o sucesso de determinado ambiente esportivo, destaca-se o seu próprio processo de desenvolvimento, ou seja, suas atividades diárias, incluindo as específicas, como treinamento e competições, até as mais ampliadas, como a realização de reuniões e eventos sociais. Por fim, os resultados concentram as conquistas individuais adquiridas por parte de cada atleta (novas competências e premiações), as conquistas coletivas, representadas pelo alcance coletivo do sucesso (vitórias, títulos) e a cultura organizacional, a qual inclui elementos importantes que compõe o ambiente e que são característicos daquele contexto (costumes, vestimentas, valores defendidos etc.).
No cenário investigativo, as pesquisas acerca dos fatores de sucesso do ambiente têm sido conduzidas para verificar os fatores determinantes de sucesso em clube esportivo de formação, com caráter competitivo, (Folle, Nascimento, Souza, Galatti, Graça, 2017), de elite ou seleções nacionais (Henriksen, Stambulova e Roessler, 2010, 2011; Henriksen, Larsen e Christensen, 2014; Larsen, Henriksen, Alfermann e Christensen, 2014; Galatti et al., 2016). Em sua maioria, essas investigações constataram limitações de recursos, principalmente financeiro, com exceções para alguns clubes que possuíam um alto orçamento que advinha de mensalidades de sócios ou ações para arrecadação além de contar com apoio de patrocinador externo para equipe adulta e muitos funcionários trabalhando para a formação dos atletas.
Em relação ao processo, os estudos citados anteriormente verificaram que os praticantes possuíam um grande volume de horas semanais de treinamento e de competições disputadas aos finais de semana, além de acampamentos, reuniões, eventos sociais e recreativos. Além disso, identificaram que os processos desenvolvidos nesses ambientes têm proporcionado maior autonomia e coesão entre os atletas e evidente representatividade dos atletas de elite ou mais experientes, os quais serviam de modelo aos praticantes mais jovens. Ademais, observaram uma forte preocupação com a cultura organizacional, caracterizada por valores de cooperação, responsabilidade individual e foco no processo de desempenho, além de preocupação com o equilíbrio do cotidiano na escola/universidade e no esporte. Por outro lado, diferenciando-se dos demais ambientes investigados, a equipe de golfe dinamarquesa apresentou uma cultura organizacional incoerente, deixando os membros com a sensação de fazer parte de uma cultura pouco clara e com poucas diretrizes de apoio, em termos de como se desenvolver como jogador de golfe.
Na realidade brasileira, encontrou-se, até o momento, apenas um estudo (Folle et al., 2017), de um clube de basquetebol com tradição na formação de jogadoras do sexo feminino (não elite). O clube esportivo possuía apoio financeiro e de infraestrutura privado e público, além da mensalidade dos sócios, rifas e eventos sociais. Quanto ao processo, eram realizadas reuniões administrativas, eventos sociais, treinamentos e competições para as diversas categorias formativas. As conquistas individuais envolviam, além de premiações, o desenvolvimento de competências psicossociais, enquanto as conquistas coletivas envolveram títulos em 17 vários níveis competitivos. A cultura organizacional foi destacada pelo desenvolvimento de valores coletivos.
Observa-se, assim, que os estudos sobre os fatores de sucesso do ambiente têm focado, internacionalmente, em contextos de elite e, no Brasil, em clube com caráter competitivo (sucesso em termos de conquistas esportivas nas categorias de base), existindo assim uma lacuna na investigação de ambientes esportivos que visam, primeiramente, o desenvolvimento bem-sucedido no processo de formação de crianças e jovens, por meio do esporte. Como destaca Henriksen (2010), um ambiente de formação esportiva é caracterizado como bem-sucedido quando obtém resultados de sucesso na formação de seus praticantes e, portanto, não prioritariamente de conquistas em competições esportivas. Por essa razão, considerando a relevância da temática e da ausência de estudos que buscaram compreender a temática em foco, em projetos esportivos extensionistas em Universidades, este estudo buscou analisar os fatores de sucesso do ambiente de um projeto de extensão universitário brasileiro, para a formação de crianças por meio do basquetebol.
Metodologia
A investigação se caracterizou como um estudo de caso, do tipo descritivo com abordagem qualitativa das informações (Yin, 2014). O estudo teve autorização do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (CEPSH), aprovado sob o parecer 4.306.949.
Participantes
O contexto investigado foi o Projeto Baby Basquetebol, o qual faz parte do Programa Basquetebol para Todos, ação extencionista da Universidade do Estado de Santa Catarina (Brasil). Participaram do estudo 10 profissionais (coordenador geral, coordenador técnico, monitora atual, seis ex-monitores), 16 familiares e 14 crianças com idades entre quatro e 12 anos, participantes das aulas de basquetebol do projeto. A participação no estudo foi viabilizada após assinatura dos termos de consentimento livre e esclarecido e termo de uso de imagem (profissionais, familiares e crianças).
A coleta de dados ocorreu de janeiro a março de 2020, durante o isolamento da pandemia de Covid-19, o que levou muitas crianças a se afastarem do projeto e por isso o número reduzido de crianças e familiares participantes.
Instrumentos e procedimentos
Para coleta das informações, foi utilizada, inicialmente, a análise documental. As fontes documentais foram recebidas, de coordenadores e monitores, via e-mail: projetos submetidos à Universidade; relatórios; artigos desenvolvidos sobre o projeto; materiais de Escola Americana utilizados para planejamento das aulas. Os materiais foram arquivados no software NVivo. A Técnica de Investigação Qualitativa: Entrevista, Transcrição, Categorização e Interpretação - ETCI (Resende, 2016) também foi utilizada para coleta e análise das informações. A entrevista foi elaborada a partir de temas geradores pautados nos elementos do Modelo de Fatores de Sucesso do Ambiente (Henriksen et al., 2010, 2011), além da caracterização dos participantes:
Caracterização pessoal: sexo, idade, experiência esportiva, prática do basquete antes de iniciar no projeto, tempo de participação e envolvimento no projeto, formação profissional;
Pré-condições: condições financeiras, ginásios, materiais, apoio financeiro, características dos participantes, envolvimento e relações estabelecidas entre os envolvidos no Projeto;
Processo: adequação da carga horária, planejamento e desenvolvimento das aulas, atividades, jogos ou brincadeiras realizadas nas aulas, participação em festivais e eventos esportivos, oferta de atividades formativas;
Resultados: principais resultados percebidos no desenvolvimento individual e coletivo das crianças, percepção de aprendizagens nas aulas, vestimentas, valores, crenças e princípios adotados.
O roteiro das entrevistas, conforme indicação de Resende (2016), passou por processos de validação. A validação preliminar foi realizada por pós-graduandos da área da Pedagogia do Esporte. Posteriormente, a validação de conteúdo foi conduzida por quatro especialistas: professores doutores na área de Educação Física; com experiência em pesquisa qualitativa; e com estudos publicados na área da Pedagogia do Esporte. O roteiro da entrevista foi considerado adequado para atender aos objetivos e ao marco teórico da investigação.
As entrevistas foram realizadas de forma individual e on-line, na Plataforma digital Google Meet. As crianças também responderam as entrevistas individualmente, porém estavam acompanhadas pelos seus responsáveis. As entrevistas foram gravadas por meio da ferramenta de gravação da Plataforma e, juntamente, foi utilizado um gravador de voz complementar. As entrevistas, com os dois coordenadores, tiveram duração média de 1 hora e 15 minutos, com os monitores, duração média de 40 minutos, com os familiares aproximadamente 20 minutos e com as crianças 15 minutos.
