Educación Física y Ciencia, vol. 20, nº 2, e047, abril-junio 2018. ISSN 2314-2561
Universidad Nacional de La Plata
Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación
Departamento de Educación Física

Artículos

Avaliação na Educação Física Escolar: a produção audiovisual como ferramenta pedagógica para a aprendizagem


Giovanni Frizzo

Universidade Federal de Pelotas, Brasil

Patrícia Correa da Silva

Universidade Federal de Pelotas, Brasil

Cita sugerida: Frizzo, G. y Correa da Silva, P. (2018). Avaliação na Educação Física Escolar: a produção audiovisual como ferramenta pedagógica para a aprendizagem. Educación Física y Ciencia, 20(2), e047.https://doi.org/10.24215/23142561e047

Resumo: O presente artigo é resultado de um estudo que objetivou analisar a produção audiovisual como instrumento de avaliação pedagógica nas aulas de Educação Física (EF) dos anos finais do Ensino Fundamental. Realizamos uma pesquisa-ação em uma escola da rede pública municipal da cidade de Pelotas-RS com a disciplina de EF, durante um semestre, em uma turma dos anos finais do Ensino Fundamental, utilizando como instrumento de avaliação do aprendizado a produção audiovisual. Os resultados evidenciaram que a experiência de produzir vídeos como mais uma ferramenta facilitadora na construção do conhecimento, além de ser eficiente pedagogicamente, teve o reconhecimento e aprovação dos estudantes, o que pressupõe que a inserção das TICs na educação e a aplicação deste novo formato avaliativo possa contribuir para melhoria do processo de ensino-aprendizagem.

Palavras-chave: Avaliação educacional, trabalho pedagógico, Educação Física, pesquisa-ação.

Evaluation in School Physical Education: Audiovisual Production as a Pedagogical Tool for Learning

Abstract: This article is the result of a study that aimed to analyze the audiovisual production as an instrument of pedagogical evaluation in the Physical Education (PE) classes of the final years of Elementary School. We performed an action-research in a school of the municipal public system of the city of Pelotas-RS in the discipline of PE in a class of the final years of the Elementary School. The research took place during a semester and the audiovisual production was used as the instrument of evaluation. The results showed that the experience of producing videos as a facilitator tool in the construction of knowledge is pedagogically efficient and, at the same time, it receives the student’s recognition and approval, which presupposes that the insertion of ICT in education and the application of this new evaluative format contribute to the improvement of the teaching-learning process.

Keywords: pedagogical evaluation, Pedagogical Work, Physical Education, Action-research.

Introdução

Dentre os diferentes processos existentes na organização do trabalho pedagógico e na produção do conhecimento em Educação Física (EF), a avaliação pedagógica é uma das temáticas em que um complexo conjunto de elaborações são desenvolvidas, mas ainda carecendo de aprofundamento suficiente para sua efetiva aproximação com a realidade escolar. De acordo com Soares et al. (1992), entre as avaliações escolares vêm se estabelecendo critérios que selecionam e classificam os estudantes, o que permite a ocultação de importantes reflexões sobre a avaliação, reforçando a ideia de meritocracia, disciplina e seleção nas escolas. Esta perspectiva coaduna com Freitas (1997), quando este afirma que a avaliação feita na escola da atualidade está diretamente ligada ao tecnicismo da década de 1970, hoje chamado popularmente de neotecnicismo, trabalhando dentro de uma lógica quantitativa e tecnológica.

Portanto, com o intuito de contribuir para que a produção científica se aproxime do “chão da escola”, realizamos uma pesquisa-ação em uma escola da rede pública municipal da cidade de Pelotas-RS com a disciplina de EF, durante um semestre, em uma turma dos anos finais do Ensino Fundamental, utilizando como instrumento de avaliação do aprendizado a produção audiovisual. Tal processo metodológico foi definido para a realização da investigação que teve como objetivo analisar a produção audiovisual como instrumento de avaliação pedagógica nas aulas de EF dos anos finais do Ensino Fundamental.

