EFYC Educación Física y Ciencia, vol. 26, nº 3, e309, julio-septiembre 2024. ISSN 2314-2561
Universidad Nacional de La Plata
Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación
Departamento de Educación Física

Artículos

Silêncios e estouros, trocação e chão: uma etnografia na academia de MMA

Flávio Py Mariante Neto

Departamento de Educação Física, Universidade Luterana do Brasil, Brasil
Daniel Giordani Vasques

Escola de Educação Física, Fisioterapia e Dança, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil
Marco Paulo Stigger

Escola de Educação Física, Fisioterapia e Dança, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil
Cita sugerida: Neto, F. P. M, Vasques, D. G. y Stigger, M. P. (2024). Silêncios e estouros, trocação e chão: uma etnografia na academia de MMA. Educación Física y Ciencia, 26(3), e309. https://doi.org/10.24215/23142561e309

Resumo: Este artigo é resultante de uma pesquisa de doutorado sobre a configuração esportiva das artes marciais mistas (MMA) na realidade brasileira. Nos aproximamos da proposta desenvolvida por Wacquant que, ao imergir como lutador de uma academia de boxe, buscou descrever os processos de significação das rotinas de treino dos lutadores. O objetivo desse estudo é descrever as rotinas de treinamento em uma academia de MMA. Para tal, realizou-se uma etnografia em uma academia de MMA de setembro de 2014 e outubro de 2015, imergindo como participante e lutador naquele grupo cultural. Apresentamos a rotina de treinos, as técnicas e os significados produzidos pelos lutadores no cotidiano de uma academia de MMA. A academia é um espaço da pedagogia da prática, onde os aprendizados são inculcados a partir da vivência cotidiana. Ao mesmo tempo que é uma modalidade individual, aprende-se a luta MMA na ação e de forma coletiva.

Palavras-chave: MMA, Artes Marciais, Luta, Academia, Etnografia, Significados.

Silences and outbursts, sparring and ground: an ethnographic study in the MMA gym

Abstract: This article is the result of doctoral research on the sports configuration of mixed martial arts (MMA) in Brazil. This study builds on the approach developed by Wacquant who, being a fighter in a boxing gym, sought to describe the processes of meaning of the fighters’ training routines. Similarly, this study seeks to describe the training routines in an MMA gym through an ethnographic study conducted between September 2014 and October 2015, with the researcher participating as both a member and a fighter within that cultural group. The training routine, techniques and meanings produced by fighters in the daily life of an MMA gym are presented. The gym is regarded as a space for the pedagogy of practice, where learning is instilled through daily experience. Although MMA is an individual sport, it is learned through action and collectively.

Keywords: MMA, Martial Arts, Fighting, Gym, Ethnography, Meanings.

Silencios y explosiones, golpes y suelo: una etnografía en el gimnasio de MMA

Resumen: Este artículo es el resultado de una investigación doctoral sobre la configuración deportiva de las artes marciales mixtas (MMA) en la realidad brasileña. Nos acercamos a la propuesta desarrollada por Wacquant quien, al sumergirse como luchador en un gimnasio de boxeo, buscó describir los procesos de significado en las rutinas de entrenamiento de los luchadores. El objetivo de este estudio es describir las rutinas de entrenamiento en un gimnasio de MMA. Para ello se realizó una etnografía en un gimnasio de MMA en septiembre de 2014 y octubre de 2015, con una inmersión como participante y luchador en ese grupo cultural. Presentamos la rutina de entrenamiento, técnicas y significados que producen los luchadores en el día a día de un gimnasio de MMA. El gimnasio es un espacio para la pedagogía de la práctica, donde se inculca el aprendizaje desde la experiencia cotidiana. Si bien es un deporte individual, las peleas de MMA se aprenden a través de la acción y de manera colectiva.

Palabras clave: MMA, Artes Marciales, Luchas, Gimnasio, Etnografía, Significados.

Introdução

Este artigo é resultante de uma pesquisa de doutorado sobre a configuração esportiva das artes marciais mistas (MMA) na realidade brasileira (Mariante Neto, 2016). Após a publicação da tese, o autor e o Grupo de Pesquisa se dedicaram a analisar com mais profundidade e complexidade alguns elementos que haviam sido elencados anteriormente. Uma dessas análises tratou da análise do conceito de esporte a partir das lógicas de espetáculo e de “dar show” nessa modalidade (Mariante Neto et al., 2021a); outra buscou analisar os processos de humanização do lutador de MMA a partir de um programa televisivo (Mariante Neto et al., 2021b); enquanto que outro texto buscou entender os processos de aprendizagem das etiquetas para lutar, especialmente aquelas relacionadas às violências (Mariante Neto et al., 2021c).

A popularização do MMA no Brasil, principalmente a partir do fim dos anos 2000, mobilizou uma série de discussões e produções no mundo acadêmico brasileiro. Pesquisadores advindos de diferentes campos da Ciências Humanas começaram a investir na pesquisa sobre esse fenômeno, na época, em ascensão. Uma das estratégias adotadas foi o emprego das etnografias urbanas para o entendimento das lógicas culturais de grupos praticantes de MMA.

No escopo das pesquisas sobre MMA, Nunes (2004) realizou uma etnografia em três academias e observou o caráter performático do uso do corpo nas competições. Thomazini et al. (2008) realizaram uma etnografia, também em três academias, e observaram a forja identitária dos lutadores vinculados ao controle de si e à racionalização da dor em um universo predominantemente masculino. Silveira (2011) buscou identificar como a subcultura pertencente ao MMA influencia na formação da identidade de seus integrantes, e verificou que ser aceito pelo grupo, demonstrar habilidades específicas e fazer bom uso da luta são requisitos básicos para conquistar posições dentro do grupo. Jardim (2018), por sua vez, estudou lutadoras mulheres de MMA, problematizando gênero e analisando o crescimento da modalidade de luta de mulheres. Camilo e Spink (2019) seguiram o cotidiano de um atleta e, com base na teoria ator-rede, sugerem que o atleta é múltiplo, produto das práticas nas quais está envolvido. Gaige e Krischke-Leitão (2022) analisaram, em pesquisa etnográfica, o uso das mídias digitais por atores sociais do MMA do Sul do Brasil e ressaltaram a importância das lives durante a pandemia de Covid-19.

Em que pesem os diferentes enfoques e estratégias etnográficas, é possível entender – na esteira de uma antropologia urbana (Magnani, 2002) e na perspectiva de olhar para as produções de significados em grupos esportivos (Stigger, 2002) – que há um compósito de pesquisas que buscaram entender elementos culturais de determinados grupos que vivenciam e produzem significados a partir do MMA. No caso da pesquisa que viemos apresentar, nos aproximamos da proposta desenvolvida por Wacquant (2002) que, ao imergir como lutador de uma academia de boxe de Chicago, buscou, entre outros elementos, descrever os processos de significação das rotinas de treino dos lutadores. Aqui, no nosso caso, perguntamos: Como se dão as rotinas de treinamento em uma academia de MMA? Que significados são produzidos nessas rotinas? Assim, o objetivo desse estudo é descrever as rotinas de treinamento em uma academia de MMA.