O segundo momento da técnica de investigação qualitativa ETCI foi a transcrição. Conforme as indicações de Resende (2016), a transcrição das entrevistas ocorreu logo após a sua execução, seguindo a ordem de questão-resposta, levando em conta: pontuação; ortografia; e apresentação gráfica. As transcrições das entrevistas foram enviadas aos participantes para que estes fizessem o processo de validação (leitura, correções e aprofundamento das ideias, se necessário).
Análise das informações
A análise das informações foi realizada a partir das duas últimas etapas da técnica de investigação qualitativa ETCI (Resende, 2016). A categorização das informações foi realizada no software NVivo para codificação, articulação e visualização dos dados. Após realizada a criação de categorias, com base no roteiro das entrevistas e no Modelo de Fatores de Sucesso do Ambiente (Henriksen, 2010), realizou-se a leitura de das entrevistas, distribuíram-se as unidades de significados pelas diferentes categorias e fez-se a revisão. A validação das categorias criadas e sua relação com a falas dos participantes foi realizada por duas investigadoras, com discussões com uma terceira pesquisadora, com publicação de estudo sobre a temática e teoria adotada, a qual atuou como consenso.
A interpretação seguiu os indicativos de Resende (2016): extraiu-se o conteúdo emergente das entrevistas e escreveu-se um texto resultante da interpretação das unidades de significado das entrevistas, para, por fim, discutir-se os resultados encontrados com a literatura. Destaca-se que a categorização e a interpretação utilizadas para a análise das entrevistas, foram utilizadas também para a análise das fontes documentais.
Resultados e discussão
Pré-condições: recursos financeiros, materiais e humanos
As pré-condições ofertadas pelo Projeto Baby Basquetebol foram analisadas por meio dos recursos financeiros, materiais e humanos, as quais foram citadas durante as entrevistas, em sua maioria, pelos coordenadores, possivelmente por estes terem acesso direto a tais informações. As evidências revelaram que os recursos financeiros são suficientes para o desenvolvimento do Projeto e evidenciaram a importância dos editais da Universidade e das atividades internas de arrecadação. Os patrocínios privados e o convênio público também foram citados, porém com menor destaque (Figura 1).
A principal verba ofertada pela universidade possibilita a manutenção, a limpeza e a segurança da estrutura onde as ações do Projeto são desenvolvidas, apesar de averba destinada ao Projeto ser dividida com os outros projetos de extensão pertencentes ao Programa Basquetebol para Todos, programa que capta os recursos recebidos para o basquetebol. A universidade também se caracterizou como a principal fonte de divulgação deste, por meio de notícias no site e de publicações em suas redes sociais e do Centro de Ensino, ao qual o Projeto está vinculado.
Buscamos, através de órgãos de fomento, recursos para manutenção dos projetos. Nisso, vem uma determinada parte do recurso empregada a aquisição de materiais [...] para específico para o Baby depende de muitos recursos do [...] (Coordenador Nino).
O apoio financeiro da universidade tem permitido que as atividades sejam gratuitas a todos os participantes, ou seja, as crianças não pagam taxas ou mensalidades para participarem das aulas e demais atividades. Além disso, é bastante destacado, pelos coordenadores do Projeto, a importância do pagamento de bolsas de extensão aos monitores responsáveis por auxiliarem e orientarem as atividades com a supervisão dos coordenadores e outros professores, voluntários no Programa.
Outros dois projetos extensionistas brasileiros, semelhantes ao Baby Basquetebol, têm sua fonte de recurso financeiro originário do apoio da Universidade. No caso do projeto Esporte Emancipação, a Universidade Comunitária Regional de Chapecó (Unochapecó) é a mantenedora da instituição (Rezer, Sbaraini, Rezer, Fávero e Vianini, 2007), enquanto para a manutenção do Centro de Formação no Treino de Basquetebol, a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) disponibiliza infraestrutura para o desenvolvimento das atividades (Silva et al., 2021). Além disso, destaca-se que ambos os projetos, assim como o projeto em tela, não cobram taxas ou mensalidades, sendo totalmente gratuitos.
Para além dos recursos ofertados via editais da universidade, o Projeto Baby Basquetebol conta com a realização de ações internas para arrecadação de maiores verbas para o funcionamento das atividades. Neste caso, são realizadas doações espontâneas por parte de monitores e familiares, que auxiliam com possíveis gastos extras que o projeto venha a ter, como a realização de festivais anuais para a integração entre as crianças. Com menos destaque, o coordenador geral retrata a realização de rifas e vendas de alimentos e bebidas, como contribuintes para a arrecadação de financeira.
[...] com uma espontaneidade dos familiares, de contribuir. Então, já foram feitas muitas rifas nesse sentido, para arrecadar recursos externos dos próprios pais, mas não que exista taxa nenhuma. [...] quando têm eventos, com a comercialização de alimentos e até água mineral e sucos para os que estão ali participando e às vezes não trazem ou já sabem que tem. Então, isso também é uma forma de falar dos recursos econômicos. É claro que isso aí é muito pequeno no montante de todos os recursos utilizados [...] não existe taxa de inscrição, não existe taxa de participação, o que existe, muitas vezes, são colaborações espontâneas por parte dos familiares (Coordenador Nino).
A importância da arrecadação por meio de eventos sociais, como almoços, jantares, rifas, vendas de alimentos durante atividades esportivas, também foi retratada como fundamental para a ampliação das receitas financeiras de clube de basquetebol do estado de Santa Catarina (Folle et al., 2017). Tais formas de arrecadação demonstram a importância do envolvimento dos agentes envolvidos (dirigentes, treinadores, familiares, participantes) na busca por maiores recursos para proporcionar melhores condições para o processo de formação esportiva de crianças e adolescentes, seja na extensão universitária, seja nos tradicionais clubes esportivos.
Pôde-se observar, no relato dos coordenadores, que o Projeto conta, ainda, com patrocínios privados, adquiridos através do apoio de empresas ou outras entidades que contribuem com doações, tanto de materiais, quanto de uniformes para os participantes do Projeto. Apesar de o convênio público com a Fundação Municipal de Esportes também apoiar com doações de uniformes, esta contribuía, significativamente, com auxílio financeiro aos profissionais que, planejam e ministram as atividades, além de supervisionarem os monitores e os estagiários do curso de bacharelado em Educação Física que atuam no Projeto.
[...] a prefeitura de Florianópolis, principalmente o prefeito, está ajudando a gente demais. [...] parte financeira vem do CEFID e da prefeitura [...] (Coordenador Gipe).
[...] eles têm um uniforme que é cedido, providenciado pela organização do Projeto através de recursos que são buscados, de parcerias com órgãos de serviços públicos, principalmente (Coordenador Nino).
Tal resultado encontrado leva a constatação do impacto dos governos, em suas distintas instâncias, sejam elas municipais, estaduais ou federais, nos âmbitos financeiro e educacional, para o desenvolvimento e a continuidade do esporte (Vieira e Vieira, 2001). Nesse caso, indo ao encontro das informações financeiras apontadas sobre o Projeto Baby Basquetebol, o Centro de Práticas Esportivas da Universidade de São Paulo (USP) é custeado pelo Governo do Estado de São Paulo e por empresas privadas. De modo semelhante, a USP também utiliza esses recursos para suprir custos com manutenção e funcionamento do campus, sendo importante e necessário o auxílio de patrocinadores para direcionar investimentos para as instalações esportivas (Tavares, Siqueira, Costa, Nascimento, 2016).