No processo de organização do trabalho pedagógico, a avaliação do aprendizado constitui-se como um momento fundamental para compreensão do caminho que está sendo trilhado e definição dos desafios seguintes para que cada estudante avance na apropriação e elaboração do conhecimento, tanto individualmente como coletivamente. Portanto, a avaliação não se resume a atribuição de notas, tampouco para estabelecer processos classificatórios ou de julgamento sobre os estudantes.

Para aproximar o processo à realidade do estudante, valorizando a construção do conhecimento como um todo e objetivando a formação humana constituída por saberes críticos, politizados e com autonomia, a pergunta central que permeou este estudo foi: como a produção audiovisual pode contribuir nos processos avaliativos e formativos na educação física escolar?

Esta problematização foi acompanhada de uma profunda imersão no ambiente escolar com vistas a buscar novas possibilidades para os processos pedagógicos no que tange à questão da avaliação nas aulas de EF. Dentro da perspectiva crítica-superadora de EF, a avaliação não pode ser realizada simplesmente em caráter “terminal”, portanto “destaca-se, nessa nova concepção, a existência de frequentes momentos avaliativos formais e informais, explícitos ou ocultos, presentes à vida da escola” (Soares et al., 1992, p.19).

Tal preocupação também se somou a compreensão de que atualmente os estudantes estão diretamente ligados ao mundo tecnológico, repleto de informações vindas de todos os cantos do mundo. Contudo, quando este estudante chega ao âmbito escolar, muitas vezes, é obrigado a se desvincular do seu “mundo tecnológico” e se adequar a forma escolar tradicional, assim “isola-se a escola da vida e se elege o interior da sala de aula como palco privilegiado do processo educativo” (Freitas, 2010, p.89).

Inserir o uso das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) no contexto escolar pode ser uma alternativa para suprir a carência de recursos dentro da escola, pois estas podem não ser suficientes na garantia de uma formação integral de qualidade para o estudante. Gomez (1997) afirma que, os livros didáticos disponíveis na escola são insuficientes no cumprimento dos objetivos educacionais almejados, sendo os meios de comunicação de preferência dos estudantes. E como o foco destes meios está no espetáculo e não na informação ou no ensino, cabe aos docentes enfrentar tal desafio de manejo destas informações.

As metodologias tradicionais de atribuição de nota ao estudante têm predominado fortemente, tanto dentro das escolas quanto fora delas, ao fazer qualquer tipo de processo seletivo. Freitas (1997) afirma que, a reprovação do aluno vem da avaliação informal e além de refletir na avaliação formal, também faz com que o aluno crie um status de derrotado, como se o problema da reprovação fosse ele e não o sistema educacional em que está inserido.

Seguindo a lógica de mercado de seleção/exclusão: “quem não venceu na vida, não é porque o sistema é injusto, é por que não se esforçou. E com isso, as desigualdades sociais, são eliminadas, e o que existe são pessoas que se esforçam ou não se esforçam” (Freitas, 1997, p.19).

Um dos aspectos que contribuem em um processo de avaliação emancipatória é a compreensão de que

Cada pessoa é um ser único e original, com experieências, histórias, conhecimentos, possibilidades e limitações diferentes, que a constituiíram como é; a sala de aula é o espacço da diferença, da heterogeneidade. Assumir a diferença, a heterogeneidade como valor, como riqueza, tem um novo sentido ético, pois ela nos potencializa para agir socialmente (Loch, 2000, p. 30)

Neste sentido, “a qualidade da avaliação passa a estar em sua capacidade de diálogo ao indagar, investigar, refletir sobre os percursos, processos e procedimentos na produção de conhecimento, contribuindo na criação de meios que auxiliem na superação de limites encontrados” (Loch, 2000, p. 30). Essa capacidade de diálogo requer uma interação entre a escola e o estudante em que este seja também sujeito do seu processo de aprendizagem, não como objeto, garantindo assim o investimento na autonomia de cada sujeito da escola.