Procedimentos metodológicos

Para a condução deste estudo, optou-se pela abordagem etnográfica de pesquisa, voltada à compreensão dos símbolos e significados que moldam as culturas. Nesse sentido, a etnografia representa um esforço para decifrar e interpretar os elementos simbólicos, como ações, gestos e discursos, que permitem a organização e identificação dos indivíduos como membros de uma sociedade ou grupo específico (Geertz, 2008).

A pesquisa de campo foi realizada pelo primeiro autor, que já possuía familiaridade com o cenário das lutas. Dessa forma, escolheu-se uma academia de MMA frequentada por atletas que já tinham contato com o pesquisador antes do início do estudo, proporcionando um acesso sistemático aos treinos, condição essencial para a compreensão das questões de pesquisa.

No período entre setembro de 2014 e outubro de 2015, o pesquisador acompanhou treinos, almoços e eventos nos quais alguns atletas participaram. Os treinos envolviam profissionais com, ao menos, cinco anos de experiência em MMA ou em modalidades como boxe, jiu-jitsu e muay thai.

A abordagem da pesquisa de campo seguiu o método de observação participante, sendo possível graças à aceitação do pesquisador nos treinos e à atribuição de funções na rotina dos atletas (Oliveira, 1996). Em vários momentos, o pesquisador contribuiu na preparação para as lutas, desempenhando o papel de “parceiro de treino” em sessões de “trocação” com os lutadores, principalmente na área de boxe, sua especialidade nas lutas. Em outras ocasiões, participou como "puxador de manopla" para os atletas ou como "sparring".

As percepções e reflexões resultantes da experiência etnográfica foram registradas nos diários de campo, ferramenta crucial na prática da etnografia (Winkin, 1998). A partir das observações e construção dos diários, foram selecionados oito indivíduos para entrevistas semiestruturadas. Esses informantes tinham pelo menos cinco lutas de MMA, entre combates amadores e profissionais, e dois deles, além de atuarem como lutadores profissionais, também eram "proprietários de equipe", que treinavam na academia onde a etnografia foi conduzida, mas também desempenhavam o papel de treinadores.

Este estudo aderiu aos procedimentos éticos propostos por Fonseca (2006) e pelo Guia para Integridade em Pesquisa Científica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2020). A relação entre pesquisador e interlocutores na coleta de dados empíricos envolveu esclarecimentos, resolução de dúvidas e cuidados éticos. Os interlocutores foram convidados a participar da pesquisa com a garantia de anonimato, uma medida adotada para preservar a privacidade dos colaboradores, conforme as orientações de Fonseca (2007).

Aquecimento, sombra, silêncio: habitus e aprendizagem coletiva

A disposição dos equipamentos na academia faz pensar sobre a pluralidade do treinamento do atleta de MMA. O espaço fornece condições de desenvolvimento de diversas técnicas. Assim, no mesmo ambiente encontram-se sacos de pancada, tatames, grades e aparadores de chute. Há uma diversidade de técnicas oriundas de variadas artes marciais que compõem o treinamento.

Essa diversidade se materializa, também, no comportamento dos praticantes, que chegam à academia com bolsas cheias de equipamentos necessários para a realização das atividades. Dentre esses itens, veem-se luvas, protetores bucais, quimonos, camisetas (geralmente com logomarcas de patrocinadores), suplementos alimentares e bandagens para proteção das mãos. Os lutadores de MMA devem possuir um repertório vasto de movimentos e combinações que darão condições de combate.

A especificidade das artes marciais envolvidas no treinamento de MMA requer alguns equipamentos que tradicionalmente são utilizados nos diferentes esportes de combate. Para o treino da “luta em pé”, ou “trocação”, os equipamentos são oriundos, principalmente, do boxe e do muay thai, como as manoplas e os pads. Discorro sobre esses artefatos na sequência do trabalho. Antes, apresento um elemento importante nessa dinâmica: o aquecimento, que consiste na primeira parte do treino. O aquecimento, principalmente nos dias de trocação, é uma maneira de aprimorar as sequências que serão utilizadas nos trabalhos mais específicos. O que chamou a atenção é a concentração que esses atletas realizam o “trabalho”.1

É um momento de interiorização, uma maneira de incorporar os movimentos. Elias (1997) define habitus como a “segunda natureza” ou um “saber social incorporado”. O aquecimento é o momento do início dessa incorporação. Não há mais a dicotomia luta/indivíduo. Os corpos se moldam aos movimentos. Ao mesmo tempo em que os pensamentos acalmam, o corpo vai entrando, aos poucos, em um estado que é uma mistura de relaxamento e tensão, onde o importante são as técnicas, e tudo que está fora do ambiente de luta silencia.

Participei de muitos desses momentos durante a observação, e também durante os anos em que pratiquei boxe. Se em um primeiro olhar, o aquecimento parece apenas uma preparação para a parte principal da aula, na realidade vivida pelos atletas ele é um momento de conexão entre o corpo e o treino. Em um dia em que participei de um treino de boxe com atletas profissionais, fiz o seguinte relato:

Chego e fico em um canto me aquecendo, fazendo um trabalho de “sombra” que consiste em realizar algumas sequências de golpes no ar sem a presença de um oponente. Na sala, também estão Mamute, atleta profissional de MMA, Yuri Maia, também profissional. [...] Mamute usa um fone de ouvido e faz seu trabalho de sombra em silêncio. Yuri também trabalha na frente do espelho, em silêncio. O silêncio dá o tom da aula por enquanto. Não há comunicação entre os lutadores, o que pode parecer em um primeiro olhar que não há muita simpatia entre eles. Mas o universo das lutas é assim. Apesar de cada um ter sua equipe e lutar por uma “bandeira”, o MMA, o boxe, o jiu-jitsu ou qualquer outra modalidade de luta são esportes individuais. Principalmente nesse primeiro momento de aquecimento, mas também durante todo o treinamento, há uma espécie de processo de interiorização. Cada um vai adaptando os gestos, as técnicas e os movimentos para o seu jogo de acordo com seu corpo, os tipos de habilidades que foram sendo forjadas ao longo dos anos e sua experiência. É um momento silencioso, mas que diz muita coisa. Uma preparação para o que virá e uma tentativa de assimilar mental e corporalmente, e refinar os movimentos que foram aprendidos. Esse silêncio, portanto, nada tem a ver com uma rivalidade velada entre os lutadores, é um processo de conscientização e autoconhecimento, na medida em que se interioriza aquilo que vem sendo aprendido por tanto tempo. (Diário de campo, 06 nov. 2014)

Muitas vezes utiliza-se o termo “sombra” nessa parte do treino. O nome se dá porque não há um adversário para interagir, é como se o atleta lutasse com a sua própria sombra. Apesar de as técnicas serem as mesmas, geralmente socos e chutes que completam o limitado rol de golpes de “trocação”, os movimentos diferem entre os atletas. Cada um parece adaptar os jabs, diretos e chutes baixos para o seu jogo, ou seja, para a sua maneira de lutar. O tipo físico, o histórico nas lutas e o tempo de treino são fatores que reorientam as técnicas na medida em que são incorporadas pelos lutadores.