Ademais, o auxílio de Fundações Municipais também representa um importante meio de manutenção e subsistência dos projetos esportivos, a exemplo do exposto no estudo de Folle et al. (2017), o qual revelou que o convênio entre clube esportivo e Fundação Municipal de Esportes se torna um diferencial para o desenvolvimento das atividades formativas e para a participação em competições esportivas. Além desse parceiro, o clube, assim como o Projeto de Extensão investigado, também recebia auxílio de entidades privadas. No caso do clube de basquete se destacaram uma universidade privada (bolsas de estudo), academia de musculação e pequenas empresas locais.
Contrariamente ao observado quanto à importância dos recursos públicos na realidade brasileira, estudo em contexto de formação de atletas de categorias de base do basquetebol do estado de Minas Gerais evidenciou a necessidade de maior apoio das instituições governamentais e melhor organização interna das instituições esportivas no que se refere aos recursos para que os atletas em formação tenham a oportunidade de chegarem às equipes profissionais (Reis et al., 2014). Reflete-se ainda que a ausência de maiores recursos, sejam públicos ou privados, para alguns projetos esportivos, pode estar atrelado ao fato de estes terem cunho social e formativo, estando preocupados com a participação esportiva de crianças e adolescentes, em detrimento de resultados esportivos em idades precoces.
No contexto internacional, Henriksen et al. (2010; 2011) identificaram, em três clubes esportivos distintos e considerados de elite em sua modalidade (vela dinamarquês, atletismo sueco e caiaque norueguês), a existência de limitações financeiras, sendo que o clube de vela recebia apoio financeiro somente para que os atletas participassem de competições locais, mesmo estes se tratando de clubes bem estruturados. Mesmo os três clubes sendo considerados profissionais na gestão e na participação da modalidade em seus países, os recursos financeiros se diferenciam dos achados do Projeto Baby Basquetebol, haja vista este contar com parcerias públicas e privadas, que contribuem de forma significativa para seu desenvolvimento.
No que diz respeito às pré-condições materiais do Projeto Baby Basquetebol, elas foram classificadas como satisfatórias e insatisfatórias. Como satisfatórias, destacaram-se com maior ênfase a disponibilidade de materiais e equipamentos (quantidade e qualidade) para as aulas. Especialmente, as bolas e as tabelas menores, adaptadas às crianças, foram evidenciadas pela maioria dos participantes.
Sempre procuravam trazer os materiais novos e adequados à cada idade sempre tinha uniforme, colete, vários tipos de bolas de tamanhos diferentes. A tabela era adaptada para cada idade. Eu lembro que a cada turma a gente ia trocando as tabelas, as bolas, os materiais, que eram todos adaptados... (Ex-monitora Fernanda).
[...] os materiais a gente via que tinha. Tinha colete, tinha bola, cones, cestas de basquete pequena para os pequenos. Então, assim, era muito bem equipado o Projeto (Familiar Manoela).
[…] as bolas, eram boas, às vezes tinha até um espaço lá com muita bola. Até me ofereceram de tantas que tinham ganho [...] as bolas eram boas, as tabelas também não tenho o que reclamar. Inclusive, tinham dois tamanhos de tabela, uma ia mais para frente uma mais alta e uma mais baixa (Criança Many, 10-12 anos).
Nesse cenário, De Rose Junior, Pinto Filho e Correa Neto (2015) reforçam que as adaptações realizadas no basquetebol, tanto a utilização de bolas menores e a diminuição da altura da cesta, oportunizam, de forma prazerosa, o aprendizado da modalidade, favorecendo a prática e promovendo condições e incentivo para o aprendizado e evolução das crianças. Complementando, Marramarco, Marramarco e Gaya (2014) destacam que, para a faixa etária inferior a 11 anos, é necessário a adequação dos materiais e equipamentos para a prática, como uma tabela com a altura reduzida para poder fazer o arremesso e a utilização de bolas mais leves para a execução de determinadas habilidades da modalidade. Todavia, diferentemente dos resultados deste estudo e desta reflexão, Silva et al. (2021) apontam que, em relação ao programa extensionista de basquetebol da UFSC, uma barreira é não existir a possibilidade de adaptação da altura da tabela para os alunos da categoria sub12, pois além de interferir na aprendizagem dos participantes, esse fator pode desmotivar o aluno, resultando no abandono da modalidade.
Como condições insatisfatórias, especialmente os familiares e a monitora apontaram alguns detalhes que não aprovavam no ginásio onde são realizadas as aulas. Neste caso, as goteiras em dias de chuva foram citadas como principal problema. Um familiar relatou, inclusive, que já sofreu um acidente devido as goteiras dentro do ginásio atingirem a arquibancada, e uma das crianças reforçou o incômodo quanto a isso. Além desse fator, foi apontado que a limpeza e a organização dos banheiros também poderiam ser melhoradas.
Quando chovia tinha uns furos enormes no teto. Então caia muita água para dentro do ginásio e isso querendo ou não pode ser perigoso para as crianças, que podem resvalar e se machucar (Monitora Letícia).
[...] no dia era porque estava molhado e aí eu estava descendo a arquibancada e pisei em um desses tatames e como tinha água embaixo dele ele deslizou embaixo de mim. Eu caí e bati a parte de trás da cabeça no cimento da arquibancada (Familiar Pedro).
[...] a única coisa que me incomodava um pouco [...] é que a arquibancada sempre ficava molhada por causa das janelas que tinham atrás... acho que era a única coisa (Criança 10-12 anos, Many).
Corroborando com estes depoimentos, Silva et al. (2021) também identificaram que, para os participantes do Centro de Formação para o Treino em Basquetebol da UFSC, aspectos semelhantes têm sido sinalizados como insatisfatórios, pois acabam dificultando ou, até mesmo, impedindo a realização de algumas atividades, além de colocarem em risco a segurança dos alunos e dos treinadores do projeto. Ademais, a maioria dos treinadores apontaram a necessidade de melhoria dos equipamentos e da estrutura para a realização dos treinamentos. Como insuficiente, González, Silva e Machado (2018) evidenciaram também a limitação com relação às instalações disponíveis para o programa Esporte Educacional e Qualidade de Vida para crianças e adolescentes, da Universidade Federal do Ceará (UFC), relatando que a falta de materiais e obras não finalizadas são provenientes da falta de recursos e investimentos por parte da Universidade.
As pré-condições humanas do Projeto englobam os coordenadores, a professora voluntária, a monitora, os estagiários de Educação Física, os familiares e as crianças. O coordenador geral do Programa atua nas questões administrativas perante a Universidade, enquanto o coordenador técnico do Projeto atua diretamente no dia a dia das atividades desenvolvidas, supervisionando e interagindo com os participantes. A professora e a monitora são descritas, por coordenadores, familiares e crianças, como comprometidas, responsáveis, pacientes, experientes, com conhecimento e boa didática, além de possuírem um bom relacionamento com os participantes do Projeto.
Todos os monitores que eu conheci nesse quase um ano que a gente frequentou presencialmente lá, eu pude observar que são excelentes. Eu fiquei muito impressionada. Fui conhecer porque me falaram que tinha basquete [...] meio que despretensiosamente e fiquei muito impressionada […] (Familiar Manoela).