Metodologia

Na tentativa de adequar esta pesquisa a um contexto metodológico que valorizasse a ideia de horizontalidade entre os sujeitos, optou-se pela pesquisa-ação diante da necessidade de interpretar e fazer uma análise pujante da pesquisa sem simplesmente descrever ou constatar dados coletados. Na mesma direção apontada por Engel (2000, p.182), de que a “pesquisa-ação é um tipo de pesquisa participante engajada, em oposição à pesquisa tradicional, que é considerada como ‘independente’, ‘não-reativa’ e ‘objetiva’”. Nesta direção, compreendeu-se a pesquisa-ação como:

[...] um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo (Thiollent, 1998, p.14).

Este tipo de pesquisa não tem foco somente a ação, mas também outras preocupações são levadas em consideração, como por exemplo, produção de conhecimento, aquisição de experiência de todos os integrantes, discussão e avanço nos debates feitos acerca das problemáticas levantadas durante o processo. Este tipo de pesquisa foge da postura científica convencional, tendo maior flexibilidade na concepção e na aplicação do processo investigativo (Thiollent, 1998), ao mesmo tempo em que se observa uma rigorosidade científica que permite avançarnaprodução do conhecimento.

De acordo com Betti (2006), no desenvolvimento deste tipo de pesquisa não se cria uma situação artificial para aplicação, o objetivo não é unicamente para experimentação de novos instrumentos e técnicas, mas para construção conjunta de conhecimento dentro do âmbito escolar, sem fugir dos objetivos das aulas programadas para o trimestre escolar. O uso das TIC dentro das aulas, por exemplo, foi um instrumento auxiliar na construção do conhecimento e não produto exclusivo para o devido fim.

Considerando todas as peculiaridades metodológicas da pesquisa-ação, de cunho qualitativo, foi realizado um estudo de caso de caráter descritivo e analítico em uma escola da rede pública municipal de Pelotas-RS. Os colaboradores da pesquisa foram os estudantes de uma turma de sétimo ano do Ensino Fundamental, escolhida a partir da disciplina de Estágio Curricular Supervisionado do curso de Licenciatura em EF da Escola Superior de Educação Física da Universidade Federal de Pelotas (ESEF/UFPel), realizado durante o segundo semestre de 2015.

Antes de iniciar a pesquisa e a organização pedagógica, procedeu-se a autorização da escola para a realização da investigação. Como a finalidade era direcionada ao melhor aprendizado dos estudantes, houve autorização sem nenhuma restrição a execução da pesquisa. Tal processo também foi acompanhado, desde sua concepção, pela professora titular de EF da turma, que trabalhou com a produção audiovisual no início do ano letivo propondo aos estudantes a unidade didática denominada “Lazer Ativo ou Sedentário”, sendo que, para realização dessa unidade foi solicitado aos estudantes que questionassem seus pais e familiares sobre as opções de lazer no período da adolescência de cada um.

Ao analisar o que havia sido proposto pela professora titular e a própriaprodução de vídeos que os estudantes haviam realizado, foi possível observar certas dificuldades de posicionamento e interesse dos estudantes diante dos assuntos que eram propostos, portanto, ampliando os desafios para o trabalho pedagógico e a utilização de recursos audiovisuais no processo.

A partir deste diagnóstico, da análise do Projeto Pedagógico da escola e do Plano de Ensino da disciplina de EF, as primeiras atividades teórico-práticas desenvolvidas tiveram por intenção apresentar as diferentes possibilidades do trato com o conhecimento da EF a partir das manifestações da cultura corporal. Os conteúdos da EF para esta etapa da Educação Básica foram trabalhados em articulação com os Temas Transversais indicados nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) do terceiro e quarto ciclo do ensino fundamental, são eles: ética, saúde, pluralidade cultural, meio ambiente, orientação sexual, trabalho e consumo (Parâmetros Curriculares Nacionais, 1998). Esta escolha dos conteúdos das aulas foi definido a partir de.