Consoante a isso, o silêncio também dá o tom desse momento. É uma atividade quase soturna. Ainda não se ouvem os “estouros” das manoplas, as orientações de técnicas ou o “barulho seco” dos golpes que “castigam” os sacos de pancada. É um momento calmo, quieto, onde essa incorporação reservada prepara a equipe para a fatigante rotina por vir. Não há orientações do treinador; é momento de introspecção.

O ‘habitus lutador’ fica na fronteira entre natureza e cultura a partir de uma pedagogia implícita, quando o sujeito incorpora determinadas disposições para o agir. O tempo da inculcação é pleno, impositivo, marca o corpo e modela-o. Habitua o organismo a alternar esforço intenso e recuperação rápida segundo o andamento de seu jogo, até habituá-lo a essa necessidade (Wacquant, 2002). Só a partir do momento em que o habitus lutador sabe reconhecer os estímulos e os apelos da academia que a aprendizagem se torna plena. Cada gesto, cada posição do corpo do lutador possui uma infinidade de propriedades específicas, ínfimas e invisíveis para aquele que não tem as categorias de percepção e de apreciação apropriadas.

A transmissão ocorre de modo gestual, visual e mimético, por meio de uma manipulação regulada do corpo, que somatiza o saber coletivamente detido e exibido pelos membros a cada patamar da hierarquia tácita que o atravessa. O saber é transmitido por mimetismo e contra mimetismo, olhando como os outros fazem, observando gestos, espiando suas respostas às instruções, copiando as rotinas, imitando-as mais ou menos conscientemente, sem intervenção do treinador.

Apesar de os dados da pesquisa concordarem com a ideia de “aprendizagem coletiva” apresentada por Wacquant (2002), quero chamar a atenção nessa passagem que, apesar dessa coletividade envolvida na pedagogia das lutas, cada indivíduo incorpora os movimentos de maneira diferente. A individualidade dessa incorporação se dá a partir do seu histórico nas lutas, seu tipo físico e suas experiências corporais. Portanto, se a aprendizagem é coletiva, a incorporação é individual.

Similarmente ao boxe (Wacquant, 2002), o MMA vive esse paradoxo de um esporte ultra individual cuja aprendizagem é coletiva, pois 1) é a maneira coordenada no interior do grupo que cria a sincronização dos exercícios; 2) faz de cada participante um modelo visual dos outros; e 3) os lutadores servem como auxiliares que se revezam, reforçam, complementam a ação do treinador, assim, cada um colabora na formação dos outros. Assim como Wacquant (2002), a iniciação por essa pedagogia implícita foi uma fonte de socialização bem mais poderosa que a pedagogia da instrução.

Estouros nas manoplas, pads e uma pedagogia prática

Após o aquecimento, o silêncio é quebrado pelo “estouro das manoplas”. Manoplas são aparadores de socos que o treinador utiliza para aprimorar as técnicas de soco. Essa atividade é tradicional no boxe e foi incorporada ao treinamento de MMA devido a sua eficiência em acurar os movimentos. A tradição desse treinamento é invocada por Wacquant (2002). Ao dedicar um tópico do livro para esse tema, intitulado “O trabalho nos pads”,2 ele descreve a importância da referida técnica para os boxeadores. Também é evocada a exaustão advinda desse tipo de treinamento.

Em um estado de semicoma, continuo a bater e a soprar em cadência, lançando um golpe a cada baforada de ar expulso. Tenho a impressão de ter subido em um maquinismo do qual sou, ao mesmo tempo, motor e personagem. Arrasto-me para conseguir bater, colocar meus punhos no lugar certo, atinar com o objetivo, bater. Ainda um esforço, paf, paf, bam, pum-pum. Time out. Finalmente acabou. Estou à beira da asfixia, paralisado de exaustão, totalmente esvaziado, em seis minutos. Tenho impressão que vou cuspir os pulmões e que vou desmaiar. (WACQUANT, 2002, p. 85)

Na passagem, fica clara a inexperiência do autor no mundo do boxe. A exaustão é típica de um iniciante que ainda não está acostumado a “cadenciar o jogo”, ou seja, economizar energia para não atingir a fadiga com tanta facilidade. Entretanto, se por um lado Wacquant foi um “faixa branca”3 na arte do boxe, por outro é um “mestre” na arte de escrever. Poucos autores no mundo das lutas conseguem colocar o leitor com tanta eficiência na “área de luta”. Por isso, evocamos frequentemente seu texto. O elemento a incorporar à discussão é o “estouro das manoplas”.

Quando o treinador “puxa manopla” para o seu aluno, conforme a intensidade e a técnica dimensionada pelo atleta, o barulho, ou estalo, que a mão do lutador provoca quando encontra a manopla é diferente. Quanto mais apurada a técnica, maior é o estouro causado. Isso pouco tem a ver com a força física do indivíduo. Muitas vezes observei atletas muito fortes, com mais de 100kg, que não conseguiam produzir o mesmo barulho que indivíduos menores, porém mais técnicos.

Sílvio pede para pegarmos manoplas para trabalhar em duplas. Faço dupla com Tiago, Cláudia com Nestor, um aluno iniciante de boxe, e Rodrigo trabalha com Tobias. A primeira sequência é bem simples: jab-direto-esquiva-jab-direto. Apesar de estar fazendo dupla com Tiago, presto mais atenção no trabalho de Rodrigo e Tobias, pois, como não se conhecem muito, acho que podem surgir questões interessantes. Rodrigo segura as manoplas para Tobias primeiro. Tobias bate com pouca força e velocidade no começo, talvez reflexo de seu tempo parado. As sequências saem sem o ritmo que é percebido em quem está bem treinado. Os estouros na manopla, observados nos treinamentos daqueles que estão mais “em forma” não se reproduzem na atividade do atleta. Depois de dois minutos, é hora de trocar as manoplas. É a vez de Rodrigo bater. A dinâmica que se estabelece é bem diferente. Diferente de Tobias, Rodrigo treina todos os dias, seus movimentos são mais automatizados, mais rítmicos e as sequências são executadas com mais técnica e mais potência. Os estouros já são melhor observados.
Olho para Cláudia, que faz as sequências com Tiago e noto também uma baixa no rendimento da atleta. Lembro que Cláudia está há aproximadamente um mês sem treinar. A segunda sequência é mais complicada: jab-direto-esquiva-cruzado de direita-cruzado de esquerda-direto. Tobias tem mais dificuldade de execução do que na primeira sequência. Seus movimentos são mais pesados, mas sem tanta força. Ele quase não consegue chegar até o fim do round. O cronômetro dá o sinal de dois minutos e mudamos as duplas de novo. Como aconteceu na primeira rodada, Rodrigo dispara seus golpes com muito mais intensidade do que Tobias. Suas pancadas rápidas fazem um estouro certeiro nos pads. (Diário de campo, 20 jun. 2015)

Rodrigo foi um personagem importante na pesquisa; um atleta que se destacava nos treinos, principalmente, de trocação. Ele é um excelente boxeador, ganhou vários títulos em uma carreira de 11 lutas e apenas uma derrota. O lutador pesa 61kg e bate como se tivesse o dobro do peso. Sua força parece descomunal e os sparrings com ele, e minhas dores de cabeça posteriores, confirmaram a hipótese. Sempre gostava de ver seu treinamento. Ele teve muita dificuldade para incorporar outras técnicas (principalmente, “de chão”) tão necessárias para as lutas de MMA, mas a fluidez com que seu corpo reproduzia os movimentos da nobre arte (boxe) tornava-o um espetáculo sui generis.