[...] só tenho a elogiar, porque o empenho deles e o amor deles com as crianças, eu não teria essa paciência toda que eles têm com as crianças. [...] Nossa, não tem o que reclamar, para mim é maravilhoso o trabalho deles (Familiar Vagner).
Quanto aos monitores, foi verificado ainda que, no início do Projeto, existia uma grande rotatividade e escassez. Porém, atualmente, com o auxílio da professora voluntária, a presença de uma única monitora é considerada, pelos envolvidos, como suficiente para as demandas e as necessidades do Projeto. Nesse seguimento, em conjunto ainda com a monitora, são destacados pelos participantes, os estagiários do curso de bacharelado em Educação Física da universidade, os quais passaram a fazer parte do projeto, por meio da realização dos estágios obrigatórios da Universidade, mas que possuem participação limitada ao período da realização deste (em torno de três meses). Corroborando com achados, o projeto da UFSC, conta com a participação de estudantes de Graduação e Pós-graduação em Educação Física, coordenados pelo professor responsável pelo projeto (Silva et al., 2021).
Ao encontro de ambos os projetos, o Programa de Desenvolvimento Desportivo em Basketball (Probasket), da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), conta com acadêmicos de Educação Física e um coordenador técnico para atender crianças e adolescentes, favorecendo a capacitação dos discentes participantes do projeto e oportunizando a aquisição de experiências para sua atuação profissional (Moura, 2020). Tais evidências demonstram a importância das ações extensionistas na formação de crianças e adolescentes, pois ampliam o número de profissionais que atuam diretamente com estes, assim como para a formação de futuros profissionais, pois apresentam diversas formas de inserção de acadêmicos nas atividades desenvolvidas e que acabam por enriquecer seus processos formativos.
Por outro lado, tendo em vista a dificuldade de encontrar locais na comunidade que aceitem a realização de estágios supervisionados, o projeto da UPF aproveitou o projeto de extensão ‘Atleta do Futuro’ para oferecer vagas de estágios aos alunos dos cursos de bacharelado e licenciatura em Educação Física (Bona, Frandoloso e Zanella, 2016). Nesse caso, o projeto Atleta do Futuro se assemelha ao Projeto Baby Basquetebol no sentido da oferta de vagas de estágio para os alunos, mas difere na forma como essas vagas são percebidas, pois a inserção dos estagiários, no Projeto Baby Basquetebol, segundo os envolvidos, ocorre pelo potencial de formação propiciado aos futuros profissionais de Educação Física formados pela instituição a qual o Projeto pertence.
Os recursos humanos dos clubes internacionais se apresentam de forma similar ao contexto do Projeto de extensão investigado, apesar de estes serem ambientes com maior preocupação em termos de resultados esportivos e de atuarem com atletas considerados de elite. Nos quatro clubes já citados (vela, atletismo, caiaque, golfe e basquetebol), verificou-se que os contextos são formados pelos atletas, de ambos os sexos e diferentes níveis, treinadores, alguns que atuam de forma voluntária e outros remunerados, familiares, gerentes e ex-atletas que continuam colaborando com a instituição. No caso específico do clube de basquetebol espanhol, existe ainda um conselho administrativo composto por 12 familiares (Henriksen et al., 2010; 2011; 2014; Galatti et al., 2016).
Ao abordar o envolvimento familiar, outro fator relevante e que diz respeito às particularidades do Projeto é o acompanhamento dos familiares. Por serem crianças com uma faixa etária muito baixa, a partir de quatro anos de idade, o acompanhamento dos familiares é destacado pelos participantes como imprescindível para que elas participem das atividades ofertadas, assim como a presença dos familiares nas atividades têm levado a maior interação entre as famílias, o que é evidenciado como mais um fator relevante proporcionado pelo Projeto.
Então, essa é uma parte bem delicada que surge no trabalho com crianças, que são os pais, principalmente com crianças mais novinhas ali de 4, 5, 6 anos. O pai tem que estar presente, tem que participar. Até porque a criança se sente segura se o pai está ali. Essas idades mais jovens, a presença da mãe, do pai, dos familiares é um fator de impulsão, é um dos fatores mais importantes na minha opinião para a formação da criança, de ela se sentir segura, se sentir acolhida, se sentir apoiada de ter um suporte, da família, suporte emocional da família é primordial (Ex-monitor William).
Eu acho bem importante e bem legal, porque elas sempre estão presentes. Tem um pai ou uma mãe ou os dois estão juntos. A gente sempre fez amizade com os outros pais, isso tem sido bem legal, porque tem sido bem familiar. Não tem sido somente um esporte aonde o garoto vai lá sozinho. É a família em si que está lá participando e isso é bem legal, tanto para nós quanto para as crianças (Familiar Vagner).
Outro fator positivo que também corrobora com este estudo, diz respeito ao círculo de amizades criado a partir do contexto esportivo, tanto por parte das crianças quanto dos familiares. Nele é formada uma cultura com relação ao basquetebol, em que existe a presença e o envolvimento dos familiares nos treinamentos, fomentando o envolvimento dos pequenos (Silva et al., 2021). Pôde-se acompanhar na fala de alguns participantes que, predominantemente, o acompanhamento e o envolvimento dos familiares eram imprescindíveis para o incentivo e a formação das crianças. No entanto, observou-se alguns relatos que abordaram o excesso de participação e expectativa, devido ao envolvimento exagerado dos familiares, gerando conflitos sobre o real interesse da criança versus o interesse dos familiares.
[...] tem pais que são muito competitivos, tem suas frustrações esportivas anteriores e acabam impondo isso nas crianças. Isso é um problema sério que acontece [...] às vezes ele não pergunta para a própria criança, se é isso que ela quer, se ele quer jogar, se ele quer participar e isso eu vejo como um mal (Ex-monitor William).
[...] no começo eu não gostava do esporte. Eu não me interessava, eu não dava tudo de mim para fazer o negócio. Por isso eu não aprendi tanto e aí o que que acontecia, meus pais falavam que eu tinha que ficar para fazer alguma atividade física, eles insistiam, eu não queria porque eu não gostava, mas eu fui indo, fui gostando e agora não quero sair (Criança Vitor, 10-12 anos).
Tais achados, em torno do envolvimento negativo de alguns familiares na participação esportiva das crianças, na maioria das vezes, acabam gerando situações de estresse para as crianças no momento da prática da modalidade esportiva, sendo evidenciadas algumas situações de comportamentos, em que as crianças precisam enfrentar: a interferência dos pais em momentos inoportunos; o nervosismo por parte deles em momentos competitivos; e a comunicação por meio de gritos e falas prejudiciais ao desenvolvimento infantil. Nesse sentido, os familiares devem buscar respeitar e compreender a vontade da criança com relação à prática esportiva, pois eles têm a responsabilidade de aconselhá-la e incentivá-la de maneira positiva e sem pressioná-la. Caso contrário, ela poderá ficar desestimulada e acabar por abandonar o esporte (Smoll, Cumming e Smith, 2011).
Processo: aulas, festivais e reuniões
No Projeto Baby Basquetebol, foi destacado como parte do processo de formação de crianças por meio do esporte, as aulas, os festivais e as reuniões realizadas entre os sujeitos envolvidos na ação de extensão (Figura 2). Tais ações estão evidenciadas tanto nos documentos quanto foram relatadas pelos participantes (coordenadores, monitora, ex-monitores, familiares e crianças).