Após este acúmulo, em conjunto com os estudantes foram definidas temáticas a serem abordadas ao longo do ano letivo com o intuito de aprofundar o conhecimento da EF, cujo processo avaliativo se constituiu na produção de vídeos com assuntos considerados polêmicos que surgiram no decorrer das aulas e que careciam de maior aprofundamento. Tais “assuntos polêmicos” despertaram o interesse dos estudantes em manifestarem-se a respeito destes, emitindo opiniões e pesquisando informações que subsidiaram as discussões coletivas e que propiciaram um rico momento de aprendizado.

Este trabalho foi desenvolvido durante 18 aulas, sendo que três destas (8ª, 13ª e 15ª aula) foram exclusivamente para discussão das “polêmicas”, para que pudéssemos definir os temas norteadores dos vídeos de avaliação. Na 13ª aula, os estudantes se dividiram em cinco grupos e cada um destes definiu uma temática diferente para abordar e produzir o vídeo como produto do processo pedagógico.

Todas as atividades realizadas foram registradas em um diário de campo, com relatos e reflexões acerca dos acontecimentos e também com registro fotográfico em alguns momentos das atividades para facilitar a analise dos acontecimentos. O instrumento tecnológico neste contexto serviu como mais um recurso para apropriação do conhecimento e como um instrumento de coleta de informações.

Ao final do período de realização da pesquisa e trabalho pedagógico, foi realizada uma autoavaliação com os estudantes em que foi perguntado a opinião destes em relação a produção dos vídeos para o seu aprendizado. A pergunta feita na autoavaliação serviu para esclarecer o que os estudantes pensaram sobre o tipo de metodologia empregado, se foi ou não interessante, se as mídias utilizadas durante as aulas auxiliaram na compreensão das atividades e na aprendizagem acerca dos temas que foram discutidos e se acharam importante serem sujeitos ativos na construção do seu conhecimento. Dos 21 alunos que participaram da pesquisa-ação, 18 estudantes fizeram a autoavaliação, os outros três estavam ausentes no dia da aplicação do questionário. Para manter a confidencialidade dos estudantes, ao apresentarmos fragmentos de suas respostas ao questionário, utilizaremos a caraterização: estudante 1 [E1], estudante 2 [E2] e assim sucessivamente.

Para análise dos resultados foi realizada uma análise descritiva a partir das respostas do questionário e dos registros no diário de campo. Foi feita uma associação entre estas informações que permitiu o estabelecimento de categorias empíricas que subsidiaram a análise e conclusões. Esta categorização foi realizada a partir da coleta de informações, a interpretação das respostas e a separação por categorias.

Resultados e Discussão

O formato de organização por grupos realizado no primeiro trabalho foi mantido no segundo, porém o assunto nesta nova produção não foi o mesmo para todos. Na primeira produção houve aula expositiva a respeito da temática, e foi disponibilizado material para pesquisa, onde os estudantes deveriam buscar conceitos e curiosidades sobre lazer, bem como, após realizar as entrevistas deveriam com base nas informações coletadas refletir sobre as mudanças ocorridas na atualidade e comparar aos seus momentos de lazer.

Na segunda produção os assuntos foram escolhidos a partir dos diferentes aspectos que surgiam e eram conversados em aula. Antes de propor os temas para pesquisa e produção dos vídeos foi realizada uma análise de todas as observações/avaliações de aula escritas ao final de cada plano de aula realizado.

Na 15ª aula foi montado o roteiro de elaboração dos vídeos e as perguntas que seriam feitas nas entrevistas, isto para que pudessem ser revisados assegurando que não fariam perguntas impertinentes aos entrevistados. As exigências feitas para produção dos vídeos foi de uma breve contextualização acerca da temática, entrevistas com colegas ou alguém de seu interesse e obrigatoriamente deveriam expor seu ponto de vista.

Foi possível estabelecer relação dos temas que surgiram para produção dos vídeos com os temas transversais propostos nos PCN. Os temas foram: padrão de beleza; esportes adaptados; alimentação saudável e obesidade; lutas versus briga e violência; mulheres no esporte; as relações estabelecidas com os temas transversais foram respectivamente: trabalho e consumo; pluralidade cultural; saúde; ética; ética e pluralidade cultural.