Chamou a atenção a leveza dentro da agressividade com que Rodrigo faz o exercício. Ao mesmo tempo em que a velocidade e os estouros denotam uma agressividade e intensidade difíceis de copiar, seu corpo demonstra uma facilidade que parece que aquilo faz parte do atleta. As horas na frente do saco de pancada repetindo jabs, diretos e cruzados parecem fazer com que aqueles movimentos se tornem dele.

A incorporação é visível e a dicotomia esporte/atleta parece desaparecer, formando uma unidade. Rodrigo é a luta assim como a luta é Rodrigo, na sua forma mais incorporada, não-pensada e repetida ao extremo. Segundo Wacquant (2002), “o boxe é uma prática essencialmente corporal e pouco codificada, cuja lógica só pode ser aprendida em ação, corresponde um modo de inculcar implícito, prático e coletivo” (p. 120). O aprendizado do boxe acontece na prática, na academia em que os sujeitos colocam seu corpo para o trabalho. É o momento da incorporação gestual das técnicas pugilísticas. Rodrigo é um exemplo disso. Suas horas dedicadas ao trabalho no saco, às manoplas e à sombra fazem com que seu corpo seja forjado na luta. A pedagogia é prática, sem muitas orientações. O corpo se transforma na medida em que trabalha.

A transmissão ocorre de modo gestual, visual e mimético, por meio de uma manipulação regulada do corpo, que somatiza o saber coletivamente detido e exibido pelos membros a cada patamar da hierarquia tácita que o atravessa. O saber é transmitido por mimetismo e contra mimetismo, olhando como os outros fazem, observando gestos, espiando suas respostas às instruções, copiando as rotinas, imitando-as mais ou menos conscientemente, sem a intervenção do treinador. Não é uma pedagogia pensada e organizada, os porquês dos gestos são raros. Os conselhos são descrições dos movimentos, na forma de observações parciais e negativas.

Além das manoplas, nos treinamentos de luta “em pé” também são utilizados pads – estruturas retangulares, maiores que as manoplas, que são presas ao braço do treinador para apurar as técnicas de chutes e socos, oriundos preponderantemente do muay thai. Assim, low kicks (chutes baixos), high kicks (altos), joelhadas, cotoveladas, além das técnicas do boxe tradicional podem ser executadas nesse equipamento.

O trabalho nos pads também auxilia a identificação de dificuldades que direcionam o treinamento. Apesar de o atleta de MMA precisar variar as técnicas, alguns atletas são especialistas, ou seja, têm uma “arte-mãe”, uma modalidade em que “se garantem”. Mas é imprescindível que sejam treinadas outras técnicas.

O atleta, apesar de novo, é muito promissor. E isso pode ser observado no seu trabalho nos pads. Antônio dá bons golpes – chutes e socos – enquanto Sílvio segura as manoplas. Seus chutes são mais potentes que seus socos, o que pode ser explicado pela sua “modalidade-mãe”. Antônio treina muay thai há muito tempo e isso lhe dá uma habilidade interessante no uso dos chutes. Os estouros nos pads são latentes, enquanto seus socos ainda precisam de um aprimoramento técnico mais acentuado. Por isso, após fazer três rounds nas manoplas com chutes e socos, Sílvio diz para o atleta: “Vamos ajustar o boxe agora. Só soco.” (Diário de campo, 12 dez. 2014)

Nessa passagem, foi identificada uma deficiência técnica. O atleta de muay thai, geralmente, tem menos acuidade nas técnicas de boxe e uma eficiência bem maior nos chutes. Quando isso foi identificado, o treinador solicitou a troca do equipamento para que o treino fosse orientado de forma a melhorar os socos. Esse cuidado com os pontos fracos foi identificado durante toda a pesquisa. “Trocadores”, como são chamados os atletas que lutam mais “em pé”, foram sempre estimulados a “treinar chão” para não incorrer no erro de não estar preparado para a “troca de jogo” durante a luta.

A intensidade da movimentação não é combinada antes da execução. No trabalho dos pads, vários fatores orientam a dinâmica do treinamento: o tempo de treino do lutador, a proximidade da luta, a vontade do atleta e os objetivos do treinador

A “trocação” era o tipo de treino que os atletas da equipe mais se dedicavam. Os treinos de boxe eram os mais intensos e o objetivo das lutas era, quase sempre, nocautear o adversário. Os atletas eram especialistas nesse tipo de movimento. Eram chamados de trocadores ou strikers.4 Durante o treinamento da trocação, há também a atividade de sparring, geralmente com uso de capacete, sempre com uso do protetor bucal. O sparring é uma simulação de luta em pé. Algumas vezes são inseridos movimentos de derrubar o adversário (quedas) e um pouco de chão (jiu-jitsu). Neste caso seria um “sparring de MMA”, que utilizaria técnicas de diferentes modalidades.

Um time de “trocadores” e não “de chão”: muay thai, boxe e jiu-jitsu

O reconhecimento da equipe como um time de “trocadores” causou alguns problemas durante as lutas. Em um dos registros de diário, de uma segunda-feira após um evento com três lutadores da equipe derrotados, observei que a direção do treino foi para a luta “de chão” e que o treinador apresentava um semblante irritado e preocupado. Fui, então, questioná-lo sobre o que acontecera no evento: “Pior, impossível. A Diana perdeu, Pedro levou um mata-leão e o Murilo foi finalizado no braço.” E completou: “Eles não querem ‘trocar’ com a gente.” Eu mudo de assunto em razão do mau-humor do treinador, mas não sem perceber que é um dado relevante. Quando o técnico fala “eles não querem trocar com a gente”, refere-se às derrotas por finalizações de jiu-jitsu, pois as lutas foram levadas para o “chão”. Não é difícil concluir que a maestria em uma arte, por exemplo, no boxe ou no muay thai, não garante o êxito da vitória. É necessário “mudar o jogo” quando necessário, como relatou um lutador durante uma entrevista.