As aulas do Projeto aconteciam aos sábados pela manhã e eram divididas em três grupos: quatro a seis anos (11h às 12h); sete a nove anos (9h às 10h e das 10h às 11h); e 10 a 12 anos (8h às 9h). O fator quantidade de aulas foi visto pelo coordenador geral, por alguns ex-monitores e familiares a partir de duas vertentes: suficiente e insuficiente. Para a maioria deles, a quantidade de aulas se apresenta como insuficientes, sendo necessário ofertar as aulas mais que uma vez na semana.
Insuficiente, insuficiente porque, é uma vez por semana, nós sabemos que para um desenvolvimento mais completo em todos os aspectos sociais, cognitivos, motores, devido a uma ascensão semanal ela [...] significativa, porém insuficiente [...] (Coordenador Nino).
Eu acho ideal, uma vez na semana [...] dá tempo para ela participar de outras atividades e, novamente, ela tem mais experiências motoras e consegue aprender outras coisas, fazer vínculos sociais e isso eu acho importantíssimo, que elas tenham tempo para isso. Acredito que a distribuição da carga horária das crianças de quatro a 10 anos é excelente uma vez por semana, não precisa mais do que isso de disposição ao basquete (Ex-monitor William).
Eu gostaria que tivesse pelo menos mais uma vez na semana [...]. Eu vejo que se tivesse algo no meio da semana, faria com que ele evoluísse mais, ele pudesse treinar mais, porque a gente tem a tabela aqui em casa, mas, se não tiver instruindo-o, ele não avança (Familiar Vagner).
Conforme destacado pela monitora, pelos ex-monitores e pelo coordenador técnico do Projeto Baby Basquetebol, o planejamento, colocado em prática nas aulas para atingir objetivos diários, é estruturado, a partir de uma organização da aula em três partes: inicial, principal e final. A parte inicial envolve uma conversa e o desenvolvimento de atividades de aquecimento, realizadas por meio de brincadeiras. Na segunda parte são inseridas as atividades práticas, sendo elas atividades motoras, que visam desenvolver as habilidades básicas e os fundamentos do basquetebol. Posteriormente, ocorrem os pequenos jogos (considerados mais livres), para o divertimento e a interação das crianças. Por fim, ocorre uma conversa final sobre a aula, visando-se saber a opinião dos participantes, juntamente com atividades de relaxamento, realizadas com o intuito de acalmar as crianças e prepará-las para retornarem para casa. Monitora e ex-monitores destacaram ainda que a ênfase na aplicação de brincadeiras ou de atividades para desenvolvimento de fundamentos mais específicos do basquetebol considera o grupo etário presente em cada aula.
Na parte inicial da aula, a gente fazia algumas brincadeiras de modo a fazer as crianças aquecerem. Na parte principal, a gente introduzia alguns fundamentos, algumas habilidades motoras ou habilidades do basquete, como objetivo da aula. [...] eram mais brincadeiras que utilizavam os aspectos do basquete, brincadeiras que utilizavam a bola. Não tinha nada rígido com relação a regras [...] (Ex-monitor William).
Você vai fazendo uma escadinha, vai progredindo um pouco... começa a diminuir um pouco as brincadeiras, mas ainda tem, começa a aumentar um pouco mais a parte do basquete, mas ainda vai tudo meio junto. Quanto mais velho, mais a gente consegue colocar a parte de iniciação esportiva, diminui um pouco as brincadeiras ou deixa as brincadeiras mais complexas pela exigência que eles vão ter... motora e física [...] (Ex-monitor Aziz).
Indo ao encontro da forma com que o Projeto Baby Basquetebol organiza suas aulas, a divisão do treinamento no projeto da UFSC é feita em três partes: inicial (conversa e aquecimento); principal (atividades com brincadeiras e habilidades do basquetebol, jogos reduzidos, jogo); e final (conversa no intuito de obter o feedback dos participantes, as facilidades e dificuldades da aula). Além disso, os conteúdos são definidos a partir de um objetivo para cada sessão (Silva et al., 2021), assim como destacado pelos envolvidos no Projeto Baby Basquetebol. Reforça-se que, de acordo com os participantes, as atividades desenvolvidas nas aulas são estruturadas com propostas lúdicas, com práticas que desenvolvam as habilidades motoras básicas e os aspectos técnico-táticos específicos da modalidade.
[...] porque mesmo a gente trabalhando de forma lúdica, a gente pelo menos tenta mostrar para os alunos o que é o jogo do basquete, o que você tem que fazer e não ficar naquele processo mecânico [...] desenvolver neles as capacidades físicas gerais [...] desenvolver as capacidades motoras, vinculando, de certa forma, com o basquete. Até porque é o trabalho dentro de uma progressão é muito importante, tanto dentro das capacidades físicas, quanto das habilidades motoras do basquete (Monitora Letícia).
Eu via que a [...] com muito jeitinho dizia: ‘olha estão vendo essa linha laranja, quem está fora da linha não está jogando’ delimitando o espaço da quadra. Eu via que ela apresentava as regras do basquete de uma forma muito lúdica para as crianças (Familiar Manoela).
Nesse sentido, e a partir do que o Projeto Baby apresenta a partir das suas atividades desenvolvidas, é importante ressaltar que em distintas instituições (escolas, universidades, clubes), o esporte deve ser estruturado e elaborado com o intuito de ensinar e desenvolver intencionalmente objetivos educacionais (relacionamento interpessoal, valores, comportamentos, aspectos históricos e culturais, discussões sobre o esporte), visando o desenvolvimento integral de seus participantes (Machado et al., 2015). Tais elementos apareceram de forma mais reduzida, mas presente, como será observado posteriormente, nos resultados alcançados pelo ambiente, nos depoimentos dos envolvidos no Projeto Baby Basquetebol, quando comparado às menções ao desenvolvimento motor, tanto no que tange aos objetivos quanto ao processo de ensino ofertado.
Com relação às atividades e aos conteúdos desenvolvidos em programa extensionista voltado ao basquetebol, Silva et al. (2021) mencionam os jogos e brincadeiras, os fundamentos do basquetebol e o ensino de atitudes e valores, utilizando como estratégias a progressão de exercícios, os jogos reduzidos, recreativos e a série de jogos. Pode-se verificar uma semelhança com relação à proposta do Projeto de extensão investigado, tendo em vista que ambos buscam trabalhar, a partir da proposta de jogos e brincadeiras, os fundamentos básicos e o ensino de valores ou habilidades para a vida. Neste contexto, evidencia-se que alguns participantes destacaram ainda o ensino de Life Skills em ações e atividades vivenciadas, visando para além das habilidades motoras básicas e dos fundamentos técnico-táticos do basquetebol, desenvolver valores, comunicação e outras habilidades sociais.
[...] da mesma forma que a gente comemora tudo que ele fazia no basquete, a gente vai comemorar tudo que ele faz de bom nos valores, valores das atitudes do Life Skills, que se fala bastante hoje. [...] essa parte socioeducativa, é o foco que tem que ter nessa idade e é o que vai formar cidadão para o futuro. Se ele vai ser atleta ou não, isso tudo é consequência [...] (Ex-monitor Aziz).
Tinha muita questão da técnica, questão básica e sempre a questão de caráter mesmo. Ela sempre frisava bastante nisso de tentar incentivar as crianças a conversarem [...] vi várias vezes ela tentando incentivar coisas [...] relacionadas ao relacionamento entre as pessoas, tentando passar boas práticas e bons comportamentos [...] (Familiar Pedro).