Após o surgimento dos assuntos polêmicos durante as aulas, sempre era levado algum vídeo ou apresentação de slides para ter embasamento teórico antes da discussão e exposição do ponto de vista dos estudantes. Os grupos tiveram autonomia de escolher quais temáticas mais se identificavam e também puderam elencar outras temáticas que consideraram relevantes.

O tema padrão de beleza surgiu em uma das aulas quando em um pequeno grupo os estudantes categorizavam quais colegas eram mais bonitas e por quê. Ao perceber o surgimento do tema, a professora interviu e começou a fazer questionamentos para debater sobre o assunto com toda a turma, dois estudantes contaram sobre suas irmãs e seus problemas diante do espelho, também discutiram sobre o corpo dos professores de EF, afirmando que deveriam estar definidos, com pouca gordura e musculosos.

Na aula seguinte ao surgimento desta temática foi levado alguns vídeos sobre padrões de beleza, doenças relacionadas à distorção de imagem corporal e demonstração do público mais acometido por transtornos relacionados à insatisfação com a imagem corporal. O grupo de estudantes que ficou com a temática “padrão de beleza” contextualizou sobre a evolução do padrão desde a pré-história até os dias atuais, antes da discussão e exposição do ponto de vista dos demais estudantes.

Os debates que foram realizados acerca da temática em sala de aula foram estimuladores na construção destas opiniões. Esta temática foi bastante polêmica, alguns estudantes conseguiram estabelecer relação com integrantes de sua própriafamília indo ao encontro do tão desejado “padrão de beleza”. Um dos estudante (E5) relatou: “minha irmã não come porque está sempre se sentindo muito gorda, mas na realidade ela é alta, magra e bonita”. Jáo estudante (E9) disse: “láem casa o problema é a minha mãe, elajáfezvárias cirurgias para reduzir estômago e algumas cirurgias plásticas para modificar partes do braço e do rosto”.

Em um primeiro momento alguns estudantes falaram que não existia padrão de beleza, outros disseram que podíamos discutir sobre outras coisas, mas ao ouvir os colegas discutindo sobre os “problemas” existentes em suas famílias puderam perceber a relevância do tema e contribuir com algumas palavras acerca do assunto.

O formato do vídeo deste grupo foi com fotografias extraídas de páginas virtuais passando simultaneamente com a fala de um deles explicando o que se tratava. Também foi incluída a fala em conjunto com a filmagem de dois integrantes do grupo dando sua opinião a respeito da influência da mídia e dos padrões de beleza existentes na sociedade, no último momento do vídeo foi realizada uma entrevista semi-estruturada com a mãe de um dos estudantes contendo três perguntas. Ficou evidente a percepção dos estudantes quanto à influência da mídia na determinação de padrões estereotipados de beleza e a discussão que surgiu sobre o tema se estendeu por um longo período de tempo.

Maldonado (2006, p. 60) reforça esta ideia:

Especialmente no Brasil onde a diversidade é uma característicamarcante, a mídia no geral, acaba por mostrar seu desprezo pela riqueza de tipos, de raças, pela própriamestiçagem, insistindo num padrão único de beleza tanto para mulheres quanto para homens. Essa representação pode ser claramente observada na publicidade, nas revistas, novelas e programas de televisão.

No trabalho de “alimentação saudável e obesidade” foi teorizado em formato de texto e música. Os estudantes entrevistaram alguns professores e funcionários tendo a preocupação em colocar legenda nas falas. Incluíram também a maneira de calcular o Índice de Massa Corporal (IMC) e a tradicional pirâmide alimentar, teorizando sobre fatores que levam um indivíduo à obesidade.

Este grupo com medo de ser reprimido por expressarem uma opinião “errada” deixaram para discutir sobre a temática na sala de aula ao invés de inseri-la no vídeo, segundo eles, tinham um maior domínioteórico, pois já haviam estudado este tema e por se tratar de um assunto bastante discutido nas mídias não tiveram grande dificuldade em opinar e perguntar para os colegas suas opiniões a respeito do assunto. A maioria dos estudantes afirmou ser importante a prática regular de exercício físico e manter uma alimentação saudável, mas também lembraram que a falta dele não é o único fator que gera obesidade. Dados semelhantes a este foram encontrados na pesquisa de Silva et al. (2014) que descreve as representações sociais de adolescentes sobre ser saudável.