Não por acaso, os atletas, além da trocação, também treinam técnicas de chão ou grappling.5 Estas habilidades são conseguidas através de artes marciais como o jiu-jitsu e a luta greco-romana. No caso da equipe estudada, estas técnicas eram praticadas ao final dos treinos, ou em dias específicos. As “quedas”, típicas da luta greco-romana ou luta olímpica, servem derrubar o adversário; e as “defesas de queda” servem para se proteger das tentativas aplicadas pelo oponente.

Apresento um relato no qual o trabalho de chão foi o principal do dia. Este diário foi registrado em um sábado em que cheguei à academia sem muita esperança de encontrar alguém para treinar, pois este sempre foi um dia com pouca frequência. Para minha surpresa, encontro Pedro, um lutador de MMA peso pesado, oriundo do jiu-jitsu e graduado faixa roxa6 na “arte suave”. Ele me convida para um treino de quimono.

Depois do aquecimento e das conversas, pergunto se Pedro quer “passar alguma posição” ou se quer “rolar”7 direto. Ele me responde que “tanto faz, tu que sabe.” Eu decido que é melhor “rolarmos” e, se tiver alguma posição em que o outro pode ajudar, paramos o “rola” e conversamos. Ele acha uma boa ideia, eu marco no cronômetro e começamos a atividade. Noto que Pedro, apesar da força e tamanho, não tem a qualidade técnica que eu esperava. Sua potência nos golpes não acompanha sua habilidade técnica, talvez reflexo dessa necessidade, que ele me relatou antes, de treinar uma diversidade de modalidades. Ele para algumas vezes o “rola” para perguntar sobre alguns estrangulamentos que eu consigo aplicar. Sempre tento orientar de uma maneira que ele consiga aplicar as técnicas dentro do seu jogo de MMA. Um exemplo é a chave kimura que eu consigo aplicar em seu braço: “Essa é uma chave que tu podes aplicar na luta. Ela pode ser feita sem quimono e, se encaixar bem, tu finaliza a luta.” O cronômetro marca o tempo e acabamos o primeiro “rola”. (Diário de campo, 04 mai. 2015)

A prática do treino de grappling pode ser realizada de duas maneiras: com quimono, chamado de “treino de pano”; ou o treino com bermuda e camiseta, chamado sem quimono ou submission. Nesta passagem, estávamos treinando de pano e meu objetivo foi passar técnicas que coubessem no jogo de Pedro, já que este é um atleta de MMA - onde não se usa quimono. O treino de pano é pouco utilizado pelos atletas; na maioria das vezes, as vestimentas são bermuda e camiseta.

Durante a pesquisa, notei que, em razão de algumas derrotas por finalização, os treinos mudaram a dinâmica. Houve uma preocupação maior com os treinos de chão. Vários relatos foram feitos no diário sobre isso. Essa mudança foi crucial no andamento da equipe. Alguns atletas com pouca experiência no jiu-jitsu começaram a finalizar suas lutas em razão deste foco.

O treino começa e Sílvio passa algumas técnicas de solo. O primeiro movimento é uma “raspagem”8 da meia-guarda. Sílvio, ao passar a técnica, tenta relacionar o movimento com a especificidade da luta de cada um. No caso de Mamute e Félix, lutadores de MMA, ele diz: “No MMA, o movimento é o mesmo, só tem que proteger mãos e cabeça para não tomar soco.” Todos nós concordamos e ficamos repetindo o movimento. Faço dupla com Félix [...] e ele me relata a sua ansiedade em começar a lutar MMA: “Bah, Flavião, é foda. Estou bem nervoso. Eu sei jiu-jitsu, mas tem que ver a trocação. Tenho que treinar mais boxe.” Eu respondo: “Calma que a gente vai te ajudar. Vem treinar boxe amanhã que a gente trabalha a movimentação em pé.” Ele me responde: “Certo.” (Diário de campo, 03 mar. 2015)
Chego na academia para treinar e vejo que estão na sala de treino Sílvio e Carlos treinando chão. Como Carlos tem luta marcada para [...] junho, no Rio de Janeiro, as orientações são específicas para o enfrentamento de seu adversário, que tem bom chão, segundo se comenta pelos vídeos. As orientações eram em relação às “raspagens”, movimento de jiu-jitsu em que o atleta passa para uma posição de vantagem em relação ao seu oponente. Sílvio dá orientações para que Carlos não leve socos no ground and pound e nem seja finalizado pelo adversário. As orientações são bem específicas, pois Carlos já é um atleta experiente no jiu-jitsu, faixa roxa [...]. Sílvio comenta para Carlos: “Tem que fazer essa raspagem e te proteger para que ele não te raspe.” Carlos assente com a cabeça e parece ter entendido a mensagem do técnico. Eles continuam “rolando” mais alguns minutos enquanto Carlos tenta reproduzir as técnicas passadas. (Diário de campo, 25 abr. 2015)

Na primeira passagem, Félix, lutador amador de MMA, demonstra seu nervosismo para estrear no octógono. O atleta tem uma experiência grande no jiu-jitsu, tendo disputados vários campeonatos. Porém, sua tensão se dá por “não saber trocar”. Minha sugestão é que ele treine mais boxe e ele assente com a orientação, que foi ratificada pelo seu treinador. Félix teve três lutas amadoras nas artes marciais mistas e foi vitorioso em duas delas. Sua incursão no mundo da trocação foi de difícil adaptação. Os sparrings doloridos e as pancadas que recebeu durante sua passagem pela “nobre arte” dificultaram sua adesão ao MMA. Mais uma vez, concluo que o MMA não pode se resumir a uma arte apenas. Tenho uma amizade pessoal com Félix e acompanhei sua trajetória que, apesar de dura, foi exitosa. Porém, o atleta voltou aos treinos de jiu-jitsu que, para ele, “são a [sua] casa”.

A segunda passagem mostra as instruções do treinador para Carlos, atleta com experiência em lutas em pé. Carlos é mestre de capoeira e professor de muay thai, o que garantiu alguns nocautes na sua carreira de atleta profissional. Em 2014, Carlos conseguiu o prêmio de nocaute mais rápido do MMA gaúcho; ele aplicou um direto no queixo do seu oponente e o nocauteou em 15 segundos de combate. Entretanto, sua deficiência é o jiu-jitsu; Carlos já foi finalizado em duas lutas. Nessa passagem, o técnico orienta sobre o perigo das raspagens no MMA. Ele tenta raspar o adversário e fazer com que este fique na mesma posição (de costas para o chão) em que ele estava. É uma posição perigosa, pois aquele que está por cima, no MMA, tem maior possibilidade de aplicar o ground and pound, ou seja, socos de cima para baixo que atingem o rosto ou o corpo do adversário e que têm grande possibilidade de acabar a luta.

Assim, o treino de chão da equipe de MMA se caracterizava, preponderantemente, pelo aperfeiçoamento de técnicas de jiu-jitsu. Há uma adaptação do jiu-jitsu clássico para o trabalho de chão do MMA, pois neste último, além de finalizar o adversário, também é possível aplicar socos e joelhadas durante a dinâmica. Deste modo, as chaves de braço (arm locks), chaves de pé (leg locks), e estrangulamentos como o “mata-leão” e o “triângulo” eram adaptados para as idiossincrasias das artes marciais mistas.