Na maior parte das aulas, a gente treinava bastante os fundamentos, só que mais para o final, eu não lembro como era o nome do Projeto, que a gente começou a [...] treinar os fundamentos em conjunto com algumas outras coisas [...] Life Skills (Criança Many, 10-12 anos).
O termo Life Skills é definido como habilidades, sejam elas comportamentais, cognitivas, intrapessoais e interpessoais, que favorecem o indivíduo na obtenção do sucesso em diferentes ambientes de sua convivência na escola, no esporte, em casa etc. (Danish et al., 2004). Esse termo da língua inglesa passou por discussões epistemológicas entre seus autores, sugerindo-se a utilização do termo ‘habilidades para a vida’ e traduzindo-se para o português brasileiro deste modo. As habilidades para a vida são definidas ainda como: competências; valores; atitudes; aprendizados (Ciampolini et al., 2020). Além disso, Gould e Carson (2008) apontam que as Life Skills ajudam o indivíduo a obter sucesso não somente no contexto esportivo, pois, para se caracterizar como Life Skills, deve existir a transferência das habilidades do esporte para outros ambientes e situações da vida.
Reforça-se que o Centro de Formação no Treino de Basquetebol está fundamentado de forma mais consistente e sistemática, na proposta do Desenvolvimento Positivo de Jovens, a qual busca o desenvolvimento não somente das habilidades esportivas, como também de habilidades para a vida (Silva et al., 2021). No Projeto, quanto ao ensino de Life Skills, foi verificado que nas aulas isso era implementado a partir de atividades desenvolvidas que pudessem potencializar essas habilidades, bem como essas ações eram percebidas no incentivo dado às crianças para que desenvolvessem e colocassem em prática os valores de comunicação, respeito e bons comportamentos.
Quanto aos eventos realizados para as turmas do Projeto Baby Basquetebol, evidenciou-se alguns festivais comemorativos internos e festivais externos. Segundo os participantes, os festivais priorizam a socialização das crianças com os alunos e familiares das outras turmas e visam a participação em pequenos jogos realizados com o intuito de divertir as crianças. Quanto aos festivais externos, estes buscam a socialização dos participantes com crianças de outros lugares, que são recepcionados na Universidade para a realização de jogos que proporcionam confraternização entre eles. Alguns monitores e crianças destacaram alguns prós e contras dos festivais externos. Dentre alguns dos pontos contra foi citada, especialmente, a atuação dos familiares nesses eventos, destacando-se a atitude negativa (cobrança, pressão da plateia) de alguns, enquanto, que, como ponto a favor, destacou-se principalmente a diversão, o jogo em si e o fato de receberem uma medalha como premiação.
[...] a gente faz um evento bem diferente, tipo um fim de semana vamos fazer uma confraternização aqui, vamos fazer alguns joguinhos entre eles, ou chamar uma escola que também trabalha com essa idade [...]. A gente chamava os pais, pensamos em fazer uma mesa com fruta com comida um bolo e tal. Cada um trazia alguma coisa e quando a gente começava, a gente sentia uma movimentação de todos (Ex-monitor Aziz).
[...] teve uma vez que sinceramente eu me incomodei [...] alguns pais da torcida começaram a usar xingamentos ofensivos com o pessoal do time adversário, em um desses campeonatos pequenos e eu fiquei meio desconfortável com as pessoas gritando [...] (Criança Many, 10-12 anos).
[...] tinha uns jogos e tinha uns que não eram tão jogo assim, mas era legal e no final a gente sempre ganhava medalha então, era bem legal (Criança Helena, 07-09 anos).
Na fala dos participantes, em consonância aos documentos analisados, o Projeto Baby Basquetebol não prioriza a participação e as conquistas em competições esportivas em seu processo de formação, observando-se que os festivais (sem preocupação competitiva e classificatória) realizados se diferem do processo ocorrido em outros ambientes de formação esportiva já investigados, tanto na realidade brasileira (Folle et al., 2017), quanto internacional (Henriksen et al., 2010; 2011; 2014; Larsen et al., 2014; Galatti et al., 2016), os quais priorizam a competição como um de seus principais elementos do processo, dentro dos fatores de sucesso do ambiente.
Os participantes ressaltaram ainda as reuniões que acontecem entre os próprios profissionais do Projeto, mas que ainda é um aspecto a ser melhorado e as reuniões ocorridas junto aos familiares, buscando sempre comunicar sobre as ações pretendidas naquele período. Com os profissionais são realizadas reuniões de planejamento, estabelecimento dos eventos e esclarecimento de dúvidas de forma geral. Quanto a reunião com os familiares, estas servem para definição das ações e do envolvimento destes nas ações (responsabilidades), que são desenvolvidas junto as crianças durante determinado período, como os festivais ou outras ações externas.
São realizadas reuniões frequentemente da direção técnica para os profissionais traçarem as atividades para alcançar o objetivo que se delineou no início do ano, no início da temporada [...]. Então, existe um planejamento e um não digo distante, mas, encontros periódicos para a discussão dessas atividades que estão sendo planejadas, incluídas e incrementadas, entende? (Coordenador Nino).
Acredito que o projeto ali preza muito pelo contato com os pais, ter essa troca com os pais. Então, tudo que a gente quer fazer a gente comunica os pais antes. A gente quer fazer um projeto novo, beleza, então vamos fazer uma reunião com os pais e vamos ver o que eles acham. Se eles não gostam, vamos ver o que a gente pode fazer para melhorar (Monitora Letícia).
Em consonância com as atividades realizadas no Projeto Baby Basquetebol, o projeto Centro de Formação no Treino de Basquetebol da UFSC e o projeto de extensão Basquetebol em Cadeira de Rodas da Universidade Federal de Catalão (UFCAT) realizam reuniões para discutir as ações a serem realizadas nos projetos, tanto com os professores quanto com a equipe gestora (Lima, Guimarães e Arruda, 2020; Silva et al., 2021). Além disso, o clube de basquetebol catarinense e o clube de vela dinamarquês também realizam reuniões tanto com profissionais e atletas quanto com os familiares. Em ambos os contextos, as reuniões acontecem com o intuito de discutir assuntos referentes a questões administrativas e assuntos que dizem respeito aos atletas, como encontros para análises de vídeos, com o intuito de verificar o desempenho da equipe (Henriksen et al., 2010; Folle et al., 2017). Estas últimas não observadas no Projeto Baby Basquetebol, possivelmente, em função de o rendimento esportivo e as competições não serem foco do processo formativo das crianças participantes.
Com relação às reuniões no Projeto Baby Basquetebol, destacou-se na fala dos familiares, a percepção de necessidade de realização de palestras que auxiliassem os familiares na percepção e na adoção de melhores comportamentos durante as aulas ou eventos do Projeto, tendo em vista que esses comportamentos podem auxiliar no melhor desenvolvimento das crianças por meio do esporte.
Eu acho que a contribuição que o Projeto poderia dar, nesse sentido, é de conscientizar os pais, fazer umas palestras e dizer que não é bem assim, que não precisam pressionar os filhos (Familiar Ernesto).