No trabalho com a temática sobre “esportes adaptados” uma das participantes entrevistou um professor de EF de fora da escola, onde uma das integrantes do grupo pratica futsal. A primeira intenção e o questionário inicial montado foi direcionado para uma menina com deficiência física que praticava natação em um dos clubes da cidade, local onde uma das integrantes do grupo frequenta. Alguns esportes adaptados já eram de conhecimento de alguns estudantes que relataram terem acompanhado os jogos paralímpicos pela televisão, outros disseram que já tinham visto algo parecido nas redes sociais, o que demostra a relação entre as diferentes mídias e o aprendizado.

A temática lutas versus briga e violência foi um dos assuntos mais discutidos em sala de aula, devido ao conteúdo proposto ser lutas, uma das discussões mais presentes no decorrer das aulas era a importância das regras, a diferença de estar em um tatame e simplesmente brigar na rua, as inúmeras faces das brigas, os benefícios encontrados na prática regular de lutas entre outros subtemas não menos relevantes. Neste trabalho todos os integrantes do grupo foram protagonistas no vídeo, no início da filmagem os estudantes definiram o que é luta, o que é violência e o que é briga, mostraram algumas imagens recolhidas em páginas da internet e inseriram suas opiniões a respeito desta diferença. O entrevistado neste vídeo foi um lutador de Karatê Kyokushin amigo de uma das participantes do grupo. Utilizaram microfones de brinquedo e improvisaram uma mesa com copos de água para a entrevista.

Além de entrevistarem o lutador de Karatê, o grupo saiu as ruas e perguntou para duas pessoas se poderiam responder estas perguntas, logo após filmaram as respostas das pessoas entrevistadas. Neste caso foi um microempresário e uma revendedora de cosméticos. Um dos participantes que não pode comparecer no dia das entrevistas gravou sua própria mãe em casa respondendo as mesmas perguntas.

Apesar de nenhum dos integrantes do grupo já ter tido contato com as lutas antes, consideraram um conteúdo interessante e concordaram ser importante na formação dos estudantes. Devido a grande espetacularização do Mixed Martial Arts (MMA) nas mídias, todos achavam que todas as lutas eram MMA, assim, alguns esclarecimentos tiveram que ser feitos antes da produção do vídeo sobre este assunto.

A temática sobre a “inclusão das mulheres no esporte” surgiu através de questionamentos feitos pelas próprias estudantes sobre a participação das mulheres nas lutas e o assunto se estendeu para os demais esportes. Em um dia de chuva, uma das aulas foi destinada a exposição de vídeos e discussão sobre eles, tendo como um de seus assuntos a inserção das mulheres no futebol. Uma das estudantes integrante do grupo relatou: “fui a um jogo do ‘Pelotas Futebol Clube’ com meu pai e um homem que estava na arquibancada ao meu lado gritou para uma bandeirinha que lugar de mulher era na cozinha, fiquei super indignada com vontade de levantar e falar algumas verdades pra ele, disse a menina” (E9).

O trabalho foi intitulado “inclusão das mulheres no esporte”, foi inserida uma introdução escrita no vídeo falando a respeito da temática. As entrevistas foram realizadas na escola por todos os integrantes do grupo. Tiveram o cuidado de além de perguntar no vídeo, inserir as perguntas escritas no momento da fala. No dia da escolha dos temas, apenas duas meninas quiseram falar sobre este assunto, na aula seguinte dois meninos que haviam escolhido falar sobre a “inserção dos negros no futebol” pediram para fazer o trabalho com elas. A entrevista para a produção do vídeo foi feita com um estudante de EF que estava fazendo estágio na escola neste período, também foi feito o mesmo questionário com duas professoras e uma funcionária da escola para que os dados coletados pudessem ser cruzados, segundo os integrantes do grupo.