Entre a trocação e o trabalho de chão, há um momento de transição denominado “queda”. A maneira pela qual o lutador consegue derrubar o seu adversário pode ser decisiva para o êxito no combate, por isso, também são realizados treinamentos específicos de quedas. Nestes treinos, são reproduzidas técnicas da luta livre olímpica9 e adaptados alguns golpes do judô sem quimono.

Como mostra Awi (2012), os lutadores brasileiros são oriundos, tradicionalmente, de duas escolas: “os grapplers” (principalmente discípulos da família Gracie, no Rio de Janeiro) e “os trocadores” (principalmente da escola Chute-Boxe, de Curitiba10). Assim, o Brasil tem pouca tradição no trabalho de queda. Segundo o mesmo autor, os americanos têm predomínio no desenvolvimento dessas técnicas, principalmente pela sua tradição na luta livre olímpica. Essa domínio fez com que muitos lutadores de luta livre tivessem sucesso nas lutas de MMA.

Porém, essa pouca tradição não diminui o esforço de treinamento dos atletas. Na academia pesquisada, alguns dias eram utilizados especificamente para esse trabalho. Em outras ocasiões, o treinamento de quedas era inserido na rotina aliado a outras práticas. Uma especificidade desse tipo de treino é que, por não haver muitos lutadores especialistas, ele era utilizado pelos trocadores como um treino de defesa, principalmente quando algum atleta iria lutar contra um grappler, pois, com uma boa “defesa de queda” o atleta teria melhores condições de defender os ataques dos lutadores de chão. Trazemos dois excertos que materializam essas discussões.

Vejo que o treinamento está direcionado para as especificidades de Carlos, que irá lutar em junho. A primeira atividade são as quedas. Como há quatro lutadores, eles formam duas duplas para o exercício. Carlos faz dupla com Pedro (bem mais pesado) e Guilherme faz dupla com Murilo. A atividade consiste em um dos participantes tentar “quedar”11 o adversário e o outro tentar defender. Cinco minutos são marcados no cronômetro e a atividade começa. Pedro, por ser mais pesado, consegue levar vantagem sobre o adversário e leva-o para o chão algumas vezes. Entre Guilherme e Murilo (de pesos mais parecidos), a disputa parece mais equilibrada, ora Guilherme aplicando algumas quedas em Murilo, ora este conseguindo defendê-las. Os cinco minutos acabam e, após um descanso de um minuto, a atividade recomeça, mas agora aquele que estava tentando derrubar começa a defender as quedas. As lógicas continuam as mesmas e Carlos não consegue derrubar Pedro enquanto Guilherme e Murilo têm uma disputa equilibrada. Após cinco minutos, novamente o cronômetro toca e os lutadores, que já parecem bem cansados, sentam no chão, ofegantes (Diário de campo, 04 mai. 2015)
Rodrigo forma dupla com Fabrício para o treino de quedas. Os dois lutadores ficam frente a frente e, em uma simulação de luta sem socos e chutes, tentam derrubar o oponente. Assim que um dos atletas cai, eles voltam à posição inicial e recomeçam a atividade. Fabrício tenta algumas investidas nas pernas de Rodrigo, mas este consegue se defender. Em seguida, Rodrigo “entra” nas pernas de Fabrício e consegue aplicar uma técnica chamada double leg, em que o atleta segura as duas pernas do adversário e levanta-o, em seguida joga-o no chão. Rodrigo tem êxito nesse movimento e derruba Fabrício. Rodrigo dá a mão para Fabrício levantar e os dois recomeçam. Fabrício novamente “ataca” o single leg (movimento semelhante ao primeiro, mas ataca apenas a perna da frente), Fabrício consegue se defender com um sprawl (movimento em que o atleta joga o quadril para trás para não deixar que o adversário o derrube). Rodrigo leva vantagem no round, o cronômetro dá o sinal e os atletas se cumprimentam. No round seguinte, Sílvio orienta: “Mesma coisa, só que depois que derrubar, continua, mas sem soco, só jiu-jitsu.” Os dois recomeçam, Fabrício vai para cima de Rodrigo e consegue aplicar uma queda. Os dois continuam no chão e Fabrício consegue passar a guarda de Rodrigo; a partir disso, domina a luta e consegue “montar” em Rodrigo. Então, tenta aplicar um estrangulamento. Rodrigo consegue defender e inverte a posição. Os dois recomeçam em pé. É a vez de Rodrigo investir com uma queda de single leg em Fabrício. Após cair, os dois novamente começam a “rolar”, em uma simulação de jiu-jitsu. Rodrigo consegue passar a guarda de Fabrício e fica na posição de 100kg.12 Ao conseguir montar, o atleta tenta aplicar um estrangulamento em Fabrício, mas este consegue escapar. Os dois levantam-se e o cronômetro marca o sinal de tempo. Os dois se cumprimentam. (Diário de campo, 22 jun. 2015)

Na primeira passagem, havia uma luta marcada para Carlos no Rio de Janeiro. Como Carlos é um trocador, e seu adversário um perito nas técnicas de chão, o direcionamento de seu treinamento foi no intuito de dificultar as investidas de quedas do seu oponente. Ao colocá-lo para treinar com Pedro, um grappler bem mais pesado do que Carlos, seu treinador quis apurar a defesa de queda do atleta. Essa preparação resultou positiva, pois Carlos venceu a luta com um nocaute no segundo round.

A segunda passagem faz referência a um trabalho tradicional no MMA, o treino de quedas com finalização. Nessa especificidade, os atletas lutam até derrubarem seu oponente, só que, ao invés de iniciarem a atividade em pé novamente, o treino continua até que alguém seja finalizado por chaves de jiu-jitsu. Há, portanto, uma mistura do trabalho “de quedas” e “de chão”. As quedas mais utilizadas no MMA são o double leg – um ataque nas duas pernas do adversário em que lutador é projetado para cima e para o lado em um movimento que resulta no lutador caindo ao lado do adversário, em uma posição denominada 100kg que dá vantagens de ataque – e o single leg – um ataque em uma das pernas do oponente (a que está à frente da guarda).

Até aqui, descrevi movimentos que fazem parte do boxe, do muay thai, do jiu-jitsu e da luta livre e que foram incorporadas ao repertório do MMA. Há, entretanto, duas técnicas que são específicas das artes marciais mistas - ou seja, não são utilizadas em outras artes marciais e surgiram em razão das idiossincrasias das regras e das dinâmicas desse esporte –, o ground and pound e o “trabalho de grade”.