Faz-se necessário reforçar que o acompanhamento dos familiares, durante jogos ou ações esportivas dos filhos, torna-se importante, desde que o apoio recebido seja realizado com o intuito de incentivar sua participação por meio de aplausos e elogios, encorajando a criança durante a prática esportiva e demonstrando seu apoio em qualquer circunstância (Verardi e Marco, 2008). Assim, verifica-se que a preocupação do Projeto Baby Basquetebol, no processo formativo, a partir daquilo que foi observado na análise do processo ofertado em seu ambiente de formação esportiva, é oferecer uma prática orientada para as crianças com o objetivo de desenvolver principalmente as habilidades motoras básicas, sem esquecer as habilidades psicossociais, através de aulas lúdicas, com brincadeiras e realização de eventos para a interação das crianças, em conjunto com familiares, sendo todo esse contexto, organizado e planejado conjuntamente entre profissionais e familiares.
Resultados: conquistas individuais e cultura organizacional
Os resultados apresentados no processo de formação esportiva por meio do Projeto Baby Basquetebol enfatizam elementos das conquistas individuais e da cultura organizacional desse ambiente (Figura 3). Destaca-se assim que não foram observadas, tanto nos documentos analisados quanto nas entrevistas com os participantes, menções às conquistas coletivas obtidas dentro do Projeto. Isto remete a uma verificação de coerência entre o processo ofertado e os resultados esperados e alcançados, haja vista que se almeja o desenvolvimento (motor, cognitivo, social) das crianças por meio do esporte, em detrimento da participação e de conquistas em competições esportivas, nesta faixa etária.
Diferente do Projeto de Extensão aqui destacado, é possível verificar que o Probasket (UFAM) faz menção as conquistas, tanto coletivas quanto individuais dos participantes envolvidos com o projeto, destacando a existência da participação em jogos por parte das equipes de competição. Sendo assim, destaca-se algumas das competições que as equipes participaram e o projeto aparece entre as primeiras colocações: campeonatos infantis; estaduais; torneios e intercâmbios interestaduais (Moura, 2020). Ademais, o clube de basquetebol catarinense destaca que seus resultados em termos de conquistas coletivas retratam suas premiações (títulos) a nível estadual, nacional e internacional (Folle et al., 2017).
Nos relatos dos participantes, as conquistas individuais destacadas como resultados do processo de formação esportiva, por meio do basquetebol, foram a aquisição de competências psicossociais, como: sociabilização; interação; concentração; valores sociais; criação de hábitos saudáveis; cuidados com a saúde; e divertimento. Além disso, frisou-se, como conquistas individuais, o entendimento da lógica do jogo do basquetebol e o desenvolvimento das habilidades motoras básicas e esportivas específicas da modalidade.
[...] sociabilidade, integração e interação com a família e isso acho que é um grande tripé, dizendo que está sendo positivo estar participando do Projeto e estar melhorando alguns aspectos sociais do participante [...] busca-se desenvolver os valores que é justamente esses valores positivos como a criação de responsabilidade, a criação de ter, digamos, a concentração, o desenvolvimento da atenção, o próprio raciocínio (Coordenador Nino).
Assim, os resultados físicos, o desenvolvimento das capacidades físicas de certa forma, o desenvolvimento de todas as habilidades da criança, o envolvimento social, em relação principalmente das Life Skills, que a gente trabalha muito, em questão do desenvolvimento dos valores (Monitora Letícia).
A minha principal expectativa é com esse ganho de saúde. Eu acho que ele se sentir competente também em relação ao corpo dele, de poder dar atenção para o corpo dele, não ficar só trabalhando a nível mental (Familiar Flora).
Eu desejo me divertir, continuar me divertindo, não quero levar a sério nem nada. Eu adoraria ser um jogador de basquete profissional, mas o basquete para mim é mais por me divertir mesmo, não que eu não tenha vontade, mas eu não tenho vontade de ficar treinando e me tornar um super jogador. Eu me divirto bastante jogando basquete (Criança Many, 10-12 anos).
De modo similar a esses resultados, acadêmicos e coordenadores do projeto ‘Atleta do Futuro’ da Universidade de Passo Fundo (UPF) perceberam que alguns alunos novos que participavam do projeto tinham dificuldades de integração, sociabilização e respeito às normas. Entretanto, ao longo da participação das crianças no projeto, observaram que individualmente, adquiriram um crescimento e um desenvolvimento, tanto nas competências que antes apresentavam dificuldades, quanto, em questão de caráter e personalidade (Bona et al., 2016). Assim, competências adquiridas, enquanto conquistas individuais destacadas no projeto ‘Atleta do Futuro’, estão em conformidade com resultados de conquistas individuais obtidos no Projeto Baby Basquetebol. Além disso, foram destacadas, como resultantes do envolvimento de crianças em projeto de basquete universitário e também em contexto de clube esportivo, o desenvolvimento de valores e atitudes, de competências psicológicas e psicossociais, como dedicação, comprometimento, promoção de estilo de vida ativo e saudável, relações interpessoais e formação de amizades (Folle et al., 2017; Silva et al., 2021).
Tais resultados, deste e dos demais estudos retratados, reforçam que o esporte educativo deve colaborar com o desenvolvimento das crianças, auxiliando na conquista de elementos individuais como: fortalecimento da autoestima; senso de responsabilidade; autonomia; independência; autoconfiança; autocontrole; possibilidade do desenvolvimento de habilidades físicas; estabelecimento de vínculos e amizades; companheirismo; e reforço social (Sanches e Rubio, 2011 González, Silva e Machado (2018). Além destes aspectos positivos, Rodrigues e Fernandes (2018) complementam a relevância de ganhos na socialização, no desenvolvimento afetivo, intelectual e social. Contudo, ampliando os resultados apontados, estudos têm destacado as premiações individuais como conquistas individuais da cultura organizacional de ambientes esportivos. Foi evidenciado enquanto conquistas individuais nos contextos de extensão universitária (Moura, 2020) e de clube esportivo (Folle et al., 2017), o recebimento de premiações por parte dos atletas, sendo estes prêmios individuais como melhor atleta ou pontuador e atleta destaque.
O alcance do sucesso individual, sendo, nesse caso, a aquisição de competências psicossociais e de habilidades motoras, retrata muito sobre o contexto o qual o indivíduo está inserido. Os resultados em termos de cultura organizacional envolvem também os artefatos culturais (costumes e tradições, manifestações culturais e mitos contados no ambiente), os valores defendidos, (princípios, normas sociais e padrões mostrados ao mundo) e os pressupostos básicos (subjacentes a ação) (Henriksen, 2010). No que tange ao Projeto Baby Basquetebol, coordenadores, monitora e ex-monitores enfatizaram como artefatos culturais o fato de serem considerados pioneiros no ensino do basquetebol para crianças de idades inferiores, na realidade brasileira. Com relação aos artefatos culturais, compreendidos como manifestações físicas e culturais, os participantes ressaltaram a importância da cultura estabelecida no Projeto de Extensão de, por meio da busca de patrocínios, conseguirem doação de uniformes e tênis para as crianças. Neste caso, consideram como parte da cultura organizacional a identificação das crianças pertencentes àquele ambiente, através do uso dos uniformes do Projeto.
[...] como era algo novo, inédito no Brasil, pioneiro na América do Sul [...] (Coordenador Gipe).
[...], mas como ele tem o uniforme que é doado para ele, é exigido também que ele venha com esse uniforme para a prática da atividade. Então, em suma, é disponibilizado para o participante uma camiseta identificada do próprio projeto que é doada [...] (Coordenador Nino).
Tem a questão dos tênis para os mais carentes que a gente consegue, a gente recolhe de quem quer doar os tênis, quem quer doar e aí a gente passa para os atletas mais carentes para conseguirem fazer a aula (Monitora Letícia).