Para além do ensino dos esportes ou partes fragmentadas da EF que, segundo Soares et al (1992) tem a possibilidade de ensinar: jogo, esporte, capoeira, ginástica e dança, é importante que se amplie os conhecimentos auxiliando na formação de um ser pensante, crítico e autônomo. Pois, de forma recorrente, “os conteúdos das aulas de Educação Físicarestringem-se às modalidades esportivas - ainda assim, tratados parcialmente - negligenciando-se outros conhecimentos da cultura corporal” (Soares et al., 1992, p.102).

A pesquisa-ação proposta por Thiollent (1998) e a utilização dos temas transversais propostos nos PCN neste caso foi significativamente positiva, pois permitiu maior liberdade de ação e expressão dos participantes da pesquisa, visto que, todos os integrantes participaram de maneira ativa durante todo o processo.

Diferente da primeira produção de vídeos realizada pela professora titular da turma, nesta nova produção utilizada como mais um instrumento avaliativo do aprendizado dos estudantes, foi possívelexpor a opinião de outras pessoas a respeito dos assuntos discutidos, além da opinião dos estudantes alguns grupos tambémsaíram em busca da opinião de outras pessoas de fora da sala de aula, dentre eles: pais, vizinhos, amigos e outras no momento da construção dos vídeos. Portanto, expandindo a construção do conhecimento para além dos muros da escola.

Objetivos e atitudes semelhantes foram encontradas na produção de vídeo descrita no estudo de Vivian e Pauly (2012) que teve como objetivo principal mostrar a visão dos adolescentes dos anos finais do ensino fundamental de uma escola pública, mostrando a percepções dos estudantes sobre a escola e o bairro em que está localizada.

Ao final da realização das atividades, para avaliar a compreensão dos estudantes acerca do projeto, foi solicitado que os participantes, através de uma auto-avaliação, opinassem a respeito do processo e avaliassem o seu aprendizado. Para isto responderam a pergunta “você acha que a produção dos vídeos auxiliou no seu aprendizado? Por quê?”.

Quando perguntado se a produção de vídeos ajudou no aprendizado do conteúdo, a maioria respondeu que sim (17 estudantes). A partir das respostas, foi possível identificar quatro categorias de análise, são elas:

a) maior interesse no aprendizado: alguns estudantes apontaram que esta forma de avaliação é mais interessante, tal como aponta um dos estudantes: “sim, pois fica mais interessante de aprender a matéria” (E14).

b) Estimulo à pesquisa: devido à liberdade de escolha da temática e a amplitude dos conteúdos relacionados aos assuntos abordados houve um maior interesse dos estudantes na pesquisa, além da preocupação gerada por ter que saber o que falar nos vídeos e o que perguntar para os entrevistados. Abaixo alguns fragmentos destas respostas: “sim, pois tivemos que pesquisar”(E4); “sim, pois nos ajudou a pesquisar e elaborar um trabalho melhor” (E3); “sim, acho que os vídeosé uma maneira de fazer a gente estudar mais para saber o que falar no vídeo e uma ajuda a perder a vergonha” (E1).

c) Aprender fora da escola: através deste trabalho alguns estudantes perceberam que não se aprende sobre os conteúdos escolares somente dentro da escola: “pois isso mostra que podemos fazer atividades não sóna escola” (E6); “porque podemos pesquisar em casa” (E12).

d) Diferentes formas de aprendizado: ao buscar conhecimento para produzirem os vídeos alguns estudantes tiveram melhor compreensão do que haviam aprendido e conseguiram aprender diferentes maneiras de adquirirem conhecimento: “nós aprendemos as regras dos esportes, como funciona e etc” (E11); “as pessoas se desenvolvem também com atividades diferentes” (E2). Em contrapartida um dos estudantes relatou não considerar significativa à produção dos vídeos. Sua resposta foi: “Não, porque tudo o que tinha na pesquisa eu já sabia” (E5).