Técnicas do MMA: ground and pound e “trabalho de grade”

O ground and pound são os socos desferidos no rosto e no corpo do adversário enquanto ele está caído. Geralmente, após uma queda o lutador cai “por cima” ou “na guarda” do adversário. A partir daí, começa a desferir socos que podem nocautear rapidamente o oponente em razão da potência e força que podem ser produzidos com socos de cima para baixo. Durante a pesquisa, registrei alguns treinamentos específicos de ground and pound, que, normalmente, são feitos no saco de pancada. O lutador ajoelha-se com suas pernas prendendo a lateral do saco e bate alguns socos e cotoveladas no equipamento simulando uma luta real. Mas há também treinos com o adversário.

O segundo round é direcionado às especificidades do MMA. Sílvio orienta: “Troca em cima e, quando der, derruba. Quando estiver no chão, trabalha o chão e o ground and pound. Mas tenta não partir pra pancadaria. Usa a técnica.” Os dois lutadores fazem um sinal afirmativo com a cabeça, tocam as luvas e começam o round, ao sinal do cronômetro. A trocação começa com mais intensidade e Michel desfere dois potentes jabs no rosto de Pedro, completados com um chute na altura das costelas. Este revida com um chute na cabeça e um direto de direita no rosto. Michel investe de novo contra o oponente com um chute lateral e uma joelhada na altura do abdômen. Pedro, então, segura a perna de Michel e derruba-o. Tendo caído “por cima”, Pedro começa a trabalhar o ground and pound colocando socos no rosto de Michel enquanto Sílvio orienta: “Na boa. Só marca”. Pedro faz um sinal com a cabeça e Michel diz: “Tá tranquilo. Pode continuar assim.” Sílvio orienta novamente: “Agora, trabalha o jiu-jitsu. Desenvolve o chão.” Pedro tenta, então, passar a guarda de Michel e consegue, a seguir tenta uma finalização chamada katagatame, que consiste em estrangular lateralmente o pescoço do adversário com os braços em posição de triângulo, mas Michel consegue escapar. O cronômetro dispara, os dois tocam as luvas e se abraçam, agradecendo mutuamente pelo treino. Sílvio faz um comentário sucinto: “Bom. Tá bom por hoje” e cumprimenta os dois lutadores. (Diário de campo, 17 abr. 2015)

Nesse dia, os lutadores fizeram um treino de queda seguido de ground and pound. Há um perigo iminente de lesões em razão da agressividade do trabalho. Em razão disso, sempre é orientado um cuidado com esse tipo de atividade. Não só o treinador, mas os próprios atletas orientam “pegar leve” quando esses treinos são desenvolvidos. Mais uma vez, aqui, percebo que o autocontrole que dá sentido e direção no controle da violência, tão bem explanado pela teoria eliasiana (Elias, 1994), é reforçado. Não observei nenhuma vez na academia um nocaute a partir do ground and pound. O treinamento parece ter um controle mais rígido em relação à agressividade.

Além do ground and pound, o treino de grade é um movimento muito específico do MMA, já que se baseia no desenvolvimento de técnicas com apoio na grade que cerca o octógono; uma singularidade desse esporte. Não há outra modalidade de luta em que seja utilizado o octógono. Os treinos de grade eram feitos quando uma luta se aproximava, porém não eram rotineiros como a trocação e o trabalho de chão.

Acabado o treino, fico na sala, pois noto que Sílvio orienta Diana a “continuar treinando”. Diana aceita a orientação e Sílvio pede a Fernando, irmão de Diana e também lutador, [...] para “treinar grade” com ela. Durante um round de cinco minutos, Sílvio orienta que ele pressione a atleta na grade, e dá orientações para que Diana se defenda dos movimentos. O round acaba, Diana parece exausta e Sílvio diz: “Agora que tá cansada que tá começando a treinar.” Diana suspira e senta no chão ofegante. Sílvio diz: “Levanta que vamos fazer mais um.” A mesma dinâmica é obedecida; a grande diferença é o cansaço de Diana que parece bem maior. O cronômetro marca o sinal de tempo e Sílvio diz à Diana: “Tá bom por hoje.” A atleta, ofegante, responde: “Obrigado pelo treino.” Eles se cumprimentam e Diana sai da sala. Na saída, ao ver que eu estava ali olhando o treino durante todo o tempo, segue entre nós o seguinte diálogo:
Diana: Eaê? O que achou?
Eu: Muito bom [não achei tão bom assim, mas é importante motivá-la nesse momento]. Vai nocautear.
Diana: Tomara, estou me esforçando.
Eu: Estou vendo.
Diana: Vai ver minha luta?
Eu: Vou certo.
Diana: Que bom, é muito importante o apoio da equipe.
(Diário de campo, 24 abr. 2015)
Chego para treinar e vejo na sala de treino Mamute, Rodrigo, Carlos, Sílvio, Pedro e Giordano Alves, treinador da parte específica de jiu-jitsu de Mamute. O treino do dia parece interessante, pois é específico para a luta de Mamute que ocorrerá em setembro, em Vitória. Apesar de Sílvio ser o técnico do lutador, Giovane comanda o treino - parece-me que em razão de sua experiência em jiu-jitsu - e, assim, direciona o treino de Mamute para o chão. A luta de Mamute será contra Pedrinho, um atleta importante no cenário nacional e ex-participante do programa TUF Brasil.13 Será um evento de grande porte, transmitido pelos canais Combate e Sportv.14
Mamute começa fazendo um treino de drills (exercícios específicos para o trabalho de grade). São exercícios de sentar e levantar com as costas apoiadas em uma parede (representa a grade do octógono) utilizando apenas a força das pernas, sem as mãos. Essa atividade serve de aquecimento e também para aprimorar esse tipo de técnica necessária quando se está na grade. Após três séries de 45 segundos fazendo esse exercício, Giovane pede para Pedro, lutador profissional peso pesado (aproximadamente 108kg) para tentar “botar Mamute para baixo”, derrubá-lo. Assim, durante cinco minutos Pedro tenta derrubar o atleta com entradas de “catada de pernas” e double legs. Pedro é bem mais forte que Mamute, mas este parece estar bem preparado e não deixa seu oponente derrubá-lo. As entradas de quedas são evitadas com o atleta colocando a mão na nuca ou na parte da frente da cabeça do adversário e empurrando-a para baixo, enquanto gira o seu quadril lateralmente e joga-o para trás. Ocorreram mais algumas tentativas de entrada de quedas de Pedro, mas em vão. O cronômetro dá o sinal de cinco minutos, eles tocam as mãos e descansam. Giovane dá algumas dicas para Mamute de como evitar as quedas de Pedro. Mamute ouve atentamente, mas não fala nada. Giovane diz: “Vamos fazer mais um round”. Mamute responde: “Oss”.15
Pedro novamente fica tentando derrubar Mamute, que está encostado na grade. As entradas de Pedro são muito intensas em razão da sua força e de seu tamanho. Mamute consegue escapar, mas com menos facilidade do que no primeiro round. No meio do round, Pedro entra em single leg e consegue aplicar uma queda em Mamute. Este visivelmente fica incomodado com a situação e fala alguns palavrões. Ainda faltam dois minutos para acabar o round. Pedro entra mais firme e derruba o atleta mais uma vez. O incômodo de Mamute continua e ele fala mais alguns palavrões (de insatisfação com o seu desempenho) antes de levantar-se. A partir desse momento, Mamute concentra-se e evita todas as tentativas de quedas de Pedro. O cronômetro toca, os dois se cumprimentam e descansam. Giovane aproxima-se de Mamute e diz: “Muito bom, Mamute. O cara (adversário) não é tão forte quanto o Pedro, tu estás evitando bem as quedas. É só fazer o teu jogo.” Mamute concorda com a cabeça. (Diário de campo, 24 ago. 2015).