A preocupação em oferecer apoio à comunidade por meio de doações é o resultado destacado no projeto Biblioteca Comunitária da Universidade Federal da Bahia (UFBA), a qual realiza doações de cestas básicas, itens de higiene, alimentos e vestimentas para a comunidade carente participante do projeto de extensão (Santos, Moreira e Santana, 2020). No entanto, ao mesmo tempo, esse projeto se distancia, com referência a suas tradições, do Projeto Baby Basquetebol, pois, enquanto o projeto da UFBA realiza essas ações de forma isolada, o Baby, já têm essa ação enraizada na sua cultura, exercendo esse papel de apoio para com a comunidade em diferentes momentos e ao longo dos anos.
Quanto aos artefatos culturais evidenciados, é notável que esses achados se diferem dos encontrados em contextos de clubes esportivos. Na realidade de clube brasileiro de basquete, destacou-se como elemento da sua cultura, o fato de ser um ‘formador de atletas’, no qual profissionais e atletas enfatizam orgulho deste artefato e, mesmo que as atletas que deixaram o clube para atuar em outras equipes, reconheciam a importância e o potencial formativo do contexto de onde vieram (Folle et al., 2017), enquanto clube internacional de caiaque revelou que os atletas, formados no clube e convocados para as seleções estaduais, acabavam se tornando um exemplo para atletas que estavam almejando um crescimento no esporte, servindo de incentivo para os mais jovens (Henriksen et al., 2011).
Os valores da cultura organizacional compreendem princípios e normais sociais mostrados à comunidade (Henriksen, 2010). Deste modo, as entrevistas com os participantes do Projeto Baby Basquetebol evidenciaram que é importante para seus membros o ensino de valores sociais (responsabilidade, atenção), a formação social (comprometimento, interação com outros participantes, professores e monitores) e o alcance dos princípios (ganho pessoal e engajamento no esporte) esperados pelo Projeto e um ambiente de prática esportiva sem pressão. O clube de basquetebol investigado por Folle et al. (2017), de modo similar, expõe que os valores defendidos por eles diziam respeito à formação do cidadão e a valorização de posturas éticas.
Os professores juntamente com os pais conseguem dar uma educação para essas crianças, porque, além do lado esportivo [...] se deseja criar bons cidadãos, pessoas que tenham discernimento [...] (Coordenador Nino).
O projeto também criou várias linhas de conduta, de preocupação. De que adianta a gente se preocupar com a parte técnica [...] eles serem mal-educados, falarem palavrão, brigarem entre eles, tirarem nota baixa, quando chegarem em casa, baterem nos irmãos, xingarem a mãe... (Coordenador Gipe).
Com referência às premissas básicas, referentes aos fatores subjacentes a razão, ou seja, aquilo que realmente é feito no ambiente (Henriksen, 2010), destacou-se na fala dos participantes a formação de atletas, a formação de professores e treinadores, assim como o interesse em fomentar o gosto e o conhecimento do esporte, em especial, do basquetebol.
A partir do momento que ele começa a vivenciar as atividades, a estar ali todo sábado, estar participando, começa a gostar e começa a viver o basquetebol, aí ele vai para casa, ele quer ter a bolinha, ele já quer estar brincando por mais vezes o basquete ou até mesmo mais atividades físicas, do que talvez somente o computador... eu vejo muito mais eles praticando a atividade física pela interação, pelo gosto que começam a demonstrar pela modalidade (Coordenador Nino).
[...] além da formação de atletas, o projeto tinha o intuito de formação profissional, a gente queria formar treinadores. Eu acredito que a gente conseguiu (Coordenador Gipe)
O gosto em participar de atividades da modalidade foi destacado por um contexto de projeto de extensão, voltado ao basquetebol, e pelos clubes de basquete brasileiro e espanhol, os quais afirmaram contribuir com a motivação dos alunos para a prática da modalidade, procurando despertar na criança a vontade de permanecer no esporte, além de promover o interesse pela prática em outros contextos, como praças, parques e, até mesmo, em casa (Galatti et al., 2016; Folle et al., 2017; Silva et al., 2021). Tais premissas, observadas em outros ambientes de prática do basquetebol, corroboram os achados encontrados na pesquisa, em que os sujeitos envolvidos destacaram que fomentar motivação e interesse desde o seu primeiro contato com o basquete é premissa básica defendida no ambiente.
Conclusões
A análise dos fatores de sucesso do ambiente de um projeto de extensão universitário brasileiro, para a formação de crianças revelou que o contexto apresenta elementos que favorecem o processo de formação destas por meio do basquete e retrata que o ambiente integra as pré-condições, o processo e os resultados, permitindo coerência em o que oferta e alcança. A Universidade se destaca como principal fonte financiadora, seguida do convênio público, dos patrocínios privados e de ações internas para arrecadação de verbas. As pré-condições materiais são tanto satisfatórias (disponibilidade de diversos materiais e equipamentos) quanto insatisfatórias (estrutura do ginásio). Os coordenadores geral e técnico, a professora voluntária, a monitora, os estagiários do curso de Educação Física, os familiares e as crianças são os recursos humanos do Projeto.
As aulas, os festivais e as reuniões constituem as atividades do processo de formação esportiva. Neste caso, as aulas, em questão de tempo, são consideradas como suficientes por alguns participantes e como insuficientes por outros, mostrando o interesse de se ter aula mais do que uma hora por semana. Os eventos internos e externos representam os festivais que objetivam a socialização entre crianças e familiares.
O Projeto Baby Basquetebol não revelou conquistas coletivas, ao passo que conquistas individuais, como desenvolvimento de competências psicossociais (sociabilização, interação, concentração; valores sociais), juntamente com a criação de hábitos saudáveis, cuidado com a saúde e divertimento foram enfatizadas. Os artefatos da cultura organizacional são representados pelas doações de tênis e vestimentas para as crianças, além da identificação destas no Projeto, por meio do uso dos uniformes com a logo marca, enquanto os valores expressados envolvem comprometimento, interação social e alcance de princípios que permitam engajamento no esporte e prática esportiva sem pressão. Quanto as premissas básicas, destacaram-se o interesse na formação de crianças, por meio do basquete, o fomento ao gosto e ao conhecimento do basquete, além da formação profissional de professores e treinadores.
Diante das implicações práticas, reforça-se a importância de incorporar novas propostas estruturais e procedimentais, a partir da opinião de crianças e familiares, sugerindo também a adoção de uma avaliação semestral e/ou anual do Projeto. Recomenda-se também o aumento de aulas que são oferecidas a crianças e da realização de atividades que possam esclarecer questões relacionadas com o comportamento de familiares durante a prática esportiva. O estudo apresentou como limitação a indagação o não aprofundando da análise das atividades ofertadas e das características das crianças participantes do Projeto e seus familiares. Sugere-se novas investigações sobre o processo de formação esportiva, com a ampliação do olhar para as atividades e características dos envolvidos, assim como de outros contextos extensionistas voltados à prática esportiva.
Roles de Colaboracion
Mônica Cristina Flach
Escritura - revisión y Edición, Investigación
Juliana de Paula Figueiredo
Escritura - revisión y Edición, Investigación
Alexandra Folle
Escritura - revisión y Edición, Investigación
Agradecimentos
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.
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Recepción: 08 Diciembre 2023
Aprobación: 24 Junio 2024
Publicación: 01 Julio 2024