Conclusão

Analisando as respostas dos estudantes foi possível evidenciar que a experiência de produzir vídeos como mais uma ferramenta facilitadora na construção do conhecimento, além de ser eficiente pedagogicamente, teve o reconhecimento e aprovação dos estudantes. A pesquisa-ação utilizada como metodologia condutora do estudo proporcionou maior liberdade no decorrer da pesquisa, tanto nos critérioscientíficos quanto na liberdade de expressão e auto-condução por todos os participantes.

A produção audiovisual utilizada como ferramenta complementar naavaliação foi mais do que um simples instrumento para atribuição de notas, como os próprios estudantes comentaram na auto-avaliação. Serviu como mais um formato de pesquisa e estudo, fazendo com que se tivesse amplo acesso a um processo de ensino e aprendizagem diferente do comumente utilizado nas escolas, sendo este um formato mais atraente para os jovens.

Além de identificar conteúdos diferentes do que haviam sido programados para o decorrer do ano letivo, tiveram a oportunidade de discutir sobre estes assuntos, pesquisando e explorando outras temáticas. Puderam expor seu ponto de vista e descobrir a opinião de outras pessoas de sua escolha através das entrevistas. Fatores possibilitados pela pesquisa-ação proposta por Thiollent (1988), que neste caso foi bastante produtiva.

Outro fator evidenciado na pesquisa foi a grande curiosidade dos estudantes em conhecer o pensamento dos outros. Demonstraram grande dificuldade na escrita de suas opiniões com medo de restrições, para eles era mais fácil discutir sobre os assuntos na sala do que relatar no vídeo ou descrever em um papel. Possivelmente este fato esteja relacionado à pressão existente nos processos avaliativos tradicionais em atender ao que supostamente se considera “certo” e “errado”.

Refletindo sobre a dificuldade de posicionamento dos estudantes também é pertinente lembrar que a maioria das avaliações escolares servem como uma comprovação do que foi aprendido. Os sistemas avaliativos mostram o que em determinado tempo se conseguiu processar a informação fornecida. Nesta nova metodologia tiveram liberdade de expressão e por não estarem acostumados, apresentaram dificuldade de posicionamento.

Apesar desta proposta de inserção das TIC na avaliação ter alcançado seus objetivos, para que se garanta um ensino centrado no desenvolvimento crítico e autônomo do estudante preocupando-se com o processo de avaliação, não apenas como uma atribuição de nota, seria necessário que toda a escola se mobilizasse e modificasse seu Projeto Pedagógico.

A mudança no contexto escolar por completo é algo importante, mas devemos reconhecer que apresenta grandes obstáculos, visto que, a grande maioria do público que ali se encontra está acostumado com a metodologias tradicionais de avaliação, o que faz com que muitos professores não julguem este novo método “correto” ou tenham certo receio em trabalhar de uma maneira inovadora.

Os professores não precisam ter grandes conhecimentos acerca das TIC. A proposta de sua inserção para maior aproximação da realidade do estudante pode ser pensada em formatos diferentes, desde que a proximidade do mundo tecnológico dos estudantes e o trabalho pedagógico estejam intimamente ligados. Ligar-se a realidade do estudante e distanciá-lo do atual formato excludente de avaliação pode ser um grande avanço para a educação.

No decorrer desta trajetória de pesquisa-ação alguns resultados foram surpreendentes. Um dos resultados inesperados foi a realização de uma festa surpresa realizada pelos estudantes no último dia de atividades, no qual fizeram um discurso e entregaram uma carta escrita em agradecimento pelas experiências vivenciadas e cabe o seguinte registro de uma das estudantes : “tu foi a primeira professora que realmente se preocupou em saber a opinião da gente e foi tão esquisito que chegava na hora de falar o que a gente pensava no vídeo e a gente esquecia, então era mais fácil entrevistar os outros” (E9).

Assim, experimentar a produção de vídeo como mais um instrumento pedagógico de avaliação, na tentativa de vincular o mundo tecnológico dos estudantes com suas ações dentro da escola, nos parece ser uma opção interessante e ao mesmo tempo produtiva.

Referências

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Recibido: 14 febrero 2018

Aceptado: 20 marzo 2018

Publicado: 27 abril 2018


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