O primeiro excerto é de uma preparação para a luta da única atleta feminina da equipe, Diana Vasconcelos. Acompanhei de perto a sua preparação para a luta, em treinamentos, problema de perda de peso, dificuldades de “encaixar” novas técnicas em seu “jogo” e sua luta em um evento em Porto Alegre, onde ela foi derrotada com um arm-lock. Nesse dia, especificamente, foram feitos treinos de grade justamente porque sua adversária era uma especialista em jiu-jitsu. Seu treinador não queria que ela fosse derrubada, por isso, seu treino foi direcionado para que Diana evitasse as quedas quando encostada na grade.

Na segunda passagem, também foi registrada uma preparação para um combate. Mamute é um atleta de alto nível no MMA, já tendo lutado nos Emirados Árabes e nos Estados Unidos. A preparação foi para a sua luta em Vitória, no Espírito Santo, que eu também acompanhei in loco. O atleta com quem Mamute lutou era muito conhecido no mundo das lutas; Pedrinho é um conhecido grappler com um trabalho de quedas muito forte. Por essa razão, para essa luta Mamute contratou um técnico específico para defesa de quedas, um especialista em jiu-jitsu de uma importante equipe de Porto Alegre. Toda a sua preparação foi feita para não ser derrubado e poder trocar com seu adversário. Acompanhei a rotina por dois meses. Porém, infelizmente, para o atleta e para a equipe, Mamute foi derrotado por pontos.

Considerações finais

Apresentamos neste artigo a rotina de treinos, as técnicas utilizadas e os significados produzidos pelos lutadores no cotidiano de uma academia de MMA. As técnicas são oriundas de diversas modalidades de luta, como o boxe, o jiu-jitsu, o muay thai e a luta greco-romana. Jabs, diretos, low kicks e double legs são técnicas de diferentes artes marciais que são inseridas no dia-a-dia de um treinamento de MMA.

A academia de MMA é um espaço de uma certa pedagogia da prática, onde os aprendizados são inculcados a partir da vivência cotidiana. Ao mesmo tempo que é uma modalidade individual, aprende-se a luta MMA na ação e de forma coletiva. A sua lógica é certamente mais codificada do que apresentei aqui, afinal, cada um desse golpes apresenta variações, dinâmicas e possibilidades, que são aprendidos corporalmente – e, por isso, de difícil descrição – na sua realização. De todo modo, essa aproximação etnográfica das formas, técnicas, razões, sentidos, habitus e pedagogias das dinâmicas desse esporte parece fundamental para a compreensão do MMA como esporte contemporâneo.

Roles de colaboración

Flávio Py Mariante Neto

Declaração de autoria ou papéis de colaboração: Conceitualização, Redação: revisão e edição, Pesquisa, Metodologia, Redação – rascunho original

Daniel Giordani Vasques

Declaração de autoria ou papéis de colaboração: Redação: revisão e edição

Marco Paulo Stigger

Declaração de autoria ou papéis de colaboração: Redação: revisão e edição, Supervisão

Financiamento:

Bolsa CAPES

Referências

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Notas

1 Essa expressão é muito utilizada no universo das lutas. Mais do que um lazer, os lutadores enxergam sua prática como compromisso, um trabalho a ser cumprido com responsabilidade e disciplina. Wacquant (2002) explora esse termo. Segundo seus relatos, o início das atividades sempre é precedido pela ordem do treinador: “Work”. Isso reflete a seriedade e comprometimento envolvidos nas atividades.
2 Há diferença entre “pads” e “manoplas”, provavelmente devido à tradução do texto. O que Wacquant chama de pads, neste trabalho pode ser relacionado com as manoplas. Aqui, os pads são os implementos para trabalhar as técnicas de socos e chutes, que tratamos posteriormente.
3 Não há divisão de faixa no boxe, mas esse é um termo utilizado para designar aquele sem muita experiência na arte marcial, mesmo que ela não apresente essa divisão.
4 Termo mais utilizado pelos americanos ao se referirem a atletas com alta capacidade de nocaute.
5 Grappling é qualquer estilo de luta agarrada, em pé ou no chão; é a arte de controlar o corpo do oponente. Pode ser aplicada em luta em pé (exemplificado no jogo de clinch, quedas e chaves de esportes e artes como sumô, judô, aikido, luta olímpica e sambô) e luta no chão (exemplificado nas imobilizações e submissões de esportes como luta olímpica, jiu-jitsu e submission wrestling).
6 O atleta de jiu-jitsu leva cerca de oito anos para chegar à faixa preta, a quinta faixa (branca, azul, roxa, marrom e preta). Portanto, o faixa roxa é um lutador experiente, com quatro ou cinco anos de treino.
7 “Rolar”, no jiu-jitsu, é como fazer sparring no boxe, uma simulação de luta.
8 A raspagem é um movimento de inversão em que o atleta, após ser derrubado, cai de costas para o chão.
9 Há diferença entre luta livre e luta greco-romana. Na primeira, é permitido atacar as pernas do adversário para derrubá-lo; na greco-romana, só são possíveis projeções na altura do quadril até a cabeça.
10 A Chute-Boxe é uma reconhecida escola de muay thai que revelou Anderson Silva, Wanderlei Silva e Maurício Shogum, campeões do UFC. O aparecimento desses atletas fez com que o nome da academia fosse conhecido e filiais em diversos países fossem abertas.
11 “Quedar” é uma expressão nativa que significa derrubar o adversário.
12 100kg é uma posição de domínio no jiu-jitsu. Um dos atletas fica lateralmente ao adversário com o tórax apoiado no seu peito. Dali, são possíveis vários ataques de estrangulamento e chaves de braço.
13 O TUF Brasil é um programa televisivo que possibilitou que o MMA tivesse mais reconhecimento no país. Esse atleta foi um exemplo dessa popularização.
14 O Sportv é um canal de esportes de TV a cabo das organizações Globo. A audiência do canal confere ao evento uma grande divulgação em termos nacionais. O Combate também é de TV a cabo e pertence ao mesmo grupo, mas atinge um público menor e mais próximo às lutas.
15 Expressão frequente no universo das lutas. Ela tem diversos significados. Pode ser um cumprimento, um assentimento ou reverência ao mestre.

Recepción: 17 Abril 2024

Aprobación: 25 Junio 2024

Publicación: 01 Julio 2024

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